Dança, música e teatro
O grande paradoxo do nosso tempo é que a humanidade precisa desacelerar -mas rápido. Foi essa a conclusão da palestra de Yuval Noah Harari na Feira de Frankfurt, destaque do maior evento do mercado literário, nesta quarta à noite.
O intelectual israelense, autor do fenômeno "Sapiens" e do novo "Nexus", falava tanto da corrida desenfreada de um capitalismo que avassala o meio ambiente quanto da busca das empresas de tecnologia por mais e mais engajamento dos usuários.
"Muitas dessas empresas dizem em privado que gostariam, sim, de ir mais devagar e reduzir o engajamento, mas isso quer dizer que seu competidor vai mais rápido. E elas se veem sempre como os bonzinhos contra os maus. Não confiam em outros humanos, mas confiam na inteligência artificial."
Ele dividia o palco com o filósofo japonês Kohei Saito, que prega a desaceleração com base numa visão sistêmica do marxismo. Sua obra é publicada no Brasil pela Boitempo, que lança em novembro seu "O Capital no Antropoceno", tornado best-seller no Japão.
Ainda que os dois intelectuais tenham visões contrastantes -Harari se alinha mais ao pensamento liberal-, ambos se unem no alerta contra uma era do crescimento incessante que não enxerga os recursos do planeta como exauríveis, aposta em algoritmos desumanos para aumentar a produtividade e é descrente em soluções políticas que aumentem o bem-estar de forma sustentável.
A conversa que se viu no palco de Frankfurt simbolizou um apelo em comum para que todo mundo diminua um pouco o ritmo -um pacto que, convenhamos, soa tristemente utópico no mundo de hoje.
"Um dia a internet vai ser inútil, de tanta informação errada despejada lá, e as pessoas poderão enfim descobrir que livros e jornais podem ser bem úteis", disse Saito, arrancando risos e aplausos de uma plateia deveras inclinada à defesa da leitura offline.
É algo que se afina ao discurso que Harari vem defendendo mais recentemente, inclusive em entrevista à Folha, sobre a diferença entre informação, conhecimento e verdade.
"É inocente a visão de que inundar o mundo com informação é algo bom", disse ele. "Porque esse ponto de vista assume que informação é o material cru da sabedoria. E não é verdade, muita informação é lixo. Ficção é barata de fazer e pode ser tão simples quanto você quiser, enquanto a verdade é complicada e cara de se obter."
O autor de "Homo Deus" usou um exemplo quase universal. O retrato de Jesus Cristo, afirmou ele, é o mais disseminado da história e nenhuma de suas imagens é verdadeira, já que ele nunca foi retratado e a Bíblia não traz descrições sobre como ele era. Toda essa informação, apesar de não ser factual, "é útil, porque criou uma das redes mais poderosas da história, a religião cristã".
"Informações como essas conectam, mas não necessariamente são verdadeiras. A verdade muitas vezes fica por trás do silêncio e da chatice. Quem não tem tempo para se entediar raramente descobre coisas novas."
Agora, a ficção na qual mais pessoas acreditam não tem nada a ver com religião, segundo ele -é o dinheiro. "Os melhores contadores de histórias do mundo não são os vencedores do Nobel de Literatura, mas os do Nobel de Economia", brincou.