(Crônica inédita de Angela Reale)
Sempre perguntam aos escritores de crônicas, de onde tiram suas histórias e eles respondem que são de momentos comuns, tipo uma parada ônibus, no mercado, na padaria, na rua etc...etc... e foi assim comigo.
Estava eu no salão de beleza pintando as unhas e ao meu lado uma moça conversava com a outra manicure. Não pude deixar de ouvir pois estávamos lado a lado. Dizia ela: sabe, fulana, quando eu era pequena. tinha um sonho bem comum, aliás, um desejo comum. Eu queria um pinheiro de natal bem grande na sala da minha casa. Todos os anos era a mesma coisa: mãe!!, faz um pinheiro grande de natal? Mas como ela era muito ocupada, e dizia que não tinha tempo a promessa ia ficando pro próximo ano e o que aparecia sempre, era uma arvorezinha pequena, tão sem graça que nem parecia pinheirinho de natal. E eu fui crescendo e aquela coisa, cada ano me parecia menor. Cresci tanto que cheguei aos 27 anos e agora finalmente tomei coragem e decidi encrespar: MÃE!!! EUU QUEROO UM PINHEIROO GRANDEE NO NATAL!!!Acho que ela estremeceu por dentro.
No dia seguinte, ao chegar em casa após o trabalho, quem eu encontro bem no meio da sala? Um prinheirooo grandeeee!!! Obaaa!!! Aleluiaaaa!! Minhas preces foram ouvidas hehehe.
Minha mãe não estava em casa (ela se aposentou e acho que arrumou o tal "tempo" rsssr) e havia deixado no chão uma caixa cheia de enfeites e bolas pra eu arrumar. Nossa!! Que alegria!...e lá fui eu colocando uma por uma, com todo carinho, deixando a emoção tomar conta de mim. Horas depois, me senti como um artista ao terminar sua obra. Feliz, realizada, de alma lavada.. Enfim, meu tão sonhado " pinheirão" estava pronto. Só faltavam os pacotes de presentes no chão dando o toque final.. Enquanto eu admirava minha obra, tocou o telefone. Prontamente atendi. Era uma amiga de minha mãe.
-Oi, disse eu, como vai?
- Tudo bem, ela disse, estou telefonando prá avisar que meu marido está passando aí prá pegar a caixa de bolas de natal que emprestei prá tua mãe há dois anos atrás, e sei que ela guardou em tal e tal lugar, dentro de tal caixa. E sem me dar chance de contar que minha mãe não estava em casa, desligou.
Meu Deus!!!! Fiquei paralisada como se tivesse levado um choque. E agora! Comecei a sapatear em volta da árvore sem saber o que fazer, pois esse assunto de empréstimo de bolas eu desconhecia completamente. Tinha conhecimento de vários tipos de empréstimos; roupas de festas, bolsas, bijuterias e até guarda-chuva, mas bolas de natal?
De repente ouvi o barulho do automóvel se aproximando de minha casa e mais que depressa, feito um furacão katrina, comecei a recolher as bolas e colocar na caixa. Ufa!!Pronto, acabei!. Tocou a campainha. Blim, blom...já vou, gritei lá de dentro...tentando me recompor da corrida e sem deixar transparecer que as bolas estavam penduradas.
Ok. Respirei fundo e abri a porta. Oiiii (com um sorriso maior que a boca) aqui estão as bolas, foi fácil achar. Podes levar que a gente decidiu não montar pinheiro esse ano, afinal o Natal passa tão rápido, né? Abraços na sua esposa. Tchau!!!
Desabei no chão feito um saco de batatas e com os olhos cheios de lágrimas. Como assim!!! Não entendi patavina dessa história. Quando minha mãe chegou em casa, contei o episódio. Ela enfurecida e vermelha feito pimentão, me disse que as bolas haviam sido dadas e por isso ela não devolveu e inclusive havia comprado outras mais prá completar o pinheiro. Ai ai ai e eu devolvi todas, as da amiga e as nossas. Mas como eu ia saber!!!
Sentei e chorei. O pinheiro pelado e eu com o rosto inchado. Tiraram minha alegria, falei pro meu pai, entre soluços.. Ah! Não chore filha (com aquele jeitão especial), amanha de manhã tu vais comprar o que precisar, vamos enfeitar a árvore novamente e dessa vez ninguém vai estragar o teu desejo.
E isso foi feito. O pinheiro está lá, lindo e iluminado! Mas o que mais me dói é que ela levou as nossas bolas também e toda vez que eu a vejo passar, tem uma "vozinha" dentro de mim que grita:: devolva minhas bolas de natal, ora bolas!!!
Angela Reale é atriz, diretora de teatro, e fez curso de radialista. Atualmente atua como radialista no programa Ensaios da Radio Univates FM 95.1, pertencente à Universidade do Vale do Taquari, no RS. Adora escrever e suas crônicas já foram publicadas pelo jornal Zero Hora de RS.