A Justiça condenou dois irmãos, gêmeos idênticos, a assumir em conjunto a paternidade de uma menina de oito anos para o pagamento de pensão alimentícia, em Cachoeira Alta, interior de Goiás. A decisão, publicada na segunda-feira, 1º, é inédita no Brasil, segundo o Tribunal de Justiça goiano. No caso, o pai não assumiu a obrigação e, por serem gêmeos univitelinos, o exame de DNA não foi suficiente para definir a paternidade. Diante da rara circunstância, o juiz condenou os dois a constarem no registro da criança como pais e dividirem o pagamento da pensão
Conforme a sentença, a mãe da menina entrou com ação alimentícia contra um dos gêmeos, alegando que a criança era filha dele. O homem, de 31 anos, negou a paternidade e apontou o irmão gêmeo como o verdadeiro pai. Em virtude da semelhança física entre os dois, a própria mãe, uma jovem de 25 anos, ficou em dúvida quanto à pessoa com quem tinha se relacionado. A mulher alegou que havia conhecido o rapaz numa festa e tivera um breve relacionamento com ele, resultando em gravidez.
Na ocasião, o rapaz se apresentara com o nome do irmão, segundo depoimento prestado ao juiz. "Ele me contou que tinha um irmão gêmeo, mas não cheguei a ser apresentada a ele. O estranho é que nesse dia ele estava com a motocicleta amarela que dizia ser do irmão", disse. A mãe só procurou a Justiça em 2017, quando a menina completou seis anos.
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Inicialmente, ela ajuizou ação de reconhecimento da paternidade contra um dos irmãos e, quando saiu o resultado positivo, este indicou o outro como o verdadeiro pai. O irmão fez o mesmo teste, dando resultado igual - 99,9% de chances de ser o genitor Mesmo com o resultado, nenhum deles assumiu a paternidade. "É uma atitude muito triste, não precisavam disso. Eles sabem a verdade, mas se aproveitam da semelhança para fugir da responsabilidade", disse a mulher, conforme divulgação do Tribunal, que manteve em sigilo a identidade das partes para proteger a criança.
DNA igual
Quando a ação foi proposta, os dois gêmeos estavam casados e a investigação teria gerado constrangimento para as famílias. Diante da negação da paternidade, o juiz determinou que ambos fossem submetidos ao teste de DNA. Por serem gêmeos idênticos, formados por um único óvulo fecundado pelo mesmo espermatozoide, o código genético de ambos é igual, ou seja, qualquer um deles poderia ser o pai. Sem condições de definir o pai biológico, o juiz Felipe Luís Peruca determinou que os dois sejam considerados pais da criança.
Cada um terá de pagar mensalmente o equivalente a 30% de um salário mínimo à menina. "Um dos irmãos, de má-fé, busca ocultar a paternidade. Esse comportamento não deve receber guarida do Poder Judiciário, que deve reprimir comportamentos torpes, sobretudo no caso em que os requeridos (os gêmeos) buscam se beneficiar da própria torpeza, prejudicando o reconhecimento da paternidade biológica da autora (criança), direito constitucional, inalienável e indisponível", afirma o juiz na sentença.
O magistrado reconheceu que o caso é muito particular, pois são raros os processos de reconhecimento de paternidade em que se encontram dois possíveis pais com o mesmo DNA. "Assim, diante das peculiaridades do caso concreto, reputo que a decisão que mais açambarca o conceito de justiça é aquela que prestigia os interesses e direitos das crianças em detrimento da torpeza dos requeridos", afirmou no processo.
Os irmãos podem recorrer da decisão, mas o recurso não suspende a obrigação de pagarem a pensão alimentícia, retroativa à data em que a ação foi proposta. Procurada, a advogada Débora Franco Medeiros, que defende os gêmeos, informou que nem eles nem a defesa se manifestariam sobre a decisão.
Caso similar
De acordo com o TJ-GO, uma história similar aconteceu nos Estados Unidos, em 2007, quando Holly Marie Adams se relacionou com os gêmeos Raymon e Richard Miller e teve uma filha. Os testes também não conseguiram precisar quem era o pai da garota e a situação foi parar na Suprema Corte Americana. Diferentemente do caso de Goiás, Holly não estava sendo enganada pelos homens e apontou Raymon como pai. A Justiça decidiu que a paternidade deveria ser, então de Raymon, com que a criança já tinha criado laços afetivos.