Muitas crianças têm uma dificuldade imensa para engolir comprimidos. Não importa se é uma vitamina ou uma aspirina. A pílula inevitavelmente fica alojada na garganta e a criança entra em pânico. Algumas engasgam com qualquer coisa maior que uma uva passa. "A maioria das crianças começa a engolir comprimidos a partir dos 10 anos. E cerca de 20 a 40% são incapazes de engolir uma pílula do tamanho padrão ou de uma cápsula, de acordo com um estudo publicado na revista Pediatrics", afirma o pediatra e homeopata Moises Chencinski.
Segundo os autores do estudo, a idade não afeta realmente a capacidade de engolir uma pílula. Um adolescente pode ter tantos problemas como uma criança de 5 anos. A questão está relacionada à ansiedade e às associações negativas com o medicamento. Muitos nunca superam o problema. Por exemplo, 40% dos adultos americanos têm dificuldades para engolir comprimidos, embora a maioria não tenha problemas com alimentos ou líquidos. Já 80% alega que não gosta da sensação de ter uma pílula presa em sua garganta, 48% dizem que os remédios têm um sabor ruim e 32% alegam que as pílulas provocam vômitos.
Um estudo com 1.051 adultos, publicado no European Journal of Clinical Pharmacology, produziu um número semelhante: 30% tinham dificuldades para engolir comprimidos e quase 10% pararam de tomar os medicamentos em função dessa dificuldade. "A pílula é uma substância sólida. Nós aprendemos que temos que mastigar algo que é sólido. É preciso uma mudança mental para relaxar a garganta e ser capaz de engolir algo que tememos que possa nos levar a um engasgo", explica o médico.
Embora alguns medicamentos possam ser tomados na forma líquida, esmagados, outros com liberação retardada e alguns com determinados revestimentos não podem ser esmagados ou divididos. E como cada pessoa tem uma dificuldade para ingerir um remédio, é preciso analisar caso a caso. "Às vezes, um paciente muito doente tem que tomar diversas medicações e o "problema" são suas emoções. Outro paciente pode apresentar um medo de asfixia ou uma ansiedade generalizada. E ainda há outros que podem ter um reflexo de hipersensibilidade e vômito", conta Chencinski.
Outras razões fisiológicas podem incluir ainda a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE); a esclerodermia, um acúmulo de tecido cicatricial que pode enfraquecer o anel inferior do esôfago; e uma aversão ao sabor dos comprimidos. "Questões emocionais ou ansiedade, em geral decorrentes de uma experiência do passado devem também ser levadas em consideração", defende o médico.
Como superar essa dificuldade?
Os autores do estudo, publicado na revista Pediatrics, revisaram pesquisas sobre o ato de engolir comprimidos e determinaram que várias técnicas como terapia comportamental, pulverizador da garganta com sabor, copos de engolir comprimidos, instruções verbais e postura correta da cabeça podem ajudar as crianças, a partir de 4 anos, a engolir os medicamentos mais facilmente. As mesmas técnicas também poderiam auxiliar os adultos.
"Uma criança pode experimentar, por exemplo, beber primeiro a água ou o suco, seguido pela pílula - ou o contrário. Com crianças mais novas, histórias com instruções também podem ajudar, como imaginar que a língua é uma onda de água, a pílula é o surfista e a pílula monta o toboágua na piscina (estômago)", exemplifica o médico.
Copos de engolir comprimidos, vendidos em farmácias e online, ajudam o usuário a "beber" a pílula - o copo é preenchido com fluido e a pílula é colocada em um reservatório de modo que o líquido e a pílula se misturem apenas na boca.
Um estudo de 2014 com 151 adultos de até 85 anos, publicado no The Annals of Family Medicine, informou que o chamado "método da garrafa" pode ser bem eficaz para alguns. O comprimido é colocado na língua, os lábios são bem fechados em torno da abertura de uma garrafa de plástico e o comprimido é ingerido em um movimento de sucção rápida para superar a fase voluntária da deglutição. A abordagem "inclinar-se para frente" também ajuda muito e trabalha com pessoas que evitam as cápsulas: "coloque a cápsula em sua língua, tome meio gole de água e incline o queixo para a frente ao engolir".
"Os pesquisadores não testaram os métodos em crianças, mas não há razão para acreditar que eles possam não funcionar com elas, porque as propriedades físicas das pílulas são, obviamente, as mesmas, independente da idade do paciente", conta o médico, membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade de Pediatria de São Paulo.
Outra dica para engolir a pílula é colocá-la num pedaço de pão e engoli-la, técnica que pode ajudar muito as crianças. "Mentalmente, ela sabe que o pão é macio, não é difícil, por isso não parece tão assustador para engolir", afirma o pediatra.