Na região de Ponta Grossa tem uma comunidade negra chamada Sutil. Sua história remonta ao século XVII: uma rica fazendeira ao morrer deixou para seus escravos uma das invernadas de suas terras, que à época media cerca de 7 mil hectares. Começa aí a árvore genealógica da comunidade que hoje tem 122 moradores (26 famílias) reunidos numa área drasticamente reduzida a 23 hectares.
A exposição "Comunidade Negra do Sutil", que abre hoje às 19 horas no Museu da Imagem e do Som, relembra esse passado e mostra o cotidiano das pessoas que ali vivem através das fotografias de Fernanda Castro e textos da antropóloga Míriam Hartum, professora do Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná, que desenvolveu um estudo sobre a organização social da localidade.
Segundo a professora mudanças ocorridas na agricultura do Estado foram determinantes para que muitas propriedades perdessem suas áreas. O governo provincial era um dos que adquiria as terras para destinar aos imigrantes europeus. Próximo a Sutil, por exemplo, está a concentração dos russos brancos.
A comunidade negra não é uma sociedade fechada, como muitos podem imaginar. Ela é aberta e muitos dos descendentes dos escravos herdeiros de 150 anos atrás, moram em Ponta Grossa. O diferencial de Sutil é que 90% dos que ainda vivem ali são uma continuidade dessa história. Suas raízes têm por base aqueles escravos.
Nas fotos de Fernanda Castro estão os registros do cotidiano, que para as pessoas da cidade soam como um resgate da paisagem interiorana. Alguns retratos somam-se aos flagrantes. As imagens foram colhidas durante o ano passado, em visitas periódicas ao lugar. "Quero mostrar como eles são felizes, amáveis", diz a fotógrafa.
Uma curiosidade sobre Sutil refere-se às crianças e adolescentes, que devido à proximidade com os russos brancos, aprenderam a falar o idioma. Quando não querem ser entendidos pelos mais velhos, conversam tranqüilamente noutra língua. As mulheres, por sua vez, costumam bordar para as russas.
Esta exposição tem a clara intenção de colocar a negritude em pauta. Fernanda reclama que "há uma invisibilidade do negro no Paraná, a começar por Curitiba", diz. O orgulho do paranaense fixou-se nos limites da etnia européia, esquecendo da contribuição dos negros na sociedade. Esse racismo velado resultou numa visão obtusa, contraditória.
Com esta mostra a fotógrafa dá início a uma série que pretende realizar futuramente, tendo o negro como tema. "É preciso que a gente fale, mostre a nossa importância, inclusive pelos caminhos da arte", afirma.
Serviço: "Comunidade Negra do Sutil", exposição de fotografias de Fernanda Castro. Textos de Míriam Hartung. Abre segunda-feira, dia 7, às 19 horas, no Museu da Imagem e do Som, rua Barão do Rio Branco, 395, telefone 232-9113. Permanece até 25 de maio. O museu abre de segunda a sexta-feira das 9 às 18 horas.