Beirada nipônica

Dekassegui, um movimento como outro qualquer

14 jun 2015 às 09:18

Eu nunca dei muita bola para o movimento dekassegui. Sei que foi uma importante válvula de escape para os nikkeis que tiveram as portas abertas para vir ao Japão e ganhar em ienes. Trabalhando por alguns anos, muitas vezes, já era o suficiente para comprar um pequeno imóvel, a tão sonhada casa própria. Muitos investiram em algum negócio, abriram lojas, lanchonetes e floriculturas, e outros aumentaram as plantações de uvas e abacaxis, enquanto um grupo pequeno foi para as hortaliças e granjas. No fim, dá quase que tudo no mesmo.
Já passou um montão de brasileiros por aqui, no auge foram mais de 300 mil conterrâneos no chão das fábricas, nos trabalhos pesados e insalubres. Quando as diferenças culturais não puderam ser entendidas, uma parcela foi para atrás das grades e hoje passam de duzentos infratores. A maioria por consumo de drogas, roubos de carros e outras pequenas delinqüências, típicos de bandidinhos. No reformatório para menores, os delinqüentes verde-amarelos estão na liderança.
A parte que está saindo vitoriosa é um pequeníssimo grupo que conseguiu entender que a estadia por esse país não poderia terminar apenas com as mãos sujas de graxa ou um punhado de ienes. Esse grupo investiu na educação dos filhos, preparando-os para viverem não semelhantes aos pais. Deu-lhes a oportunidade de frequentar boas escolas e algumas universidades. A conta dessa atitude inteligente já começa a aparecer. Algumas grandes empresas, cujos nomes são tão conhecidos de nós brasileiros, já possuem em seus quadros de colaboradores um membro tupiniquim. Não um tupiniquim que diz "nós vai, a gente foi", mas aquele que se expressa corretamente, que escreve e discursa em mais de um idioma.
Ainda pipocam por algumas cidades eventos voltados para os brasileiros. No último dia de maio houve em Nagoya a "Festa Brasil", e no dia 7 de junho foi a vez do estado de Shiga promover o seu "Konan World Festa" que apesar de "world" é voltado praticamente para os conterrâneos porque em Shiga as prefeituras estão lotadas de intérpretes em português, mas não há nenhum em inglês, francês, tailandês ou filipino. Isso significa que os brasileiros são maioria, e que depois de 25 anos do movimento dekassegui muitos ainda não conseguem andar com as próprias pernas, necessitando de apoio dos órgãos públicos para resolver qualquer questão burocrática. São vinte e cinco anos estagnados em termos educacionais, onde os valores teimam em ser samba, carnaval, futebol, churrasco e cerveja.
Nada contra essas coisas bacanas, apenas de que estudar ninguém quer, dar um passinho à frente também não. Deixam as coisas como estão para ver o que acontece, ou ficam exigindo benefícios do governo, reclamando de que as oportunidades não aparecem, e quando aparecem não são para eles. Acho que é o tal do complexo de vira lata, livro homônimo no tão decantado país do futuro.
O movimento dekassegui completou um quarto de século, e não vejo nada demais disso. Acho também os eventos com os de Nagoya e Konan muito cafonas, ultrapassados em sua concepção, que poderiam fugir das barraquinhas de coxinhas, pastéis e churrasquinhos. Que se apresentam Porta-Bandeiras, também mostrassem outros ritmos de músicas. Capoeira já encheu o saco, e aqueles conjuntos de dançarinas de axé não faz a cabeça de mais ninguém. Caipirnha e batida de côco são tão conhecidos como o futebol nacional, e se continuarem desse jeito, também levarão uma surra de 7 x 1.
Por isso, acho interessante repensar os valores dessa comunidade, para que não passemos a vida entre óleos e graxas, linhas de produção, salgadinhos e fio dental.

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