Quando saiu do Rio Grande do Sul rumo ao Nordeste, há vinte anos, a bióloga Rosane Silveira não poderia imaginar a dimensão que seu projeto de introdução de cavalos-marinhos na natureza tomaria.
Desde 2009, quando os dados começaram a ser contabilizados, foram 863.948 filhotes liberados pela iniciativa liderada por ela. A ação, batizada de Projeto Hippocampus, faz alusão ao gênero (Hippocampus) dos animais.
"A primeira vez que vi o cavalo-marinho me apaixonei na hora e pensei: 'quero estudar esse bicho'. Corri atrás de livros, bibliografias, orientadores não existiam porque não tinha ninguém que trabalhava com cavalo-marinho, e acabei sendo a primeira no Brasil. E também não tinha ideia de que ele era ameaçado internacionalmente, no nosso país ainda não estava", afirma Silveira, coordenadora do projeto.
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Entre as ameaças aos cavalos-marinhos estão a poluição ambiental, a pesca, o uso para peças de artesanato e até o emprego em remédios afrodisíacos.
Com início no Rio Grande do Sul, o projeto seguiu para Pernambuco em 2001, começando pela praia paradisíaca de Maracaípe, na região de Porto de Galinhas.
Desde o ano passado, houve ampliação da iniciativa para a área do Complexo Portuário de Suape, após um vínculo com o órgão estatal do governo de Pernambuco. O Projeto Hippocampus já teve também parcerias com a Petrobras e prefeituras.
Após o apoio de Suape, em 2020, mais de 34,4 mil filhotes dos cavalos-marinhos foram reproduzidos em aquários e levados aos estuários. O porto fica localizado entre Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho, no Grande Recife.
"Com esse estudo, além de contribuir com a preservação do cavalo-marinho e proteger essa espécie, que está praticamente extinta, estamos viabilizando a continuidade do instituto, que por pouco não fecha as portas em definitivo, por falta de recursos", afirma o diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Complexo Portuário, Carlos André Cavalcanti.
O maior desafio agora é ajudar a reverter o cenário adverso que coloca os cavalos-marinhos como espécies ameaçadas de extinção, o que pode causar um desequilíbrio ecológico no ecossistema aquático.
Cada prole liberada é derivada de casais resgatados nos estuários. Do total de filhotes reproduzidos nos cativeiros, 80% são introduzidos no estuário do rio Maracaípe, onde o projeto tem atuação mais antiga, e 20%, nos cursos d'água do território. Eles vivem em água salgada, mas conseguem ficar também sem maiores problemas em trechos de rios próximos ao mar, ou seja, nas imediações das fozes.
"Se a gente não estivesse atuando, talvez não houvesse mais cavalos-marinhos em Maracaípe. Já liberamos milhares de recém-nascidos, o que ainda não é ideal. O ideal seria liberar menores quantidades de animais de tamanho maior, porque a taxa de sobrevivência seria bem maior", diz Silveira.
Os animais possuem em média sete milímetros quando são recém-nascidos e, em razão disso, têm grandes chances de serem consumidos por outros peixes.
Entre as principais características dos cavalos-marinhos está a possibilidade de mudar de cor conforme o ambiente. A gestação leva entre 12 e 15 dias, e os machos são os responsáveis por carregar os filhotes em uma bolsa incubadora, que fornece os nutrientes necessários para o desenvolvimento dos animais.
O Projeto Hippocampus também trabalha com o monitoramento das espécies na região por meio de mergulhos. Ainda não existe, porém, uma técnica para averiguar onde estão os espécimes gerados nos cativeiros do projeto, por causa do tamanho diminuto desses animais, que podem viver de cinco a sete anos.
Silveira diz acreditar que, apesar de ações como a do projeto, falta maior engajamento do poder público na preservação de espécies, para além dos cavalos-marinhos. "É preciso um olhar mais profundo para a questão ambiental, incluindo quando se trata de espécies ameaçadas."
"Qualquer ser vivo tem a sua importância dentro do ecossistema", acrescenta.
Para seguir com o apoio, que, segundo o contrato atual, vai até o final de fevereiro, o Complexo de Suape diz buscar a captação de mais recursos e novas parcerias. A tendência é de renovação, com ampliação dos objetivos, segundo a administração.
"Queremos que o projeto retome a sua origem com um centro de visitação para receber turistas, escolas e interessados, e com isso ter uma renda. Nosso desafio agora é montar esse projeto em uma área que seja turisticamente possível de receber as pessoas e que o projeto possa se desenvolver", afirma Cavalcanti.