Faz 17 anos que o dia 29 de janeiro entrou no calendário de uma parcela da população brasileira como um dia para reivindicar direitos.
É nesta data que as pessoas transgênero buscam visibilidade para não serem esquecidas nas políticas públicas e tampouco nas iniciativas privadas.
As pessoas trans integram a letra T da sopa de letrinhas da sigla LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, trans e intersexuais). No T, portanto, estão as mulheres e os homens trans, além das travestis.
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Foi em 2004 que a população T indicou o 29 de janeiro como o Dia da Visibilidade Trans. Naquela ocasião, um grupo de mulheres transexuais, homens trans e travestis foram até Brasília para o lançamento da campanha "Travesti e Respeito" no Congresso Nacional.
O ato, promovido pelo Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do ministério da Saúde, é considerado um marco contra a transfobia no Brasil.
Entende-se por transfobia um conjunto de ações negativas, discriminatórias ou preconceituosas contra pessoas transgênero.
A partir daí, o ato passou a representar o dia de visibilidade para as pessoas trans no país, em especial, para as mais vulnerabilizadas.
O Brasil, no entanto, não sabe quantas são e nem como vivem as brasileiras e os brasileiros trans. A Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) estima que 1,9% da população nacional seja composta por trans.
A cidade de São Paulo é a única do país a ter um mapeamento sobre as condições sociais que pesam contra esta população.
Os primeiros resultados divulgados do levantamento nesta sexta indicam que, na maior cidade do país, as pessoas trans continuam sendo alvo de violência física e verbal, apesar de o STF (Supremo Tribunal Federal) ter reconhecido a transfobia e a homofobia no rol dos crimes de racismo até que o Congresso Nacional crie legislação própria.
As travestis paulistanas também são as mais expulsas de casa e, sem escolaridade, acabam dependentes dos meios ilícitos para viver.
A realidade paulistana espelha a nacional. Segundo a Antra, nem a pandemia de Covid-19 foi capaz de frear a violência contra a população T.
Em 2020, relatório da entidade contou ao menos 175 assassinatos contra pessoas trans –alta de 41% em relação ao ano anterior. É por isso que a busca por direitos só aumenta anos após outro.
Um deles, recém-conquistado em território paulista, manda o governo Doria (PSDB) incluir nos boletins de ocorrência informações sobre a orientação sexual e a identidade de gênero da pessoa vítima de violência.
Só essa medida gerará dados para o governo saber onde os crimes de transfobia e homofobia estão concentrados no estado e quais medidas precisam ser implementadas para contê-los.
Nos últimos 17 anos, a população trans também obteve o direito a mudar seus nomes de registro civil sem necessidade de cirurgia. Também conseguiu passar a doar sangue e caracterizar a transfobia como racismo.
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DESAFIOS E CONQUISTAS DOS LGBTIS
A partir dos anos 1950
Surgem as divas trans que se tornam grandes estrelas no Brasil e na Europa, como Rogéria, Jane di Castro, Eloína e Fujika, entre outras
1969
LGBTs de Nova York colocam fim às agressões que sofriam em batidas policiais realizadas num bar da cidade, o Stonewall Inn. O grupo resistiu por três dias em 1969, numa época em que se relacionar com pessoas do mesmo sexo era ilegal em todos os estados americanos.
O movimento estimulou uma marcha sem volta de LGBTs por mais igualdade de direitos em várias partes do mundo e ficou conhecido como a revolta de Stonewall
1978
Início do movimento pelos direitos LGBT no Brasil. É fundado, no Rio de Janeiro, o jornal Lampião na Esquina, voltado para as questões da comunidade. Em São Paulo, surge o Somos
1982
Ocorre a famosa passeata contra o delegado José Wilson Richetti, que realizava batidas policiais no centro de São Paulo contra travestis, gays e prostitutas sobre o pretexto de moralização social
1983
Em 19 de agosto de 1983, um protesto realizado por lésbicas e apoiado por grupos feministas pôs fim às discriminações sofridas no Ferro's Bar, centro de SP. O ato ficou conhecido como o "Stonewall brasileiro"
Anos 1980 e 1990
Anos de pânico: o HIV chega ao Brasil e faz estrago conhecido como "peste gay". Na Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo é organizado o primeiro núcleo de luta anti-Aids. Morrem Darcy Penteado, Caio Fernando Abreu e Cazuza por complicações da doença
1985
O Conselho Federal de Medicina retira a homossexualidade de sua lista de doenças
1990
OMS (Organização Mundial da Saúde) retira a homossexualidade de sua lista de transtornos mentais
1992
No Piauí, Kátia Tapeti é eleita a primeira vereadora trans na história da política brasileira
1995
As primeiras Paradas do Orgulho LGBT são realizadas em Curitiba e no Rio
1997
A cidade de São Paulo sedia sua primeira Parada LGBT. Em 2006, a passeata paulistana entra para o Guinness Book como o maior evento do gênero
2001
O governo de São Paulo promulga a lei 10.948 que penaliza práticas discriminatórias em razão da orientação sexual e identidade de gênero
2002
O processo de redesignação sexual, a chamada cirurgia de "mudança de sexo" do fenótipo masculino para o feminino é autorizada pelo Conselho Federal de Medicina. Em 2008, passa a ser oferecida pelo SUS (Sistema Único de Saúde)
2011
STF (Supremo Tribunal Federal) reconhece a união homoafetiva, um marco na luta pelos direitos LGBT
2018
STF decide que transexuais e transgêneros podem mudar seus nomes de registro civil sem necessidade de cirurgia
2019
STF enquadra a homofobia e a transfobia na lei de crimes de racismo até que o Congresso crie legislação própria sobre o tema
2020
STF declara inconstitucionais as normas que proíbem LGBTIs de doar sangue
Fonte: Livro Devassos no Paraíso - João Silvério Trevisan. Editora OBJETIVA