Do lado de dentro, jovens lotam a igreja para escutar palestras do vereador Nikolas Ferreira (PRTB-MG) e da deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PSL-SC), duas coqueluches do conservadorismo nacional que pintam universidades, sobretudo as públicas, como máquinas de transformar estudantes em groupies de Karl Marx.
Lá fora, um estande anuncia a estreia da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, do pastor Silas Malafaia, no setor educacional: a FVC (Faculdade Vitória em Cristo), que abriu em janeiro um processo seletivo para preencher 500 vagas em teologia, sua primeira graduação.
Divulgado no Imersão Amplitude, evento para promover o engajamento político entre a garotada evangélica, o curso foi credenciado pelo MEC (Ministério da Educação) em dezembro, na modalidade ensino a distância –só as provas serão presenciais, no fim de cada um dos seis períodos previstos.
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Ao longo de três anos, os alunos terão, além de aulas sobre fundamentos bíblicos básicos, disciplinas como psicologia e empreendedorismo.
Diz Malafaia que a juventude não pode "ficar só comendo na mão de professor esquerdopata na faculdade, na escola em que eles estão". Daí dar o primeiro passo no setor, que não deve ser o último. "Então, isso [abrir o polo de educação] era um sonho. Estamos engatinhando nessa área. Meu sonho é fazer escolas de excelência pra criança."
Colégios de ponta custam, hoje, "uns três, quatro, cinco pau", calcula o pastor. "Quero fazer escolas desse nível pra pagar 200 pratas, pra igreja subsidiar. Escola top, pro moleque que entrar sair falando inglês sem precisar fazer cursinho", diz o pastor que criou "ojeriza" pelo idioma" após uma péssima experiência com uma professora que o ensinava quando era estudante.
Foco na faculdade, por ora: a mensalidade para aprender teologia é de R$ 399, mas há descontos generosos para membros da igreja de Malafaia. Pastores da casa recebem o maior abatimento: 60% do valor. O processo seletivo teve cerca de quatro candidatos por vaga.
Malafaia conta que o plano não é criar um núcleo universitário com o selo Vitória em Cristo, mas a oferta de graduações deve se estender nos próximos anos.
"Nossos sonhos são grandes porque nosso Deus é grande", afirma o pastor Isaías Júnior, diretor-geral da FVC. Coronel do Exército, hoje na reserva, por décadas ele deu aula em colégios militares. Também já formulou questões para o banco nacional de onde saem as perguntas para provas como a do Enem.
"Pretendemos lançar cursos de graduação e pós-graduação em diversas áreas: pedagogia, administração, licenciaturas, psicologia, direito, enfim, todas as áreas do conhecimento."
A FVC é, sim, de Deus, segundo Isaías. "Somos uma instituição confessional, evangélica e pentecostal, ligada à Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Essa é nossa marca e nosso diferencial."
Com um adendo: "Isso, porém, não significa que nosso currículo seja hermético. Seguimos as diretrizes do MEC e propomos uma abordagem dialógica em relação às diversas correntes filosóficas e teológicas".
Mestres ou doutores, os professores são todos cristãos, mas vêm de igrejas diversas, como a Batista e a Maranata. As mantenedoras da faculdade são a Associação Vitória em Cristo e a Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Ou seja, dízimos e ofertas ajudam a pagar tudo.
Algumas das primeiras universidades americanas, como Harvard, Yale e Princeton, foram fundadas por protestantes.
No Brasil, a incursão de religiosos no ramo vem de longa data, vide instituições já de renome, como a católica PUC (Pontifícia Universidade Católica), a presbiteriana Mackenzie e a Universidade Metodista de São Paulo. Já instituições pentecostais, que representam o maior filão evangélico do país, têm menos tradição no ensino superior.
Pastor e doutor em Ciências da Religião, Kenner Terra lembra o pioneirismo do Ibad (Instituto Bíblico das Assembleias de Deus), fundado em 1958 por um casal de missionários que organizava aulas para oito alunos numa casa alugada. Só em 2016 conseguiu o status de faculdade no MEC, com a Fabad.
O pastor José Wellington Bezerra da Costa, por anos presidente da Convenção-Geral das Assembleias de Deus no Brasil, conseguiu em 2005 credenciar sua Faculdade Evangélica de Tecnologia, Ciências e Biotecnologia. Há quatro graduações hoje listadas no ministério: teologia, direito, administração e pedagogia.
Em 2018, o Republicanos, costela partidária da Igreja Universal do Reino de Deus, anunciou a Faculdade Republicana. Em 2021, montou duas turmas presenciais (ciência política e gestão pública) e uma penca de cursos remotos, de marketing a educação física.
Para o pastor Clemir Fernandes, codiretor-executivo do Instituto de Estudos da Religião, ao abrir seu próprio nicho educacional "Malafaia deve estar buscando diversificar suas ações como empresário da religião, porque é um mercado crescente".
"As igrejas dele se expandiram e também precisam formar 'mão de obra' no estilo próprio", afirma.
Malafaia prefere citar um provérbio bíblico (22:6) para justificar o
interesse de religiosos pela educação. "É o sábio Salomão que disse:
ensina a criança no caminho em que deve andar para que quando
envelhecer, sabe, quando ficar velha, quando chegar na idade da
maturidade maior, ela não tenha problemas".
Em seguida, o pastor volta à carga contra seus inimigos de hábito. "Não vem de comunistas nem de socialistas o interesse primeiro em educação. Veio da cultura cristã."