Crônica
Há engarrafamentos nas ruas que estão ao redor dos grandes shoppings. Se é tempo de Natal, é tempo de presentes, afinal, vivemos no capitalismo. Da minha parte, nada contra. Dar e receber presentes é supimpa, não importa a época.
O fato é que este papo todo de presente causa-me uma certa nostalgia natalina. Por isso que, enquanto estou a batucar estas palavras – sim, eu as batuquei na minha velha Olivetti antes de transcrever no computador – fico tentando puxar pela memória os presentes que já ganhei nos 31 Natais que vivi até aqui.
Olha que, batucando feito criança que brinca com as letras - afinal foi o desejo de brincar com a máquina que me fez tirá-la, semiempoeirada, de cima do armário -, eu quase embatuquei. É que não tenho praticamente nenhuma recordação de presentes natalinos. Não que, em minha infância, eu não os tenha ganhado. Pelo contrário. Mas a imensa maioria não foi afetivamente importante a ponto de eu guardá-los para sempre em algum lugarzinho desta coisa obscura chamada memória.
Dos brinquedos que ganhei, lembro-me especialmente do Gasolino. Nada mais que um carrinho pequeno, de plástico, daqueles de "dar corda", cujo mecanismo para acioná-lo era uma bomba de posto de combustível. No site Mercado Livre há sete unidades à venda, uma das quais por R$ 770. Caramba, onde foi parar o meu?
Mas o Gasolino, salvo engano, não foi presente de Natal. Foi do Dia das Crianças. Na verdade, uma chantagem dos meus pais para que eu deixasse de chupar chupeta. "Se você jogar fora a chupeta ganha um Gasolino", profetizou minha mãe. Dito e feito. Um breve parênteses: como eu posso me lembrar disso, sendo que eu devia ter três ou quatro anos, e não me recordar o nome de um sujeito com o qual conversei há meia hora?
Presente de Natal mesmo eu só guardei na mente e no coração uma fantasia de He-Man, o herói do desenho animado daquele tempo, que o saudoso Tio Gil dera para mim e também para o Rodrigo, meu primo.
A fantasia não era grande coisa, afinal o He-Man andava praticamente pelado. Consistia em dois artefatos de plástico para pôr nos punhos e aquele símbolo do Vasco da Gama que ia no peito, além de uma espada de plástico. Porém, na minha cabeça, era a roupa do verdadeiro defensor do Castelo de Grayskull (o Google disse que é assim que se escreve). Assim, tornei-me a versão pé-vermelho, magricela e de óculos-fundos-de-garrafas do meu herói. Enfrentava terríveis inimigos, materializados em lagartas que andavam pelo quintal de casa.
Ao mesmo tempo em que não tenho grandes lembranças dos presentes, tenho recordações maravilhosas das festas de Natal, tanto das ceias quanto dos almoços, sempre com muita gente, muita mesmo, ao redor da mesa. Abraços, conversas, risos, tios, avós, primos, pai, mãe, irmãos, todo mundo ali. Que coisa boa!
Vó Lourdes, que nos deixou recentemente, sempre pregava na porta de sua casa uma imagem do menino Jesus na manjedoura. Vó Maria sempre fez presépio, com luzinhas, os animais todos, Jesus, Maria e José, e um pedaço de espelho a servir de lago, no qual nadavam patinhos. Veja que coisa mais singela.
Acho que é isso. Os presentes ficaram em segundo plano. Afinal, meus Natais sempre foram mais do Menino no presépio, do afago e do afeto que do Papai Noel. Repito, nada contra o "bom velhinho".
Feliz Natal para você.