O fracasso brasileiro na Copa do Mundo de 2014 teve como uma das consequências a desconfiança da torcida e da mídia em relação à capacidade de vários jogadores servirem à seleção. A rigor, apenas Neymar ficou livre de contestações. Entre os que tiveram o futebol colocado em questão estava Willian. Ele pouco jogou no Mundial - só foi titular na derrota por 3 a 0 para a Holanda, na disputa do terceiro lugar, e entrou no fim de quatro outras partidas -, mas nem por isso escapou das críticas.
Encerrada Copa do Mundo, o técnico Luiz Felipe Scolari caiu e a CBF recorreu novamente a Dunga. O novo comandante chegou e foi logo avisando que recorreria a vários jogadores que estiveram no Mundial no trabalho de reconstrução da seleção.
Ao mesmo tempo, Willian retomava seu trabalho no Chelsea, sob a direção do exigente José Mourinho. O técnico português pediu sua contratação em 2013 - estava no Anzhi, da Rússia - e o tem como um dos artífices de seu time, por causa de sua aplicação tática.
Essa aplicação, que leva Willian a ocupar vários espaços no campo e a contribuir tanto na marcação como na criação de jogadas, também foi percebida por Dunga. O meia de 26 anos esteve em todas as convocações do treinador e participou das oito partidas da seleção após a Copa do Mundo. Tornou-se um dos jogadores mais importantes do time, ao lado de Neymar.
Prestes a ser campeão inglês pelo Chelsea, Willian falou exclusivamente com a reportagem sobre esta sua fase na carreira. Considera ter amadurecido e se diz pronto para continuar ajudando a seleção brasileira a resgatar a imagem, arranhada com o vexame na Copa do Mundo.
Agência Estado - Você tem sido presença constante na seleção. Considera que o prestígio, abalado após o Mundial, já está sendo recuperado?
Willian - Eu joguei todas as partidas desde a primeira convocação (de Dunga). Os resultados positivos são um fator muito bom para mim, para todos os jogadores, para a seleção. E também para o povo, que aos poucos vai retomando a confiança na seleção.
AE - Já se pode dizer que essa confiança foi retomada?
Willian - A gente sabe que ainda falta muito, mas estamos no caminho certo. Sempre é bom vencer (a seleção ganhou os oito jogos que fez após a Copa do Mundo). Estamos conscientes da responsabilidade que temos.
AE - Para quem esteve na Copa do Mundo a responsabilidade é maior?
Willian - Acho que sim... A responsabilidade é de todos que fizeram parte daquele grupo. Temos de continuar trabalhando, mas sem empolgação.
AE - O que Dunga passa para vocês nesse sentido?
Willian - Ele nos deixa à vontade. Tenta nos passar bastante tranquilidade. Ele procura dar muita confiança para os jogadores. Dá bons exemplos para a gente, lembrando o que aconteceu com ele no passado (Dunga lembra sempre que foi escorraçado na Copa de 90 e quatro anos depois deu a volta por cima, levantando a taça nos Estados Unidos).
AE - Fale sobre o trabalho efetivo. Como é o Dunga nos treinamentos? O que ele procura enfatizar?
Willian - Eu estou gostando muito. Os treinamentos dele são bem intensos, fortes. Ele foca os treinos de aproximação, posse de bola, quer um time compacto. Dunga prioriza treinos de compactação e aproximação.
AE - Mudou muito em relação ao Felipão?
Willian - Mudou a filosofia de trabalho, o estilo de jogo. Os treinamentos são diferentes, mas cada treinador tem a sua maneira de trabalhar.
AE - O José Mourinho, seu treinador no Chelsea, também é muito exigente...
Willian - Ele exige bastante. Na seleção eu tenho muito mais liberdade do que aqui. No Chelsea, por exemplo, eu tenho de acompanhar o lateral (adversário) até o fim. Na seleção não tenho muito essa obrigação. O Danilo se encarrega disso e eu acabo tendo mais liberdade.
AE - A exemplo do que ocorre com Dunga, o Mourinho também te considera um dos principais jogadores da equipe. É algo significativo... Ele fala claramente isso contigo?
Willian - A gente percebe. Fico feliz em ser um jogador de confiança dos treinadores. Mas é reflexo do meu trabalho e dedicação dentro de campo.
AE - Você se considera um "jogador tático"?
Willian - Fico feliz por poder ajudar a equipe. Sempre que estou em campo procuro fazer o melhor, e jogar com prazer, alegria. Tenho na cabeça que preciso procurar evoluir sempre. Mesmo porque, se me acomodar, vem outro e rouba a posição.
AE - Você falou em jogar com alegria. Faltou essa alegria na Copa?
Willian - Na Copa a gente tinha alegria. É um grande prazer jogar uma Copa, mas não é fácil, a expectativa e a pressão são grandes. Mas o que aconteceu na Copa a gente já procurou esquecer. Nada como um dia depois do outro e isso é o bom do futebol: a possibilidade de dar a volta por cima a cada jogo.
AE - A Copa América é a primeira oportunidade real para essa recuperação de prestígio. O Brasil estará preparado para vencer a competição e para ir bem nas Eliminatórias para a Copa de 2018?
Willian - A gente (os jogadores) comenta que vai ser um título muito difícil de conquistar. Mas, ao mesmo tempo, eu sempre sonhei em passar por isso, estar participando de Copa América, das Eliminatórias. Mas vai ser difícil. O Chile é uma seleção chata, há várias outras seleções fortes. Temos de manter a regularidade e a confiança.
AE - Você tem acompanhado o futebol brasileiro?
Willian - Tenho, principalmente o Corinthians. Está bem montado taticamente, dá gosto de ver. Sabe jogar com e sem a bola. Tite já esteve lá e trouxe isso de volta.
AE - Você saiu jovem do futebol brasileiro. Voltar faz parte de seus planos?
Willian - A gente sabe que no Brasil a organização deixa um pouco a desejar. É bem diferente (do futebol europeu), mas a questão é que pode melhorar. Para mim, voltar agora é difícil. Claro que penso em voltar um dia, sinto saudade do Brasil. Mas o futebol brasileiro é muito instável, se perder um jogo complica. Na Europa não há esse tipo de pressão.
AE - O que você acha dessa medida provisória da refinanciamento da dívida dos clubes?
Willian - Creio que pode ser um bom passo para que o futebol brasileiro possa se organizar. Se cada um fizer o seu trabalho, a situação melhorará.
AE - O Chelsea já pode ser considerado campeão inglês?
Willian - Estamos quase lá. No futebol não se pode bobear e o futebol inglês é muito nivelado. Mas só dependemos de nós.