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Colégios selecionados para serem terceirizados voltam a discutir projeto em Londrina

24 nov 2022 às 19:15

Alunos, pais e professores dos colégios estaduais Roseli Piotto Roehrig, Lucia Barros Lisboa, Olympia Tormenta e Rina Maria de Jesus Francovig se reuniram, nesta quarta-feira (23), com o Núcleo Regional de Ensino de Londrina para sanar dúvidas sobre o modelo de gestão escolar proposto pelo governo do Paraná que visa descentralizar do setor público o gerenciamento das unidades de ensino.

 

Como já adiantado pelo Portal Bonde no início do mês, o governo do Paraná pretende entregar para empresas privadas a administração de 27 colégios estaduais - em Londrina, será privatizada a gestão das quatro escolas citadas anteriormente. O edital prevê que somente instituições de ensino particulares com mais de cinco mil alunos e nota média acima de 550 pontos no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) estejam aptas a participar do credenciamento.


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A coordenadora do NRE, Jéssica Pieri, foi a responsável por apresentar à comunidade os principais pontos do edital, no Colégio Estadual Roseli Piotto Roehrig. As demais unidades escolares tiveram a presença de outros profissionais da Educação. 


O discurso de Jéssica Pieri foi marcado por gritos de protesto de alunos e perguntas que ela não soube responder. Cortando, diversas vezes, as falas de pais e funcionários, a chefe do Núcleo de Educação parecia não estar à vontade com as indagações.


Em sua explanação, ela justificou que o projeto batizado de “Parceiro da Escola” vai "ajudar o diretor a resolver problemas do dia a dia".

 

“O diretor recebe muitas demandas, mas não tem sido fácil manter a frequência e o acesso às plataformas [de ensino]. Nós, funcionários públicos, temos direito, se ficarmos doentes, a três dias de atestado por mês. Vocês já ouviram os filhos de vocês falarem que tiveram aula vaga? Quando isso acontece, o diretor faz a parte dele: liga no Núcleo [Regional de Educação], onde eu sou chefe. Só que [para os] três dias de atestado, o diretor e o Estado não têm como pagar uma professora para substituir. A obrigação desse grupo [empresa] que ganhar será imediatamente colocar um substituto desse professor que tem direito ao atestado”, explanou.


Pieri também afirmou que o projeto está sendo alvo de notícias falsas nas redes sociais e explicou que nenhum professor vai ser redirecionado ou demitido.

 

“Vão mudar os professores? Não. O edital diz que todos os professores QPM (concursados) da escola permanecerão na escola. Todos os professores com aula extraordinária permanecerão. Já com os professores PSS (temporários), o diretor tem a possibilidade de falar com a empresa sobre aqueles que já estão [lecionando] aqui, e esses mesmos professores continuarão trabalhando aqui. O PSS terá duas opções: pegar aula lá no Núcleo Regional pelo cadastro, ou pegar aula aqui direto com esse grupo educacional", disse a coordenadora do NRE.

 

Um dos pontos mais discutidos foi a entrega de uniformes escolares de “maneira gratuita” por parte da empresa vencedora. Atualmente, a compra dos uniformes é feita diretamente pelos pais ou responsáveis.

 

“A empresa tem a obrigação de oferecer o uniforme para cada aluno. Vocês podem perguntar: ‘qual o objetivo da empresa dar ainda o uniforme?’ Essa foi a negociação da Secretaria de Educação juntamente com o governo do estado para oferecer aos senhores”, diz, sem dar mais detalhes sobre a negociação.

 

A chefe do Núcleo Regional de Educação também foi questionada sobre os critérios da escolha dos colégios, sendo três na periferia do município. No edital, é explicado que as unidades com os piores índices no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) seriam as selecionadas, mas Pieri argumenta outro motivo.

 

“Não é só o resultado do Ideb, porque, graças a Deus, as coisas aqui [Roseli Piotto Roehrig] têm melhorado. Aqui é um lugar que tem a possibilidade dessa parceria aumentar, de acolher mais alunos. De aumentar o espaço físico.”


Professores questionam


Interrompendo a apresentação de Pieri, uma professora do Colégio Roseli Piotto também discursou sobre as mudanças, questionando o porquê de uma empresa ser privilegiada em detrimento da administração regional.

 

“Se é uma proposta tão boa, por que esse dinheiro não veio para a escola investir? Precisa de uma empresa particular vir e ser parceira nossa? Precisa vir uma empresa particular exercer o nosso papel? Sempre estivemos juntos com vocês. Nós sempre trabalhamos na comunidade. Eu estou aqui desde que abriu a escola. Dei aula para pais e para filhos. Temos que pensar no que traz de benefício.”

 

A reunião teve, ainda, a participação da professora e secretária de funcionários da APP-Sindicato estadual, Elizabete Dantes, que também discursou - aparentemente contra à vontade de Pieri, que chegou a lhe pedir licença duas vezes - com críticas ao projeto, além de questionamentos sobre o interesse das empresas.

 

“Gente, vocês acham que a empresa vai pegar uma escola para não ter lucro? Agora, nós vamos passar [a administração] para uma empresa que vai pegar a escola e não vai ter lucro? Com certeza essa empresa vai ter lucro. O uniforme que vocês vão ganhar, vocês acham que vai ser de graça? Empresa nenhuma quer trabalhar de graça. Isso é revoltante e está nas mãos de vocês”, disse Dantes, aplaudida pela comunidade escolar.


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Lucro e 'altruísmo'


Jéssica Pieri se comprometeu “a encontrar respostas sobre qualquer questão que gerasse dúvida no edital". Procurada para responder sobre a maneira que as empresas vão lucrar - já que não haverá aumento de verba, somente troca de gestão - ela disse não saber e aconselhou a perguntar ao governo do estado.


Procurada, a Seed (Secretaria Estadual de Educação) afirmou que o lucro das empresas que assumirem os colégios públicos dependerá da gestão aplicada por elas e alegou certo altruísmo de algumas interessadas. "[...] Muitas empresas se interessaram pelo projeto não pelo lucro, mas pela contribuição que podem dar à educação paranaense", afirmou a pasta por meio da assessoria de imprensa.


O encerramento da reunião foi marcado por alunos engajados politicamente, professores e funcionários preocupados com o futuro e pais de alunos divididos e, aparentemente, perdidos entre as promessas do novo projeto e os apontamentos e críticas de funcionários da instituição de ensino.


A consulta pública, que decidirá se o projeto será aplicado a partir do ano letivo de 2023, acontecerá nos dias 5, 6 e 7 de dezembro. A votação estará aberta a pais, professores e funcionários, segundo Pieri.



*Sob supervisão de Fernanda Circhia

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