No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, já são cerca de 14 milhões de pessoas com diabetes e aparecem 500 novos casos por dia. Porém, a ciência já apresenta grandes avanços em tratamentos que podem ajudar a diminuir e solucionar o diabetes. Descobertas recentes mostram que os dentes de leite, fontes ricas em células-tronco mesenquimais, podem ajudar no futuro tratamento do diabetes.
O diabetes tipo 1, conhecido como infanto-juvenil ou insulinodependente, é o tipo mais comum no país e trata-se de uma doença autoimune que se caracteriza pelo ataque do próprio sistema imunológico do indivíduo às células produtoras de insulina no pâncreas. Pacientes portadores desse tipo de diabetes fazem uso regular de insulina e são suscetíveis às sequelas tais como a neuropatia (quando alguns nervos do corpo não funcionam corretamente), a nefropatia (lesão ou doença do rim) e a retinopatia (lesões não inflamatórias no globo ocular).
"A possibilidade de se utilizar células-tronco extraídas de dente de leite em terapias experimentais permite que haja um grande avanço para ciência de modo a dar sustentabilidade e fundamentação para que tenhamos em um futuro próximo, tratamentos mais previsíveis, menos invasivos e menos custosos sob todos os aspectos para a os pacientes com diabetes. Vários estudos em diversos centros do mundo vêm sendo conduzidos utilizando diferentes modelos para uso de células-tronco no tratamento do diabetes tipo 1", explica o dentista Dr. José Ricardo Ferreira.
Os dentes de leite, também denominados dentes decíduos, iniciam sua formação antes do nascimento e começam a irromper na boca ainda no primeiro ano de vida. A partir do sexto ano de vida, a criança inicia o processo de troca dos dentes de leite pelos permanentes.
Historicamente, o destino dos dentes de leite é o descarte ou são guardados como lembranças de infância. Entretanto, há algum tempo os pesquisadores sabem que no interior do dente de leite, especificamente na polpa, há células-tronco. Por este motivo, descartar ou guardar o dente, significa perder um precioso material biológico.
"As células-tronco da polpa do dente de leite são células-tronco adultas e jovens, de origem mesenquimal. Em razão de sua origem, trazem a possibilidade de aplicação na terapia de diversos males, desde a regeneração óssea, tecidual, passando por patologias imunológicas e metabólicas, até lesões envolvendo o comprometimento de células-nervosas (medula)", explica José Ricardo.
As células-tronco mesenquimais obtidas a partir da polpa do dente de leite destacam-se dentre as fontes naturais viáveis por apresentar o melhor potencial para criopreservação e aplicação em terapias celulares e gênicas. Isto se deve aos seguintes fatores:
- Simplicidade e técnicas pouco invasivas para obtenção;
- Maior facilidade e alta viabilidade para o isolamento; capacidade de expansão e resposta ao descongelamento para uso em terapias;
- Expressiva ausência de resposta imunogênica que, em tese, valida esse modelo para utilização em transplantes alogênicos (entre indivíduos distintos dentro de uma mesma família);
- Período de oportunidade na obtenção do material devido à quantidade de dentes de leite presentes em um indivíduo (20) e do intervalo de tempo para sua substituição por dentes permanentes (entre os 6 e 12 anos de idade aproximadamente), contudo quanto mais jovem a célula-tronco melhor a qualidade do material, ou seja, deve-se priorizar os primeiros dentes a serem extraídos ;
- Células-tronco da polpa do dente de leite sugerem uma maior concentração e viabilidade celular por serem mais jovens quando comparadas às células-tronco obtidas a partir da dentição permanente.
Dentre os critérios estabelecidos pela Society for Cellular Therapy para identificação da Célula-Tronco Mesenquimal pode-se ressaltar a capacidade de diferenciação em osso, gordura e cartilagem.
O Brasil tem se destacado nessas pesquisas, dando importantes contribuições para comunidade científica. No Centro de Terapia Celular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, por exemplo, a estratégia tem sido realizar o transplante de células-tronco provenientes da medula, com o intuito de interromper a destruição das células pancreáticas, que é característica nos portadores de Diabetes tipo 1 e que são responsáveis pela produção de insulina.
Nesse trabalho, iniciado em 2004, a ideia foi, após coletado e congelado o material celular proveniente da medula, zerar o sistema imune do paciente, por quimioterapia, de modo que, com a infusão daquele volume de células descongelado, não houvesse mais resposta imune às células pancreáticas. Com isso, o paciente voltaria a ter uma produção normal de insulina, deixando de fazer uso das injeções diárias.
Na pesquisa do grupo do Dr. Couri foi indicada a medula em razão da facilidade para obtenção de células-tronco sanguíneas e mesenquimais. O princípio aqui, seguiu de maneira similar aquele que é aplicado para tratamento de Leucemia (origem sanguínea). O sistema imune do paciente é praticamente zerado por conta da quimioterapia para que então as células-tronco possam restabelecer esse sistema, dessa vez, sem atacar mais as células pancreáticas secretoras de insulina.
No Instituto de Química da USP, em parceria com a faculdade de Medicina da mesma universidade, surgiu a ideia de encapsular as ilhotas pancreáticas com um biomaterial, de modo a permitir que a insulina continue sendo secretada, porém, sem que a célula sofra agressão do organismo por conta da resposta imune. Essa possibilidade já foi testada em animais (ratos) com bons resultados longitudinais, que agora precisarão ser extrapolados para seres humanos.
A partir de experimentos envolvendo a implantação de células-tronco oriundas da polpa de dentes de leite em ratos diabéticos, chegou-se a resultados que demonstram que essas células-tronco podem contribuir para a renovação de células β pancreáticas, prevenindo dano renal em animais diabéticos. Esses resultados sugerem terapia com células-tronco como uma opção para o controle de complicações do diabetes, bem como da própria doença.
"Assim sendo, é indicado a pessoas com histórico de diabetes na família ou crianças já diagnosticadas com a doença, realizarem a preservação da células-tronco do dente de leite para uso em terapias gênicas futuras, haja visto que as pesquisas estão evoluindo rapidamente no Brasil e no mundo", finaliza José Ricardo.