Adulterações digitais
A OpenAI transformou o ChatGPT em um buscador nesta quinta-feira (31) e entrou em concorrência direta com o Google. A ferramenta, ativada com um clique, entrega informações exclusivas de sites jornalísticos e ignora a cobrança de assinaturas, embora apresente um link para o endereço da fonte.
A ferramenta está disponível apenas para os usuários que pagam a assinatura de R$ 115 cobrada pela OpenAI. O presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais), Marcelo Rech, chama o serviço do ChatGPT de plágio, porque a plataforma "está copiando conteúdo de propriedade de veículos jornalísticos sem pedir autorização".
A OpenAI destacou no texto de divulgação as parcerias que fechou com veículos americanos e europeus, mediante pagamentos anuais entre US$ 1 milhão e 5 milhões (R$ 5,8 milhões e R$ 29 milhões), para entregar informações atualizadas. A empresa, contudo, não menciona nenhum veículo da América Latina, África ou Ásia, regiões onde a tecnologia também passou a funcionar.
O post de divulgação da ferramenta também não explica como os sites podem evitar que seu conteúdo seja usado.
Procurada via email, a empresa disse que "mantém conversas" sobre o assunto com veículos de imprensa de todo o mundo. A companhia não deu detalhes sobre parcerias com veículos de América Latina, África e Ásia.
Não houve até agora pagamentos da criadora do ChatGPT para sites jornalísticos brasileiros, afirma Rech.
A Folha de S.Paulo, por exemplo, impede que seu conteúdo seja usado pela OpenAI para desenvolver modelos de IA, mas continua tendo reportagens e artigos reproduzidos pela busca no ChatGPT. Esse veto é feito a partir de um arquivo chamado "robots.txt", disponível no código-fonte do site, em que o jornal pede para não ser visitado pelo robô da OpenAI, chamado de GPTbot.
Mas a empresa usou outro bot, chamado OAI-SearchBot, permitindo o drible ao veto. "Sites podem aparecer na busca mesmo que vetem o uso de suas informações para treinar modelos de IA generativa", afirmou a OpenAI.
Nesta quinta-feira, a reportagem fez a seguinte busca no novo sistema do ChatGPT: "Como é a tabela de pagamentos do jogo tigrinho"? A resposta foi um resumo detalhado de uma reportagem publicada com exclusividade pelo site na última terça-feira (29). O excerto descreve, inclusive, o conteúdo de um infográfico que acompanha o texto. O link para a reportagem aparece ao fim do resumo, acessível por meio de um botão.
Em testes feitos pela reportagem, o buscador da OpenAI também reproduziu informações exclusivas e protegidas por paywall (a barreira de cobrança de assinatura) de outros jornais brasileiros.
A nova tecnologia da OpenAI repete o padrão da busca de IA do Google de retirar as informações cruciais de textos de sites com credibilidade, alguns protegidos por paywall e entregá-las para o usuário do ChatGPT.
"Precisamos falar de direito autoral dos veículos jornalísticos, já que a raspagem de dados pelas IAs generativas não leva em conta o direito autoral dos produtores de informação", diz a presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, Samira de Castro.
Castro e Rech também consideram baixos os valores pagos pela OpenAI para usar conteúdo de empresas da Europa e dos Estados Unidos. Ambos pediram a criação de mecanismos de remuneração que sirvam aos veículos médios e pequenos de todo o mundo.
A ANJ recomenda que os jornais bloqueiem os robôs da OpenAI e procurem a empresa para pedir remuneração. "A terceira via são as ações por violação de propriedade intelectual", afirma Rech.
Maior empresa jornalística do mundo, o New York Times move uma ação contra o ChatGPT por uso de reportagens sem permissão. A petição não cita valores, por considerar parte da produção do jornal inestimável, e pede a destruição de qualquer modelo que tenha usado conteúdo do veículo sem autorização.
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