A pandemia trouxe mais verbas para pesquisas relacionadas ao novo coronavírus, mas, segundo algumas das principais entidades científicas do país, as verbas ainda estão longe de serem suficientes. Além disso, os cortes passados de investimentos se refletem agora na dificuldade do país em lidar com a Covid-19.
O governo federal destinou pelo menos R$ 100 milhões, provenientes do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), para o enfrentamento científico da pandemia, parte desse recurso destinado a projetos de pesquisa.
No dia 7 de maio, durante a Marcha Virtual pela Ciência, o ministro Marcos Pontes anunciou outros R$ 352 milhões em recursos para projetos de pesquisa, inovação e infraestrutura no combate a pandemias, valor que deve ajudar a criar laboratórios de biossegurança nível 4 (o mais elevado e dedicado ao trabalho com patógenos que podem ser transmitidos pelo ar).
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Mesmo com os novos investimentos, entretanto, pesquisadores afirmam que o volume ainda não é suficiente, levando em conta ainda os cortes que o orçamento da ciência sofreu nos últimos anos.
A ideia de representantes da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e da ABC (Academia Brasileira de Ciências) é da liberação integral dos valores do bilionário FNDCT.
Segundo Helena Nader, vice-presidente da ABC, são positivos os investimentos atuais contra a pandemia, mas os valores ainda são baixos.
"Eu acho que o coronavírus mostra que a ciência é potente e está dando respostas", avalia ela.
"A parte de saúde coletiva, epidemiologia, mostra a força que o país tem. É uma área que vem da época do Oswaldo Cruz. Mas o recurso, mesmo para o coronavírus, é pífio na minha visão."
Ildeu de Castro Moreira, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e presidente da SBPC, afirma que sociedades científicas tinham proposto um valor de pelo menos R$ 500 milhões (valor que se aproxima ao anunciado por Pontes).
"Certamente foi um avanço importante [o valor anunciado pelo ministro]. Mas continuamos insistindo na liberação integral dos recursos do FNDCT, que serão muito importantes também para a saída da crise econômica", afirma Moreira.
"Ele [o fundo] é um reserva de contingência. Se é um momento que estamos precisando de reserva para enfrentar essa situação crítica, é agora. Estamos tentando através de várias maneiras convencer a liberação", completa.
Os valores do fundo poderiam ser aproveitados, segundo Moreira, para fomento à inovação tecnológica, em particular em pequenas e médias empresas e para a infraestrutura de laboratórios que devem ser recuperados e atualizados, o que pode ajudar em questões de saúde e em outras nas quais o país sofre de dependência tecnológica.
O baixo investimento em ciência nos últimos governos pode ser visto na prática nos problemas do país com os testes para o novo coronavírus.
"O fato da ciência ter sido 'desfinanciada' nos últimos anos fez com que muitos laboratórios tivessem dificuldade. No momento, ter que importar insumos, com o mundo inteiro tentando enfrentar a pandemia, fica mais difícil, com preços mais caros", diz o presidente da SBPC.
Moreira afirma que o país precisa aproveitar o momento, que trouxe a percepção que a ciência é importante para a sobrevivência literal das pessoas, os motores da economia.
Acrescenta ademais que o recurso integral do FNDCT não é importante só para o combate contra a Covid-19 neste momento, mas também para o processo posterior à pandemia.
"Parar de investir em ciência foi a maior burrice que o país fez", afirma Nader.
O MCTIC (Ministério da Ciência e Tecnologia) afirma que já em fevereiro começou a se mobilizar, escutar pesquisadores e instituir ações prioritárias quanto a Covid-19 –uma delas, a liberação dos R$ 100 milhões do FNDCT.
O MCTIC colocou em ação contratações diretas de grupos de pesquisa na área de sequenciamento do vírus, disse Marcelo Morales, secretário de políticas para formação e ações estratégicas do MCTIC, em webnar sobre financiamento de pesquisa produzido pelo Instituto Serrapilheira (primeira instituição privada de fomento à ciência do país).
O secretário também afirmou que o MCTIC investiu em produção de insumos para fabricação de testes diagnósticos, área que ainda enfrenta profundos problemas de escassez no Brasil.
Também foram destinados recursos para produção de vacinas em São Paulo e Minas Gerais e para pesquisa de drogas.
Além disso, houve investimento do setor privado para pesquisas, como é o caso do Serrapilheira e do Idor (Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino).
No caso do Serrapilheira, o instituto, durante a pandemia, mudou a sua abordagem de fomento à pesquisa.
"A ciência que vai ser feita agora para resolver a crise, na urgência, não é uma ciência de grandes descobertas, é aplicar o que já se sabe fazer" disse Hugo Aguilaniu, diretor presidente da instituição.