Interior do Paraná, século 18. "Guarda-te lá que eu aqui bem fico". Essa foi a suposta frase dita por um fazendeiro da região de Tibagi na época, quando soube que os índios Caingangues planejavam atacar um de seus vizinhos. Foi assim, segundo a lenda, que surgiu a expressão guartelá, que futuramente daria nome ao Parque Estadual do Guartelá.
O nome pegou tão bem, que o Canyon do Rio Iapó (onde o parque está localizado) acabou popularmente conhecido como 'Canyon Guartelá'. Situado entre os municípios de Tibagi e Castro, nos Campos Gerais do Paraná, o canyon é o sexto maior do mundo em extensão, e o maior do Brasil, com 32 Km, e altitudes que variam de 700m a 1.200m.
A paisagem vista do alto do Vale do Rio Iapó, principalmente ao amanhecer, é surpreendente. A bruma que cobre os campos vai se escoando e, aos poucos, surgem copas de Araucárias ou "Pinheiros-do-Paraná" centenárias e formações rochosas muito interessantes. Sinuosas, altíssimas, irregulares, recortadas em fendas, surgem duas cadeias de montanhas, separadas pelo leito do Rio Iapó.
Em meio a tanta beleza encontram-se marcas de diversas épocas passadas, deixadas por indígenas, jesuítas e tropeiros. Nos 32 km do Canyon do Rio Iapó, eles registraram parte de sua história, cultura e tradições. As marcas dos primeiros habitantes do canyon estão registradas em pinturas rupestres feitas nas formações rochosas. O Guartelá também foi cenário das viagens dos destemidos tropeiros que percorriam os Campos Gerais, conduzindo o gado para comercialização na Feira de Sorocaba.
O Parque Estadual do Guartelá foi criado em 1992, com o objetivo de proteger o ecossistema local. No local, com a companhia obrigatória de um guia fornecido pelo parque, é possível tomar banho nos Panelões do Sumidouro (grandes buracos em meio às corredeiras, criados pela ação da água), visualizar inscrições rupestres e se deslumbrar com a imensidão do canyon nos mirantes do parque. Um dos visuais mais bonitos do lugar é a cachoeira da Ponte de Pedra, com quase 200 metros de altura. No meio da queda, o arroio do Pedregulho atravessa a rocha, formando uma verdadeira ponte de pedra natural.
Outro ponto que vale a pena visitar é conhecido como Lagrimas de Santa Clara. Localizada no Parque Pousada Canyon do Guartelá (área particular), a uma distância aproximada de 28 km do centro de Castro. É uma pequena queda de água, que respinga em uma lagoa cravada no meio da mata. As gotas parecem lágrimas que caem do céu. Conta a lenda que ao tomar a água e fazer um pedido, este será concedido.
O Parque funciona de quarta a domingo e feriados nacionais das 8h às 18h e não é cobrada taxa de entrada. Para a visita nas pinturas rupestres é necessário a prévia contratação de condutor local.
Preservação
Como a estrutura rochosa do Guartelá é basicamente arenítica, muito sensível a erosão, vários pontos antes abertos ao turista foram interditados, limitando as atrações do parque na tentativa de evitar a degradação. Já não é possível, por exemplo, conhecer o fim da queda do arroio Pedregulho, que desemboca no Iapó, ou se aproximar da Ponte de Pedra. Essas restrições são agravadas com a falta de funcionários fixos no local.
Mesmo assim, a beleza e a diversidade da região têm atraído cada vez mais visitantes para o local. Além das várias caminhadas, o rafting nos rios Tibagi e Iapó e o rappel de cachoeira são outras grandes atrações.
Fauna e flora
Por lá são encontradas espécies de plantas que normalmente são vistas em lugares completamente distintos: samambaias e xaxins típicos da Mata Atlântica; cactos só encontrados na caatinga; imbuias e cambuís, que formam a vegetação de banhados. Há ainda uma grande quantidade de araucárias, copaíbas, ipês-amarelos, erva-mate, bromélias, orquídeas, palmeiras, barbas-de-bode, entre outras tantas espécies.
Quanto à rica fauna da região, destacam-se mamíferos como tamanduás-mirins, bugios, tatus, capivaras e até o lobo-guará e a suçuarana, ameaçados de extinção. Entre as aves, os destaques são a curucaca, falcão quiri-quiri, pica-pau do campo, tirivas, codornas, perdiz e jacu.
Pousadas e fazendas
Enquanto o Parque Guartelá é procurado pelo turismo contemplativo de apenas um dia, pousadas e fazendas adjacentes estão investindo em roteiros alternativos, opções de aventura e infraestrutura para que o visitante fique mais tempo na região. Um exemplo é a Reserva Ecológica Itaytyba, propriedade particular localizada no outro lado do cânion, em uma área de 1090 hectares ao longo da margem direita do Iapó. O complexo ecoturístico rural conta com uma infraestrutura para grandes grupos e eventos, além de diversas opções de lazer, gastronomia, atividades culturais e programas ambientais. Dentro da reserva, chama atenção o Recanto Paleontológico Prof. Olavo Soares que reúne um acervo com preciosas informações sobre os dinossauros, fósseis, cristais, minerais e rochas, oriundos de diferentes regiões.
Outra estância interessante da região é a Fazenda São Damásio, com acesso pelo Km 38 da Rodovia Tibagi – Castro (PR-340). Antiga propriedade escravocrata, a fazenda guarda paredões abruptos do Cânion Guartelá, além de vários arenitos que despontam pelos campos ao redor. A paisagem deslumbrante e primitiva do local já foi cenário para diversos documentários, entre eles o filme "Preço da Paz", de Paulo Morelli, que conta a história da Revolução Federalista brasileira. Para chegar até aos mirantes naturais, o visitante tem que atravessar quase uma dezena de porteiras entre capões de mata nativa, lavouras e pastagens. Frederico Zens, proprietário da fazenda, só faz uma exigência para quem quer conhecer o local. "Não esqueçam de fechar as porteiras, senão o gado vai pro brejo".