"Só aqueles que têm coragem de bater um pênalti erram. Eu fracassei dessa vez. Ponto. E me afetou por anos. Foi o pior momento da minha carreira. Eu ainda sonho com isso. Se eu pudesse apagar um momento da minha carreira, seria esse."
Na autobiografia "Una Porta Nel Cielo" (Uma Porta No Céu), de 2001, o ex-meia-atacante italiano Roberto Baggio deixa bem claro o forte impacto que lhe causou o pênalti perdido contra o Brasil na final da Copa do Mundo, em 1994.
Ele recorda ainda na obra estar "bem lúcido" quando se dirigia à marca da cal, e que planejava chutar no meio do gol, a meia altura, para evitar que o goleiro brasileiro Taffarel defendesse o chute com os pés. "Infelizmente, e eu não sei como, a bola subiu uns 3 metros e foi por cima do travessão."
Religioso -Baggio se converteu ao budismo após sofrer uma grave lesão no início da carreira-, o italiano chegou a citar o ex-piloto de F1 Ayrton Senna, que havia falecido meses antes da decisão nos Estados Unidos, entre as possíveis razões para a cobrança desperdiçada.
"Nunca havia cobrado um pênalti por cima do gol. Acho que foi o (Ayrton) Senna que puxou aquela bola para o alto. Acredito que foi ele que fez o Brasil vencer", afirmou em entrevista ao "Esporte Espetacular" em 2010.
Apesar do abalo sofrido naquele 17 de julho há 30 anos no estádio Rose Bowl, em Pasadena, "Il Divin Codino" (A Trança Divina) -apelido recebido devido ao rabo de cavalo característico- conseguiu dar a volta por cima e levantar taças importantes pelos clubes que passou, embora nunca com o mesmo brilho individual de antes.
De volta à Juventus de Turim após o Mundial nos Estados Unidos, Baggio ajudou a equipe a levantar a taça do Campeonato Italiano na temporada 1994/95, encerrando um hiato de nove anos, com direito a três assistências na partida que sacramentou o título contra o Parma.
Participou também da campanha vitoriosa da Velha Senhora na Copa da Itália e no vice-campeonato da Copa da Uefa, em 1995.
O desempenho rendeu nova indicação ao Prêmio Bola de Ouro, da revista France Football, e de melhor jogador do mundo da Fifa (Federação Internacional de Futebol). Baggio já havia vencido ambos em 1993, quando guiou a Juventus rumo ao título da Copa da Uefa. Mas, dois anos depois, acabou perdendo a disputa para o liberiano George Weah, do Milan.
Em julho de 1995, acertou sua transferência para o Milan, principal força do futebol italiano à época, ficando novamente com a taça de campeão nacional na temporada 1995/96.
Mesmo com as conquistas, o jogador perdeu espaço na 'Azzurra' devido a desavenças com o técnico Arrigo Sacchi, que deixou o meia fora da Euro de 1996. A seleção italiana não passou da fase de grupos, ficando em terceiro na sua chave atrás da Alemanha e da República Tcheca, campeã e vice do torneio naquele ano, respectivamente.
Depois de uma ausência de quase dois anos, Baggio voltou a receber oportunidades sob o novo comando de Cesare Maldini, anotando um dos gols na vitória por 3 a 0 contra a Polônia, pelas Eliminatórias para a Copa de 1998.
Fazendo uma boa campanha pelo modesto Bologna, para onde havia se transferido como forma de atuar com mais frequência do que em Milão, Baggio garantiu sua convocação à Copa da França.
Na estreia do Mundial de 98, contra o Chile, deu o passe para Christian Vieri abrir o placar, mas viu o atacante Marcelo Salas fazer dois e virar o jogo. Quando o cronômetro já se aproximava dos 40 minutos do segundo tempo, Baggio tentou cruzar na área, mas a bola desviou na mão do defensor chileno Fuentes. O próprio Baggio foi para a cobrança do pênalti, bateu rasteiro no canto direito e converteu, tornando-se o primeiro italiano a marcar em três edições da Copa.
Nas quartas de final, após empate em zero a zero contra a França, a partida foi novamente para a decisão por pênaltis. Baggio abriu as cobranças pelo time italiano e converteu, mas Albertini e di Biagio perderam, com os anfitriões avançando rumo ao primeiro título mundial contra o Brasil.
O craque ainda chegou a ter o nome cogitado para disputar a Copa de 2002, mas acabou fora da relação final de convocados do técnico Giovanni Trapattoni, que não se convenceu de que o jogador estava apto a defender a equipe após sofrer uma grave lesão no joelho no início da temporada.
Por clubes, Baggio passaria ainda pela Inter de Milão, onde formou dupla com Ronaldo e alcançou o vice da Copa da Itália, seguindo depois para o pequeno Brescia, onde encerrou a carreira, em 2004.
Ao todo, entrou em campo em 700 partidas, com 317 gols. Pela seleção italiana, foram 56 jogos, com 27 bolas na rede.
"Naquele momento [logo após perder o pênalti na final da Copa de 1994], eu acusei o golpe, mas também tomei uma decisão sobre meu futuro. Poderia ficar chorando pelo resto da vida ou poderia levantar a cabeça para tentar dar a volta por cima. Essa escolha acabou determinando meu futuro", afirmou o italiano em entrevista recente ao periódico La Republicca.