A Santa Casa de Misericórdia da cidade de Ponta Grossa foi condenada a indenizar, em R$ 50 mil, a título de danos morais e estéticos, uma paciente que sofreu a extração do útero, das trompas e do ovário direito sem que houvesse indicação médica e justificativa clínica para a realização da referida cirurgia.
A decisão, que reconhece a existência de erro médico, é dos desembargadores que integram a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Esse julgado reforma parcialmente a sentença do Juízo da 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba.
Narram os autos que a paciente S.A.M. internou-se na Santa Casa de Misericórdia de Ponta Grossa para se submeter a uma cirurgia de períneo, mas, por erro médico, foi realizada uma histerectomia abdominal com extração do útero, do ovário e das trompas. Por essa razão, a paciente S.A.M. ajuizou uma ação de indenização perante a 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba pedindo a condenação da Santa Casa por danos materiais, morais, estéticos e psicológicos.
Sentença
O juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Curitiba, apoiado em laudo pericial, reconheceu o erro médico e as consequências danosas dessa indevida intervenção cirúrgica, acolhendo, assim, parcialmente o pedido. Dessa forma, a Santa Casa foi condenada a pagar à paciente uma indenização, por danos morais e estéticos, no valor de R$ 15.000,00, a ser corrigido a partir da data da sentença e acrescido de juros de mora de 1% desde a data do evento danoso.
Tanto a autora (S.A.M.) quanto a ré (Santa Casa) recorreram da sentença. A primeira para pedir o aumento do valor da indenização e o acolhimento do pedido referente ao dano material. A segunda para negar a possibilidade de indenização, uma vez que, no seu entender, teria ficado demonstrado nos autos que "a apelada [paciente] tinha plena ciência de que seria submetida à cirurgia de histerectomia, bem como pelo fato de tal procedimento ser o indicado para o quadro de saúde apresentado, não restando qualquer outro tratamento alternativo".
O relator da apelação, desembargador Sergio Luiz Patitucci, ao apreciar ambos os recursos, entendeu, de um lado, que ficou configurado o erro médico porque, conforme o laudo do perito, a paciente não tinha pleno conhecimento do procedimento cirúrgico que seria realizado, nem existia indicação médica e justificativa clínica para a realização da referida cirurgia (histerectomia).
"Sabe-se que o direito de acesso à informação representa garantia constitucionalmente assegurada, o que importa dizer que o médico jamais pode realizar um procedimento cirúrgico sem que o paciente detenha todo o conhecimento possível acerca de seu diagnóstico, dos riscos e de eventuais complicações", observa o relator.
"Assim, a realização de cirurgia, sem a anterior informação detalhada à paciente e seus familiares, configura desrespeito à capacidade de discernimento e de decisão sobre a aceitação ou não do procedimento a ser adotado, posto que, em não havendo risco de morte, não competia ao médico realizá-la sem prévio esclarecimento e autorização da paciente, pois não detém ele livre disposição sobre o seu corpo e o mal que a afligia", conclui o relator.
Diz mais o desembargador relator: "Não se pode exigir da paciente o conhecimento acerca dos termos técnicos que permeiam a área médica, mormente quando esta ignorância decorre justamente da falta de informações quanto ao diagnóstico e ao ato cirúrgico realizado, como ocorreu no caso em tela, eis que por mais que a autoria tivesse conhecimento de que iria realizar uma "HISTERECTOMIA TOTAL COM ANEXECTOMIA", o que não se vislumbra com segurança nos autos, certamente ela não tinha o conhecimento de que tais termos significavam a extração de seu útero, trompa e ovário".
Por outro lado, no que diz respeito ao valor da indenização, o relator chegou à conclusão de que a quantia deve ser aumentada porque "a requerida [Santa Casa] agiu com má-fé ao alterar a verdade dos fatos; porque a quantia é pequena frente aos prejuízos, devendo ser considerado que foram extraídos órgãos que comprometem o equilíbrio hormonal da mulher; e porque a jurisprudência pátria tem fixado valores bem superiores ao fixado pela sentença". Por isso o valor da indenização foi aumentado para R$ 50 mil.
Os desembargadores Francisco Luiz de Macedo Júnior (revisor) e D’Artagnan Serpa Sá acompanharam o voto do relator. (Fonte: TJ-PR)