Entidades médicas e órgãos regionais, liderados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), protocolaram na tarde desta segunda-feira (5) uma carta na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em Brasília, protestando contra a decisão daquela agência reguladora de adiar a votação da resolução que proíbe a adição de açúcares e flavorizantes, como o mentol, na produção de cigarros. A sessão para definir a questão está marcada para a próxima terça-feira.
No documento, eles afirmam "perplexidade" e "inquietação" com o posicionamento do órgão federal e revelaram preocupação com as futuras deliberações conduzidas pela agência. "Não é admissível que uma agência do porte da Anvisa que possui corpo técnico altamente qualificado possa dispensar as sólidas evidências científicas e basear sua decisão na contramão dos interesses da saúde da população", diz trecho do manifesto, assinado pela Associação Médica Brasileira (AMB), Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Academia Nacional de Medicina (ANM), Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead).
No último dia 14, a Diretoria Colegiada da Anvisa se reuniu para votar a resolução que proíbe o uso de aditivos no tabaco. A direção chegou ao consenso de que os aromáticos deveriam ser vetados, mas a questão da adição de açúcar gerou o impasse que adiou a decisão. O carboidrato é utilizado em um tipo específico de fumo produzido por mais de 50 mil famílias brasileiras. A resolução permite o ingrediente por um prazo de 12 meses após a aprovação do texto, tempo para as famílias se adequarem e para a agência decidir a proibição definitiva.
O tabagismo causa mais de 50 doenças graves, inclusive vários tipos de câncer. Anderson Silvestrini, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, uma das signatárias da carta à Anvisa, afirma que o adiamento da decisão da Anvisa de vetar os aditivos no tabaco surpreendeu as entidades médicas. "A notícia causou apreensão porque, para a sociedade e as entidades de classe, era uma decisão óbvia. Não se estava avaliando o que era melhor, os diretores estavam apenas votando sabidamente que todo jovem e adolescente é atraído pelos aditivos do cigarro, que mascaram o gosto ruim. Os médicos esperavam um voto que beneficiasse a sociedade".
Para Silvestrini, a atitude da Anvisa deixa claro que o combate ao tabagismo no Brasil tem dificuldades. "O lobby da indústria tabagista e até dos produtores de fumo é muito forte. A lei da extinção dos fumódromos, por exemplo, é de 2008, e só agora foi aprovada. É curioso porque o mundo inteiro tem clareza com relação aos malefícios do cigarro e a indústria do tabaco tenta distorcer a informação. Antigamente, eles diziam que a nicotina não causava dependência e agora tentam conseguir mais tempo para fidelizar novos dependentes".
Segundo o oncologista (médico especializado no diagnóstico e combate ao câncer), não há dúvidas de que aditivos e açúcar atraem mais os jovens e os adolescentes. "O aroma e o paladar são importantíssimos. Faço uma analogia com bebidas à base de vodka com limão que são consumidas principalmente por esse público, porque têm sabor melhor".