Com o objetivo de trazer o mundo corporativo para o debate sobre desigualdade racial, foi lançado nesta quinta-feira (8) o Pacto de Promoção da Equidade Racial. A iniciativa, que envolve entidades da sociedade civil, especialistas e investidores, pretende estimular as empresas a adotarem ações para enfrentar o problema.
Entre as novidades, está a criação de um índice que mede o desequilíbrio racial dentro das organizações. O sistema vai funcionar como um rating (classificação), calculado a partir da quantidade de pessoas negras em cada cargo e da massa salarial que elas representam.
Segundo os coordenadores do projeto, a ideia é propor um protocolo sobre questões raciais no Brasil, para que os negócios trabalhem o tema internamente, por meio de ações afirmativas -como cotas e processos seletivos exclusivos para negros-, e externamente, com investimentos em educação pública e na formação desses profissionais.
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A adesão ao Pacto é voluntária, feita por meio de um termo em que a organização manifesta seu interesse em seguir o protocolo. Empresas como Natura, Suzano, Amil e Gerdau, que ajudaram a fundar o projeto, já sinalizaram interesse em aderir, segundo os coordenadores.
"A gente está propondo que as empresas, além de adotar ações afirmativas, façam um investimento em equidade racial. Elas precisam investir na formação de pessoas negras para que, em uma geração, a gente tenha mais representatividade nas organizações", diz Jair Ribeiro, presidente da Associação Parceiros da Educação e um dos coordenadores do Pacto de Promoção da Equidade Racial.
Segundo ele, o objetivo é fornecer um roteiro a ser seguido pelas empresas, para que elas sejam não apenas antirracistas, mas protagonistas nessa causa.
"Hoje a pauta está na mão do governo e de algumas pessoas, mas as empresas fazem parte do ecossistema brasileiro. Elas são stakeholders desse legado da sociedade que é a desigualdade racial, então elas têm que participar também", afirma.
Ribeiro é um dos idealizadores do Pacto, que começou a ser desenvolvido há cerca de um ano. De lá para cá, o projeto ganhou o apoio de 140 pessoas, como Adriana Barbosa, idealizadora da PretaHub, aceleradora de negócios criados por empreendedores negros; Fábio Alperowitchm, cofundador da Fama Investimentos; Thiago Amparo, advogado e colunista da Folha; e Selma Moreira, diretora executiva do Fundo Baobá, fundo financeiro dedicado à promoção da equidade racial.
Quem também ajudou a construir o projeto foi Helio Santos, presidente do Conselho da Oxfam Brasil, cujo ativismo em prol dos direitos dos negros data dos anos 1970. Para ele, um dos propósitos é trazer o mundo dos negócios para a pauta racial.
"A história das ações afirmativas no Brasil tem foco no âmbito público. Ainda há uma grande dificuldade em relação ao ambiente corporativo, que é onde a maioria dos empregos está", diz.
Além de incentivar o compromisso com o tema, o grupo desenvolveu um mecanismo próprio de mensuração: o IEER (Índice ESG de Equidade Racial).
Elaborado pelos economistas Sergio Firpo, Michael França, Lucas Rodrigues e Rafael Tavares, o indicador calcula uma nota para o quão equilibrada racialmente uma empresa está.
O IEER pode variar de H (maior desequilíbrio racial) até A++ (maior equilíbrio racial), seguindo o modelo comumente utilizado por classificadores de risco e gestora de ativos.
As empresas que aderirem ao Pacto poderão calcular o seu respectivo índice, com o apoio de uma empresa certificadora.
"A gente mede a participação de negros em cada ocupação -na diretoria, por exemplo- e compara com a população negra economicamente ativa do estado em que a empresa está inserida", explica França, que também participou da construção do Ifer (Índice Folha de Equilíbrio Racial).
Segundo ele, o indicador é interessante pois permite comparar o desempenho de empresas em relação ao tema, o que pode ajudar a acelerar políticas de inclusão.
Além da presença de pessoas negras na organização, o IEER leva em consideração a relação cargo/salário. Para Gilberto Costa, diretor executivo do JP Morgan no Brasil e um dos coordenadores do Pacto, esse é um dos grandes diferenciais do índice.
"Não basta ter pessoas negras dentro das empresas. Também estamos olhando em que cargo essas pessoas estão e qual a massa salarial que elas representam. Um dos problemas da sociedade brasileira é que temos uma grande quantidade de pessoas negras nos cargos de entrada", diz.
Segundo Costa, o indicador vai proporcionar a acionistas, investidores e sociedade civil um instrumento para verificar como está a desigualdade racial nas empresas. Na visão dele, a ferramenta é especialmente relevante na atual conjuntura, em que o mercado financeiro está pressionando as empresas a adotarem a agenda ESG (sinônimo para boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa).
"O índice é o coração do Pacto de Promoção da Equidade Racial. Ao trazer essa linguagem que o mercado entende e transformar a questão em algo mensurável, o diálogo com os investidores fica muito mais fácil. E são eles que têm poder de pressionar as empresas de forma positiva", afirma.