Quem assiste ao espetáculo "Sappho de Lesbos", que está em cartaz em Curitiba com a companhia teatral "Os Sátyros", percebe que além dos quesitos cênicos, o grupo se preocupou com a preparação corporal das atrizes. A coreógrafa curitibana Marila Andreazza Vellozo, com 21 anos de dança profissional, ensaiou as atrizes resgatando a técnica defendida no século passado pela célebre bailarina e coreógrafa americana Isadora Duncan.
"Quando li o texto do espetáculo, pensei logo em Isadora Duncan", justifica Marila. "Ela utilizava muito a improvisação e para ela interessava mais o processo do que o resultado final". Além disto, no início do século passado, a americana passou uma temporada na Grécia estudando todas as figuras de deuses e filósofos, buscando um retorno à origem do homem.
Marila comenta ainda que a personagem-título do espetáculo "Sappho de Lesbos" foi uma mulher corajosa e que rompeu vários padrões de sua época, assim como Isadora Duncan. "Elas têm muita identidade, por isso não tive dúvidas em utilizar elementos de Isadora para compor a coreografia do espetáculo".
Após um mês de preparação diária, o espetáculo estreou com dez atrizes afinadas em cena. No palco, elas executam vários rituais, como a dança do banho, a dança do fogo, a dança da sacerdotisa e a dança do banquete.
"As atrizes acreditaram tanto no trabalho que estávamos fazendo que acabaram trazendo elementos das coreografias para todo o espetáculo", elogia Marila. ''Elas estão ali de corpo inteiro".
O traço mais característico da obra de Isadora Duncan que foi explorado no espetáculo é o posicionamento não linear das atrizes em cena. Os joelhos, cotovelos, mãos e articulações em geral estão sempre flexionados. "Atualmente, as companhias apresentam movimentos mais retos e agressivos", compara Marila.
A clareza do cenário reforça a relação sensual das atrizes com o espectador e a sonoplastia, em grande parte executada ao vivo, recria o universo musical em que Sapphos compunha sua obra. Os figurinos e as máscaras utilizados pelo elenco também evidenciam ao público o culto ao corpo e ao belo da Grécia antiga.
Sappho foi uma das principais poetas líricas gregas. Considerada a primeira grande escritora da história e fundadora da literatura feminina, ela viveu, provavelmente, entre 613 e 570 A.C., na ilha de Lesbos. O local, na época, era um forte centro cultural com tradição poética. Filha de uma família aristocrática, Sappho teve educação refinada e dedicou-se desde cedo à poesia e à música.
Seus versos são exemplos clássicos da lírica amorosa, apresentando total simplicidade de temas e controle absoluto da métrica. Três séculos após a sua existência, Aristófanes de Bizâncio e Aristarco de Samotrácia recolheram e editaram a poesia de Sappho em nove livros. Sua obra se tornou tão popular que moedas foram cunhadas em sua homenagem e intelectuais se influenciaram com seus escritos.
Séculos depois, sua poesia foi colocada de lado, sendo considerada impura e sensualista. A primeira edição moderna de sua obra foi lançada em 1925, pela Oxford University Press. Dos volumes originais de suas obras, apenas fragmentos, totalizando 650 poemas, chegaram a atualidade.
Alguns deles ajudaram a criar o espetáculo "Sappho de Lesbos", que tem texto de Patrícia Aguille (que também interpreta o papel-título) e Ivam Cabral. A tragédia grega, encenada pelos Os Sátyros, fala principalmente dos últimos momentos da vida de Sappho. Apaixonada por sua jovem aluna Atthis, ela confronta-se com o declínio físico e mental da velhice e resolve entregar-se à deusa das trevas, Persephone, em troca da imortalidade.
No elenco estão ainda Yara Marçal, Andressa Medeiros, Michelle Porto, Andréa Rosa, Gisa Gutervil, Priscila Assumpção, Lucélia dos Reis, Elenize de Barro e Angelita Vaz.
O espetáculo "Sappho de Lesbos", com a Companhia de Teatro Os Sátyros, permanece em cartaz até o dia 10 de setembro, com apresentações de sexta a domingo, às 21 horas, no Espaço dos Sátyros (Rua Comendador Macedo, 330, Centro). Ingressos a R$ 15,00 (inteira), R$ 7,50 (estudantes e classe) e R$ 5,00 (bônus).