A UEL (Universidade Estadual de Londrina) está desenvolvendo uma pesquisa científica com o objetivo de analisar peças arqueológicas de cerâmicas encontradas em senzalas. O projeto é conduzido por Cheila Sumenssi de
Araujo, no Programa de Pós-graduação em Física do CCE (Centro de Ciências Exatas). A pesquisadora utilizou conceitos da física nuclear para estudar cerâmicas
arqueológicas de mais de 200 anos, encontradas próxima às senzalas de
duas fazendas de Campos do Goytacazes, no Rio de Janeiro.
Nem sempre a hipótese levantada para um estudo é confirmada ao final
da pesquisa científica. Mas isso abre a possibilidade de novas
investigações, assim como aconteceu no projeto conduzido por Sumenssi.
A hipótese inicial para este estudo era de que as peças, como pratos e
utensílios, teriam sido produzidas pelos escravos, de forma
completamente artesanal com argila das fazendas Colégio dos Jesuítas e
São Bento. A tese foi levantada pelo arqueólogo Luís Claudio Symanski,
da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que identificou os
materiais em 2012. Atualmente, eles fazem parte do projeto “Café com
açúcar: arqueologia da escravidão em uma perspectiva comparativa no
sudeste rural escravista, dos séculos XVIII e XIX”, considerados um dos
primeiros projetos da América Latina pensado na cultura e dinâmica
social dos escravos.
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Em contato com professor sênior da UEL, Carlos Roberto Appoloni, do Departamento de Física, foi iniciada a parceria para análise das peças. Sob orientação do professor Appoloni e Renato Akio Ikeoka, do mesmo Departamento, Cheila Sumenssi fez uma comparação entre a argila das fazendas e as peças de cerâmica. Para isso, desenvolveu a pesquisa por meio da arqueometria, definida como aplicação de técnicas da física e da química para a análise de materiais arqueológicos, sendo possível extrair informações tecnológicas, culturais e históricas.
Análise de elemento químico
As amostras foram submetidas a um feixe de raio X e a energia liberada
por elas foi captada por um computador, que identificou o elemento
químico ali presente. Segundo as análises, as peças cerâmicas
apresentaram composição química diferente da argila das fazendas, pois
estas últimas estavam com maior concentração de ferro. Com isso, ficou
comprovado que elas não foram produzidas pelos escravos naqueles locais.
“Mostra que era muito mais complexo a relação ali. Se não foram eles,
de onde vieram?”, questiona a pesquisadora.
De acordo com Cheila, o estudo interdisciplinar valoriza a cultura e a
história de negros e escravos. Ela relata que antes da década de 1970,
as pesquisas identificadas eram apenas estatísticas, encontradas em
registros de compra e venda pelos donos das fazendas. “É importante para
entender que eram pessoas, tinham família, interagiam entre si. Isso
precisa ser lembrado”, afirma.
Pela relevância do tema, Cheila Sumenssi vai conduzir uma pesquisa paralela ao projeto de doutorado sobre as peças cerâmicas das Casas Grandes das duas fazendas do Rio de Janeiro. O objetivo é identificar se são da mesma origem das utilizadas pelos escravos. Há uma nova hipótese de que foram produzidas em uma olaria localizada perto das fazendas. No doutorado, ela segue no estudo interdisciplinar, que tem o objetivo de analisar cerâmicas do Peru datadas com mais de quatro mil anos.