A família olímpica está em crise. O escândalo de doping no esporte russo transformou o que seria uma reunião ordinária do Comitê Olímpico Internacional (COI) em uma briga entre seus membros. Nesta terça-feira, a entidade iniciou seu congresso anual, no Rio. Mas o evento acabou ganhando um tom de crise, com um apelo claro para que as regras de combate ao doping sejam modificados e que uma nova entidade de controle seja criada.
O assunto será tratado em uma cúpula extraordinária convocada para outubro e o Estadão.com apurou que, nos bastidores, já se trabalha com uma proposta de reformas de leis, de funções de cada uma das entidades e o aumento substancial de recursos para a luta contra o problema.
Apesar das revelações do doping russo com participação estatal, o presidente do COI, Thomas Bach, optou por manter Moscou nos Jogos do Rio, com punições sendo impostas apenas a atletas com um histórico de doping. Sua atitude, porém, passou a ser atacada por diversos membros, que queriam a expulsão do Kremlin do evento.
Ao Estadão.com, a delatora do esquema de doping na Rússia, Yulia Stepanova, acusou o COI de "não ter ética" e apontou que atletas dopados estarão no Rio.
Ao tentar se defender, Bach explicou que a "opção nuclear" não daria resultado, numa sinalização de que não era favorável à suspensão total dos russos. Chamando as críticas que ele recebeu de cínicas, ele afirmou "rejeitar qualquer insinuação de que não luta contra o doping". O alemão defende que a Rússia "passe por uma reforma". Mas se recusa a isolar o país.
Em uma manobra política para tentar tirar a pressão sobre ele, Bach abriu o assunto para debate. O que se viu foi uma intensa troca de críticas e a constatação de que uma reforma precisa ocorrer.
Dick Pound, ex-presidente da Agência Mundial Antidoping (Wada, na sigla em inglês), foi o primeiro a falar e apontou que a decisão do COI de permitir a participação russa foi tomada sem consultar os membros da entidade. Ele ainda atacou frontalmente Bach, alertando que ele apenas havia aberto o debate para que os membros o chancelassem. "Precisamos colocar as coisas sobre a mesa", disse, acusando os congressos do COI de serem "estéreis".
Pound foi duramente criticado por não ter agido antes. "Onde estava a Wada? Por que não havia uma estratégia? ", questionou Ahmad Al Sabah. "Todos sabiam o que ocorria na Wada. Por que nada foi feito antes? Chegou o momento de revermos a Wada", defendeu Gerhard Wertein.
Alex Gilady, um dos membros mais poderosos do COI, também atacou. "Há anos a Wada recebeu essas informações e apenas disseram que não sabiam o que fazer com elas", disse. "Não é a reputação do COI que precisa ser restabelecida. Mas da Wada", insistiu. "Precisamos de uma organização que finalmente possa dar uma resposta", completou.
Mas nem todos saíram ao ataque apenas conta a Wada. Para Larry Probst, membro dos Estados Unidos no COI, "o sistema de controle de doping fracassou e não é um problema só russo".
Para Syed Ali, o COI não pode abrir mão de sua responsabilidade. Angela Ruggiero, a presidente da Comissão de Atletas do COI, também alertou que os esportistas estavam dividido. "Uma mudança e uma reforma são necessárias", alertou.
Coube ainda a Alexander Zhukov, presidente do Comitê Olímpico Russo, atacar a politização do debate. Agradecendo ao COI por ter permitido que seus atletas pudessem viajar ao Rio, ele garantiu que a Rússia vai passar por uma mudança. Mas afirmou ter ficado "preocupado com a interferência política", insinuando uma operação de governos ocidentais contra Moscou.
Ele ainda insinuou que, em outras delegações, problemas similares de doping também existiriam. "Existem atletas mais limpos que outros atletas limpos ?", questionou.