A britânica Sharon Bernardi descobriu, da pior forma possível, uma rara doença genética em sua família: perdeu sete filhos até que os médicos identificassem que um problema no DNA de suas células aumenta as chances da ocorrência da doença de Leigh, que atinge o sistema nervoso de forma letal.
Seu drama a levou a apoiar pesquisas cujo objetivo é desenvolver uma técnica para substituir o material genético presente em suas mitocôndrias (partículas celulares) pelo de uma mulher saudável.
Esta espécie de "transplante genético" poderia dar fim ao seu sofrimento e finalmente dar a Sharon a possibilidade de ter uma família.
Seu drama começou com o primeiro filho, e mesmo após sete tentativas, ela ainda tem esperanças.
A cada gestação ela achava que seria diferente. Durante a gravidez costumava sentir-se bem, e os partos em geral corriam dentro da normalidade, mas logo algo começava a dar errado.
Seus três primeiros filhos morreram horas após o nascimento e ninguém sabia a razão.
"Levamos bastante tempo para superar o primeiro e aí aconteceu novamente. Fiquei perplexa. Fiquei em choque", reconta a britânica.
Diagnóstico genético
Após a terceira criança morrer, os médicos começaram a suspeitar que as mortes não eram mera coincidência, mas as pesquisas genéticas iniciais não chegaram a respostas conclusivas.
Ao mesmo tempo, a mãe de Sharon revelou que tinha dado à luz três natimortos (quando o feto já nasce sem vida) antes do seu nascimento.
Mais tarde, a análise dos médicos revelou que oito recém-nascidos já haviam morrido em outros núcleos da família.
"Eu não sabia sobre a história de minha mãe. Não tinha por que eu saber. Eu sou filha única, e acho que naquela época as pessoas não falavam muito sobre as coisas como agora", diz Sharon.
doença de Leigh
Edward
Algum tempo depois, em uma nova tentativa, ela deu à luz Edward, seu quarto filho.
Dessa vez os médicos estavam mais preparados, e, 48 horas após o parto, o bebê recebeu transfusões de sangue para prevenir a acidose lática, um tipo de intoxicação causada pelo sangue que acabou matando seus três irmãos.
Cinco semanas depois, o casal recebeu autorização para levar o bebê para casa, em Sunderland, no norte da Inglaterra, para passar o primeiro Natal em família.
Aos quatro anos ele começou a sofrer espasmos, e foi aí que a equipe médica finalmente diagnosticou com exatidão a origem do problema.
A doença de Leigh é causada por problemas nas mitocôndrias - pequenas estruturas que funcionam como uma espécie de usina de força de cada célula. A doença afeta o cérebro, em particular, o sistema nervoso. Ela se manifesta geralmente no início da infância. Entre os primeiros sintomas estão deficiências na habilidade de sucção, perda de controle do movimento da cabeça e de habilidades motoras.
"Pode parecer estranho, mas fiquei aliviada de, finalmente, ter uma resposta", diz Sharon.
No caso de Edward, sempre havia o risco de que ele morresse durante um desses ataques de espasmos, que chegavam a durar dias, e embora os médicos tivessem alertado os pais de que o garoto só viveria até os cinco anos, Edward conseguiu lidar com os intensos sintomas da doença de Leigh até sua morte, os 21 anos, no ano passado.
"É difícil quando tudo que você quer é ter uma família, e finalmente você tem um bebê como o Edward, e você acha que finalmente está chegando a algum lugar com todas as suas esperanças e sonhos, e aí alguém lhe diz que em algum momento seu filho vai morrer", diz a britânica.
Egoísmo e esperança
O casal continuou tentando ter um bebê saudável, sem sucesso. Sharon deu à luz outra três crianças, mas nenhuma viveu mais do que dois anos. Cada vez que mais um bebê morria, eles diziam a si mesmos que seria a última tentativa, e após a última morte, em 2000, eles desistiram.
"As pessoas me perguntam, o que Edward tinha de diferente? Como ele sobreviveu ainda bebê, se já tinha todos os problemas que mais tarde só aumentariam? Eu não, mas Edward tinha uma força dentro dele. Ele lutou durante toda a sua vida. Eu acho que estava na personalidade dele".
Ter perdido todos os filhos é algo que afeta o casamento de Sharon. "Também afeta a família, os avós e suas esperanças e sonhos de terem netos", conta.
A britânica diz que muitos já acusaram o casal de serem egoístas por quererem algo que não podem ter – sua própria família, com crianças saudáveis. "Não me acho egoísta, só quero que meu filho tenha saúde".
O sofrimento dos filhos de Sharon a convenceu da necessidade de apoiar a criação de técnicas que possam remediar os problemas em mitocôndrias com as mesmas falhas que as suas.
"Quando você vê alguém com dor, você não quer ver mais pessoas com dor. Você não quer ver uma criança nascer só para sofrer e morrer antes de completar dois anos, ou, caso sobrevivam, que tenham deficiências devastadoras".
"Não se trata de ser egoísta. Não tem nada a ver com querer bebês sob medida. Não estamos sendo injustos com pessoas com deficiências. É uma tentativa de criar um bebê saudável. É uma tentativa de dar um futuro a uma criança", diz Sharon.