Na última década, a qualidade de ensino recebida por pessoas negras no Brasil avançou, apesar disso, não foi o suficiente para resolver a desigualdade racial na educação do país. É o que aponta um novo estudo realizado pelo Cedra (Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais).
Segundo os pesquisadores, estudantes negros obtiveram em 2019 índices semelhante ao que brancos tinham em 2010.
A taxa de aprovação de alunos negros que fazem ensino médio, por exemplo, cresceu de 74% para 84,3% no período analisado, enquanto a de brancos foi de 81,9% para 89,4%. Ou seja, a diferença entre elas diminuiu de 7,9 pontos percentuais para 5,1.
Efeito semelhante aconteceu na taxa que mede se os estudantes estão na série correta para a sua idade. Em 2010, 20% dos alunos negros no ensino fundamental estavam atrasados, taxa que caiu para 13,6% em 2016. Entre brancos, a redução foi de 8,2% para 6,2%.
No ensino médio, a diminuição foi de 44,1% para 31,2% entre negros, contra uma queda de 23,4% para 16,9% para brancos, de acordo com o estudo.
"A distorção idade-série se produz desde os ensinos fundamentais 1 e 2 e essas diferenças vão se acumulando ao longo dos anos, aumentando distâncias nas demais séries", diz Marcelo Tragtenberg, integrante do Conselho Deliberativo do Cedra.
As diferenças se mostram nos números: para cada 12 negros matriculados no ensino médio e fundamental, havia 10 alunos brancos.
Isso acaba se refletindo no EJA (Educação de Jovens e Adultos), etapa na qual havia 28 estudantes negros para cada 10 alunos brancos em 2019. "A distorção idade-série muito grande no fundamental e no médio vai levando os alunos para o EJA, onde 75% dos alunos declarados são negros", diz ele.
Para Cristina Lopes, diretora-executiva do Cedra, os dados mostram que apesar de avanços na escolaridade no geral, a distância entre os dois grupos continua existindo. "Daí a necessidade de se olhar sempre para além da média estatística e de implementar políticas educacionais focadas nos estudantes negros para que a educação avance de fato para todos", diz.
Para chegar a este resultados, os pesquisadores cruzaram dados do Censo da Escolar (Educação Básica) de 2010 a 2019 e da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) de 2012 a 2019.
O estudo mostra também que as desigualdades alcançam também o perfil racial das escolas. Em 2019, as unidades de ensino predominantemente brancas (com 60% ou mais de estudantes brancos) mantinham 62,2% de professores com a formação adequada, ou seja, com a licenciatura na área em que leciona. Já naquelas em que a maioria é de alunos negros, o percentual caía para 33,2%.
Outro fator a ser analisado é a diferença entre escolas públicas e particulares: na rede pública havia 15 estudantes negros para cada 10 brancos, já na rede privada, havia 6 estudantes negros para cada 10 brancos.
O estudo aponta ainda que a proporção de negros acima de 15 anos sem instrução ou com fundamental incompleto caiu de 46,7% para 37,7%, enquanto a de brancos diminuiu de 33,1% para 26,8%. Assim, a diferença entre os dois grupos foi reduzida de 13,6 pontos percentuais para 10,9 pontos percentuais.
A diferença fica maior entre as mulheres com idade acima de 15 anos: o número passou de 13,6% em 2012 para 10,9% em 2019.
Contudo, apesar da redução na desigualdade entre mulheres negras e brancas, acima de 15 anos e sem instrução ou com fundamental incompleto, o atraso educacional não foi corrigido.
Com a aprovação da Lei de Cotas para acesso ao ensino superior em 2012, houve uma mudança no perfil de quem acessa a graduação, com o aumento de pessoas negras. O estudo, porém, mostra que a desigualdade ainda existe nesta etapa.
O levantamento aponta que a proporção de mulheres negras no ensino superior, por exemplo, subiu de 15, 2% em 2016 para 16, 9%, em 2019.
A quantidade de mulheres brancas ficou praticamente estável nesse período (foi de 29% para 29,4%), mas segue quase o dobro da de negras.
Em 2012, apenas 6,6% das pessoas negras acima de 25 anos concluíram o ensino superior, em comparação com 18,7% das pessoas brancas. Em 2019, a distância permaneceu praticamente a mesma, com taxas de 11,1% para negros e 25% para brancos.
"A Lei de Cotas no ensino superior apresentou resultados efetivos, o que demonstra que ações afirmativas na educação funcionam. No entanto, precisamos fortalecer políticas de apoio à permanência dos estudantes negros nas universidades até sua conclusão", afirma Tragtenberg.