Escolher carne bovina vai muito além da classificação de primeira ou de segunda que se vê nos açougues ou nos supermercados. A textura da carne depende da linhagem e idade do animal, da forma da criação, do processo tecnológico que envolve o abate, além da quantidade de gordura e colágeno existente nos diferentes cortes. As explicações são do bioquímico Massami Shimokomaki, professor do programa de pós-graduação de Ciência dos Alimentos, da Universidade Estadual de Londrina (UEL), que acompanhou a reportagem na visita a um supermercado.
O Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina, assim como de frango. A maior parte da carne consumida pelos brasileiros vem de animais da raça zebuína, que é resistente às intempéries do clima, da vegetação e, consequentemente, a vários tipos de doenças. Segundo Shimokomaki, a carne nacional ‘não fica devendo nada a ninguém’ em relação à qualidade e pode ser considerada até mais saudável do que a proveniente de bois confinados como nos países europeus.
‘O nosso chamado ‘boi verde’, criado ao relento e alimentado por capim, resulta numa carne com mais mioglobina (pigmentos vermelhos da carne) e consequentemente com maior índice de ferro, porque está sempre se movimentando’, observa. O bioquímico explica que a carne bovina em geral é composta de 70% a 75% de água, 20% a 25% de proteínas, 1% de carboidrato, 3% a 5% de gordura (dependendo da peça) e 1% de sais minerais.
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Shimokomaki diz que a carne é um alimento completo e seu consumo deve ser diário. ‘Nós comemos carne não só por causa das proteínas. Ela nos fornece gorduras, o bom colesterol, ferro, vitaminas do complexo B e D, cálcio’, informa.
Em geral, a carne com mais gordura entremeada (ou gordura marmorizada) é a mais macia. ‘O que dá textura é a quantidade dessa gordura, a água presente no músculo (suculência) e as fibras de colágeno. Por causa das moléculas de colágeno que ganham estabilidade com a idade, quanto mais velho o animal, mais dura é a carne’, observa o bioquímico.
Independente do nome ou da classificação, o que importa é a constituição. ‘Se tiver gordura marmorizada, a carne vai ser sempre mais saborosa. É claro que existe o problema do colesterol, mas, no meu entendimento, se você consumir tudo com equilíbrio não tem problema’, diz.
Na panela é diferente
Segundo Shimokomaki, a classificação da carne só existe na teoria, pois qualquer corte pode se transformar em carne de primeira ou de segunda, dependendo do preparo. ‘A de segunda é proveniente dos membros (pernas) do animal, que estão sempre em movimento. Por isso, tem mais gordura, mais colágeno, mais fibras vermelhas. Teoricamente, é menos macia, mas dependendo de como se prepara, torna-se uma carne de primeira. Precisa de panela de pressão para quebrar as pontes cruzadas de colágeno. E fica uma delícia’, afirma.
Um exemplo é o cupim, que chega a ter, segundo análises, 50% de gordura e muito colágeno, e precisa de tratamento térmico adequado. ‘É por isso que as churrascarias o embrulham no celofane no dia anterior e o colocam à uma distância de dois metros do fogo para ficar lá rodando, assando aos poucos. A gordura vai se dissolvendo, as pontes cruzadas de colágeno vão sendo fragmentadas, a carne vai amaciando’, observa.
As carnes consideradas de primeira vêm da parte abdominal do animal. Entre elas, o filé mignon possui pouca gordura e pode ficar duro e seco se receber muito calor. ‘Com calor violento, a carne perde água e fica dura. Dando para as enzimas (proteolíticas) as condições para elas atuarem, a carne fica macia, assim como acontece com as carnes maturadas’, explica o bioquímico.
Já a alcatra é um misto e, portanto, mais fácil de se tornar um bom bife. ‘Tem gorduras marmorizadas por dentro e tecido conjuntivo. Por isso que é gostosa e mais fácil de fazer’, avalia Shimokomaki.
Como você escolhe a carne?
‘Costumo comprar carne em açougue e em mercado, onde sei que tem nutricio-nista, boas condições de higiene. Sempre peço para cortar na hora. Para bife, gosto de alcatra. Se for moída, patinho. Em geral, compro as carnes que minha mãe sempre comprou. Herdei dela, inclusive, um certo preconceito com carne de segunda’.
Karen Debértolis, jornalista
‘Compro sempre carne na bandeja por ser mais prático. Escolho sempre o mesmo mercado, que sei que tem qualidade. Gosto de fazer carnes grelhadas e tenho preferência pelo filé mignon. Vou mais pela qualidade do que pelo preço. Para cozidos em geral, fico com o coxão-mole e com o coxão-duro’.
Eliana Lourenço, empresária
‘Tenho o hábito de comprar em mercado e pedir para cortar na hora.
Desse jeito, posso escolher a peça, a espessura do filé. As carnes que mais consumo são alcatra e coxão-mole. Filé mignon, só em ocasiões especiais.
Vi um supermercado anunciando promoção de filé dias atrás, mas não cheguei a aproveitar’.
Ricardo Húngaro, estudante universitário