Docentes do Ninter (Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Resíduos) da UEL (Universidade Estadual de Londrina) estão finalizando um estudo piloto que abarcou uma nova tecnologia social desenvolvida no âmbito da Universidade: uma central de coleta multisseletiva em condomínios residenciais para separação e o acondicionamento diferenciado dos resíduos, em conjunto com um programa de educação e sensibilização ambiental.
Trata-se do Projeto "Separar é do Bem”, que consiste em um método de separação e acondicionamento diferenciado dos resíduos gerados nos grandes condomínios residenciais localizados na cidade de Londrina. O objetivo é reorganizar o espaço físico de acondicionamento dos resíduos domiciliares com o propósito de educar e responsabilizar os indivíduos para o manejo e a separação adequada pós-consumo nas residências.
O local escolhido foi um edifício residencial de alto-padrão com 26 pavimentos tipo e 104 apartamentos, localizado na Gleba Palhano. Cada unidade habitacional tem 132 m2 de área útil e 216m2 de área total. Segundo a coordenadora do Ninter, professora Lilian Aligleri (Departamento de Administração/Cesa - Centro de Ciências Sociais Aplicadas), foram os próprios moradores que procuraram o Ninter durante um evento para pedir assistência.
Pela proposta do projeto, o próprio morador acondiciona os rejeitos, orgânicos e recicláveis separadamente, numa triagem diferenciada. Em princípio, os resíduos poderiam ser separados em 12 frações: orgânico; rejeito; papel, plástico, papelão, metais e isopor; vidro; material têxtil; óleo de cozinha; pilha e bateria; lâmpada; eletroeletrônico; medicamento vencido e sobras; perfurocortante; esponja de limpeza. Contudo, já cabe às cooperativas realizar parte desta separação.
Outra iniciativa foi colocar lixeiras nas áreas comuns para incentivar a coleta segregada. Cabe lembrar que nem todos estes materiais possuem coleta embasada legalmente. É o caso do material têxtil, óleo de cozinha e esponja de limpeza. Porém, aqui novamente o projeto foi positivo, pois inovou ao aproveitar parcerias já existentes ou criar outras com entidades para cuidar de tais resíduos. É o que destaca o professor Caio Victor Rodrigues (Departamento de Construção Civil/CTU - Centro de Tecnologia e Urbanismo), que falou da preocupação do projeto em articular estas parcerias de logística reversa a fim de fechar o ciclo dos materiais, de sua produção à destinação final, gerando renda. Ele avalia que é um processo em andamento, um avanço gradual até contemplar todo tipo de resíduo.
Fases de implementação - A implementação foi feita em três fases. Na primeira (pré), o projeto fez uma pesagem diária dos resíduos (por 15 dias), aplicou um questionário nos moradores para conhecer seu comportamento com relação ao assunto e fez estudo arquitetônico do local. Na segunda etapa, comprou equipamentos e materiais, fez as modificações e instalações necessárias, imprimiu e distribuiu informativos e enviou banners e vídeos para as redes sociais dos moradores. Na terceira fase (pós), entre 45 e 60 dias depois, nova pesagem e novo questionário. Alguns dados tiveram pouca alteração: a massa semanal de resíduos supera 1 tonelada, dois terços são encaminhados como orgânicos/rejeitos, e segunda-feira permaneceu como o dia da semana em que se recolhe mais massa de resíduos. Ou seja, a pandemia parece ter alterado pouco os hábitos. Mas os dados ainda serão devidamente avaliados.
Mais do que realizar a coleta seletiva, o projeto pretende estimular a cultura de cuidados com o descarte de resíduos e um senso de coletividade motivador das ações, a partir da conscientização e sensibilização dos moradores. Tudo passa ainda pela orientação de síndicos e zeladores e pelo estabelecimento de um layout que facilita não só a coleta, mas a própria educação ambiental. Aliás, no próximo dia 5 comemora-se o Dia Mundial do Meio Ambiente.
Para isso, o projeto montou um Plano de Comunicação. De acordo com o professor Claudio Pereira (Departamento de Design/Ceca - Centro de Educação, Comunicação e Artes), foi uma tarefa bastante trabalhosa, mas desenvolvida "a várias mãos”. A professora Camila Lopes (Departamento de Design/Ceca) disse que os informativos, por exemplo, foram pensados para levar informações importantes de educação ambiental tanto para os moradores quanto para os síndicos e zeladores, com linguagem adequada e garantia de que chegassem ao referido público. A estratégia de colocar os informativos – atualizados a cada 10 dias – nos elevadores, por exemplo, assegurou sua leitura.
