Perto de completar um mês após uma memorável experiência, a técnica de produção Inez do Amaral sorri pela boa saúde. Aos 36 anos, ela foi submetida a uma craniotomia acordada (awake craniotomy) para clipagem de aneurisma cerebral, na Santa Casa de Londrina.
Isso significa que Inez ficou a maior parte da cirurgia, que durou duas horas e meia, acordada, interagindo com a equipe. Essa comunicação possibilitou aos médicos detectar se a intervenção provocava alguma alteração na área do cérebro que pudesse causar sequelas.
"Tive medo porque escutava tudo, mas não senti dor em nenhum momento. Lembro perfeitamente dos médicos me fazendo perguntas", conta ela, que após sofrer um AVC (Acidente Vascular Cerebral) no ano passado, descobriu o aneurisma.
Moradora de Guarapuava (Centro-Sul), Inez sentia no dia a dia os reflexos da doença vascular. "Passei a esquecer coisas básicas e tinha momentos que passava mal", recorda, revelando estar agora muito confiante na boa recuperação.
Até onde se tem notícia, a técnica foi a primeira a ser realizada no País para aneurisma cerebral. A prática já é aplicada em quadros de tumores cerebrais em áreas eloquentes (próximas da área da fala, movimentação e visão) e cirurgia de Parkinson.
"Uma técnica com grandes benefícios e segurança. Com essa primeira cirurgia na Santa Casa mostramos que, bem trabalhado, o procedimento é um sucesso e um grande avanço para atender esses pacientes", analisa o neurocirurgião Sérgio Murilo Georgeto, que atuou junto com o também neurocirurgião Marcelo Haddad. Todo o procedimento foi feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Os especialistas contaram muito com o empenho da equipe anestésica, comandada pelo médico anestesista Luciano Fonseca, pois a paciente era anestesiada nos momentos em que poderia haver dor. "Mas ela estava consciente o tempo todo. Então, quando conversávamos e solicitava que ela respondesse a alguma ordem, ela respondia", afirma Haddad.
Interação
Georgeto ressalta que a paciente foi acordada somente quando a equipe começou a trabalhar no aneurisma e que em alguns momentos ela recebeu sedativos de curta duração para a realização de procedimentos, como no processo de serrar o osso.
Para criar um canal de interação além da fala, Inez foi instruída a apertar um objeto (um pato de borracha) que emitia som. "Deixamos o objeto no lado que ela poderia ter um déficit. Se ela respondesse na hora que fazíamos as perguntas, era um sinal de que não havia nenhuma alteração motora", acrescenta Haddad.
Ainda de acordo com Georgeto, o benefício da técnica é justamente a possibilidade de monitorar funções fundamentais dos pacientes, que no caso da lesão de Inez, era principalmente da movimentação de todo hemicorpo direito e área da fala.
"Conseguimos saber tudo que está acontecendo, em tempo real, o que reduz a chance de sequelas. Se não fosse a craniotomia acordada, o aneurisma seria tratado também de maneira cirúrgica, mas com monitorização fisiológica, que não tem a mesma fidelidade que conseguimos com a paciente acordada, especialmente em relação à fala", explica.