Beirada nipônica

Amargura e a serenidade nipo-brasileira

12 fev 2012 às 04:00

Aconteceu-me uma coisa interessante, porém, acredito eu, corriqueira. Meu computador foi infectado por vírus e os meus contatos passaram a receber mensagens "doentes", vídeos eróticos e pregações racistas.
Só fui me dar conta disso quando recebi três retornos desses e-mails com palavras mais ou menos ácidas e alguma amargura. Vou adiantando que as três mensagens foram de pessoas que não conheço pessoalmente, pois quem já esteve olho-a-olho comigo sabe que não faço isso. E quem me conhece de longa data, mesmo que recebesse e-mails eróticos ou racistas iriam levar na brincadeira. Como alguns me dizem: "você é pura alegria".
Mas o que notei nas três mensagens que recebi foi que o brasileiro está perdendo a alegria, o senso esportivo, o sorriso à toa. E pensar que o Brasil já foi considerado o "último país feliz do mundo". Acho que deve ser a dificuldade cotidiana para sobreviver. A falta de boas perspectivas. A pouca luz no final do túnel. O pouco caso com a educação. A falta de segurança e todas aquelas mazelas que rodeiam um país em desenvolvimento. Sei que não deve ser fácil acordar diariamente e saber das greves, das corrupções, dos crimes, violência em todos os níveis. Não deve ser fácil.
Acho que se estivesse por aí, também estaria um pouco contagiado por tudo isso, afinal, a força cultural que um país exerce em seus cidadãos é forte e penetrante. Vá para a China e comemorará o inicio do ano chinês em fevereiro, viva em Israel e não comerá carne suína, viva no Itália e passará a gostar de massas, vá para o Japão e aprenderá a ter serenidade.
A serenidade aqui é necessária. A rigidez hierárquica que tantas vezes citei no blog, as inúmeras regras de etiqueta, o silencio acusador, a cultura do esforço coletivo, a "mão inglesa" no transito, entre tantas diferenças, nos obriga a desenvolver serenidade e equilíbrio acima das outras qualidades necessárias para a sobrevivência.
Os anos passaram e pelo jeito pouca coisa mudou no país onde nasci. Quando pequeno, presenciei greve de motoristas, professores, trabalhadores industriais, aeroportos e tudo mais. Só nunca presenciei greve de políticos por causa dos atrasos de salários. Vivi parte da ditadura, senti na pele a inflação desumana, quase enlouqueci com o Plano Cruzado, fiquei duro com o Plano Collor e aí meu amigo, achei melhor partir para outra. Fiquei com medo de perder alegria e ficar amargo. Fiquei com medo de contaminar meus filhos com a falta de esperanças por um país mais justo, mais humano. Confesso que a alegria eu ainda pensava que o brasileiro tivesse.
Saí correndo para continuar a achar graça das coisas. Para rir das piadas. Para não envenenar minha alma com o amargo da tristeza. Hoje sou nipo-brasileiro. Posso não ser o homem mais feliz do mundo, mas tenho serenidade para aceitar o que não entendo completamente.

Acorde feliz, durma feliz


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