Claro que a arquitetura de um edifício pode favorecer ou não as estratégias de comunicação. Mas para o professor Claudio isso não inviabiliza o trabalho. Ele explica que a própria Central de Resíduos é modulável, ou seja, pode ser montada de diferentes maneiras conforme a configuração do espaço disponível. A professora Lilian lembra que decidir onde a Central ficaria foi o primeiro desafio da equipe.
Outro ponto, observado pelo professor Claudio, está na própria ideia de uma Central de Resíduos – um local cheio de lixo. Aí o Design trabalhou também, de modo a criar um espaço agradável, com uma parte visual simbólica que lembra muito mais uma loja de shopping. "Parece uma lojinha de resíduos”, compara o professor. É tão verdade que a Central já está se tornando atração do condomínio e atraindo o interesse de outros condomínios e administradoras. Até carrinho elétrico (como os usados em campos de golfe) para transportar resíduos o condomínio comprou.
A comparação com uma lojinha não é à toa. Claudio e Lilian lembram que uma das perspectivas do projeto é que a triagem mais qualificada leve a um maior rendimento dos cooperados. Eles anotam que é grande o número de mulheres arrimos de família nas cooperativas, e que é muito importante que os moradores dos edifícios tenham consciência do que acontece com os resíduos depois de coletados; que o sustento de famílias depende destes resíduos e os moradores podem ajudar muito neste processo. Daí, por exemplo, os vídeos que os cooperados enviaram aos moradores em suas redes sociais. A professora Lilian destaca esta ação.
O projeto começa, em junho, a avaliar muitas de suas ações. Por exemplo, verificar o quanto os moradores se sensibilizaram em relação à importância da coleta multisseletiva e assimilaram os conceitos de educação ambiental. Como diz o professor Claudio, é medir o comportamental (o que se prega) e o atitudinal (o que se faz).
Verticalização - O Projeto Separar é do Bem tem sido desenvolvido há um ano e meio e a Central no edifício piloto está operando há mais de dois meses. A ideia de implementar um programa de coleta multisseletiva em condomínios residenciais vem, em grande parte, do fato de que Londrina é uma cidade que optou pela verticalização, sobretudo na última década e meia, quando parte da zona sul se transformou de uma área de chácaras para uma de edifícios residenciais de médio e alto padrão. De fato, Londrina já esteve duas vezes em primeiro lugar no ranking de verticalização de cidades. A primeira foi na virada da década de 80 para 90. A segunda, nos anos 2000.
De acordo com dados da Prefeitura, em 2019 o município possuía 2.246 edifícios residenciais e 338 condomínios horizontais. Já de acordo com dados do Creci-PR (Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Paraná), Londrina é a sexta cidade brasileira em número de edifícios acima de 12 andares e décima segunda no mundo na relação prédio por habitantes.
Pioneirismo - Por outro lado, segundo o Guia do Projeto, Londrina é uma cidade pioneira na coleta seletiva dos resíduos domésticos recicláveis. O sistema de coleta seletiva foi instituído na cidade em 1996, e desde está alicerçado sob o "Programa Londrina Recicla”, instituído pelo Decreto Municipal 829/2009. Atualmente, abarca 100% da área urbana, incluindo distritos, patrimônios e vilas rurais, totalizando mais de 230 mil domicílios. O município reconhece a coleta seletiva de resíduos como um serviço público continuado e também foi pioneiro na realização de contrato de prestação de serviços de coleta e triagem porta-a-porta de materiais recicláveis junto às cooperativas, sendo que a contratação se dá por meio de dispensa de licitação. São sete cooperativas e 360 cooperados, todos em situação de vulnerabilidade social.
Interdisciplinar - O Ninter é composto por professores de oito Departamentos de seis dos nove Centros de Estudos da UEL (Cesa, CTU, Ceca, CCS, CCE e CCB) e conta ainda com a atuação da Prefeitura do Campus Universitário. Seu objetivo é unir saberes científicos e tecnológicos para criar soluções relacionadas às questões de resíduos em Londrina e região, contribuindo para uma sociedade mais sustentável.
A professor Lilian Aligleri enfatiza a atuação interdisciplinar do projeto, inviável se não fosse a expertise de cada membro em sua própria área.. Saiba mais sobre o Ninter no site ou na rede social do projeto.