O comportamento de Abel Ferreira em coletivas de imprensa voltou a ser assunto após a resposta machista direcionada à repórter Alinne Fanelli, da rádio BandNews FM, no último domingo (25), após a goleada do Palmeiras sobre o Cuiabá pelo Brasileiro.
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A reportagem conversou com jornalistas portugueses sobre a trajetória de Abel nos tempos de Braga para entender melhor a relação do técnico com a imprensa, e se sua postura mudou no futebol brasileiro.
A COLETIVA QUE FEZ ABEL GANHAR HOLOFOTES E MEMES
Em janeiro de 2019, o Braga, de Abel, enfrentou o Sporting pelas semifinais da Taça da Liga de Portugal da temporada 2018/19. Após empate por 1 a 1 no tempo normal, o Sporting garantiu a vitória nos pênaltis por 4 a 3 com brilho do goleiro Renan Ribeiro, que defendeu três penalidades na disputa.
Abel foi para a coletiva de imprensa e desabafou com murros e tapas na mesa por conta da eliminação para uma equipe com um orçamento muito maior que a sua, e uma multa que recebeu da Federação Portuguesa por três expulsões na temporada.
"Sabem o que acontece se eu não ganhar? Vou embora, dou lugar para outro. Trabalhamos todos os dias porque sabemos que há uma diferença enorme em tudo, questões econômicas, políticas e financeiras. O único setor que minha equipe consegue competir é dentro de campo. É só aí que conseguimos igualar a diferença que existe", disse o treinador ao ser questionado pelo seu comportamento à beira do campo.
"A injustiça comigo me deixa revoltado. Fui três vezes expulso, as duas primeiras muito bem expulso. É vergonhosa as multas que me deram. Em Portimão, eu não deveria ter sido expulso, as outras duas fui justamente expulso. Desde o primeiro dia que sou profissional de futebol, em 1997, muitos de vocês já me conhecem. Eu jogava para ser melhor homem e melhor jogador. Agora, para ser melhor treinador", acrescentou.
A reportagem conversou com Pascoal Sousa, jornalista do A Bola - um dos maiores jornais esportivos de Portugal -, que trabalhava na cobertura do Braga na época, acompanhou diversas coletivas de Abel, e esteve na coletiva citada acima.
"Abel sempre foi assim, com o coração perto da boca. Não é maldade, nunca vimos isso desse jeito. Simplesmente ele é assim: espontâneo e genuíno, às vezes um pouco ingênuo. É boa gente. Eu estava na coletiva emblemática, ele libertou toda a frustração que sentia. Tinha sido expulso há alguns jogos, questões com o árbitro, foi uma série de situações, e ele desabafou tudo ali. Essa situação virou piada aqui. A gente ainda dá risada até nesta quinta-feira (29). É um treinador muito emocional, era o mesmo Abel do Palmeiras quando se 'passa' na emoção", disse.
Como contou Pascoal, aquela coletiva virou piada em Portugal. Abel ganhou memes se viu nos holofotes, já que não comandava uma das principais equipes do país e suas falas não tinham tanta repercussão.
Já no PAOK, da Grécia, Abel deu uma entrevista a um canal da televisão portuguesa e falou sobre a repercussão daquela coletiva.
"Aquilo é um treinador que está alterado por algo que aconteceu. Aquele não sou eu. Fui muito criticado, isto e aquilo. O importante é olhar para aquelas imagens e reconhecer. Tenho de ser eu próprio. Mas quando olho para aquilo são as emoções a falar. São as emoções, não sou eu. Está feito e siga", disse Abel em entrevista ao Canal 11.
Paulo Pinto, outro jornalista do A Bola, admitiu que não teve contato com Abel enquanto ele trabalhou em Portugal, mas disse que os portugueses conhecem Abel pela coletiva do desabafo: "Eu não tive muito contato com o Abel, mas presenciei a maior conferência de imprensa de todas: 'Vou-me embora', expressão dele. É a coletiva mais emblemática dele em Portugal. Quando se fala em Abel aqui em Portugal, as pessoas se lembram desse episódio".
TÍTULOS NO BRASIL TRANSFORMARAM ABEL?
Na opinião de Bruno Andrade, colunista do UOL que vive em Portugal, o sucesso de Abel no Palmeiras transformaram o treinador em um personagem pior.
"Abel Ferreira do Palmeiras é ainda mais ríspido, sem paciência e arrogante em relação ao Abel Ferreira do Braga. Quando ele estava em Portugal, dirigia muito honestamente um clube médio e que tinha pouco apelo midiático. Logo, os principais confrontos, e foram muitos, aconteceram com a arbitragem e os três grandes (Benfica, Porto e Sporting), que, na visão dele, eram muitas vezes beneficiados. Não tenho a menor dúvida de que o sucesso no Palmeiras e a exposição do Brasil fizeram do Abel infelizmente um personagem pior. Tal opinião é partilhada, inclusive, por diversos jornalistas portugueses. É verdade que ele já apanhou muito, sobretudo da própria imprensa, e eu mesmo cansei de defendê-lo, mas é inaceitável o número de erros nos últimos meses. Lugano foi perfeito quando disse recentemente que o técnico alviverde insulta frequentemente o povo brasileiro. Quer ensinar tudo a todos", afirma.
As coletivas de Abel Ferreira no Brasil foram muito elogiadas em seu primeiro ano no Brasil. No entanto, com o passar do tempo, vieram as brigas com jornalistas e respostas ríspidas.
"As coletivas do Abel [em Portugal] eram uma bela aula, elevadas, a falar de futebol, a ser o mais honesto possível. Dava gosto ouvi-lo. A última declaração dele para a repórter desagradou muito aqui. Foi bastante criticado. Se fizesse isso aqui em Portugal, seria igual", disse Pascoal Sousa.
Abel Ferreira chegou ao Palmeiras no final de 2020 e em menos de quatro anos se tornou o técnico com mais títulos da história do clube, com 10: Campeonato Brasileiro (2022 e 2023), Copa Libertadores (2020 e 2021), Copa do Brasil (2020), Campeonato Paulista (2022, 2023 e 2024), Recopa Sul-Americana (2022) e Supercopa do Brasil (2023).