Com o isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus, casais tiveram de lidar com uma nova rotina: ficar 24 horas com seu par dentro de casa. A convivência diária não é fácil, mas agora ela se torna fundamental. A comemoração do Dia dos Namorados, celebrado na próxima sexta (12), terá que ser caseira.
Para que o cotidiano não fique mais desgastante, casais dividem tarefas, estabelecem regras na casa e até usam o humor para não surtar na quarentena. É o caso da humorista Bia Napolitano, 32, e do advogado Paulo Duarte Filho, 40. Ele diz que se apaixonou pelo bom humor dela: "Sempre foi muito palhaça. Falei que casaria com ela quando a vi no bar imitando Silvio Santos."
Casados desde 2013, eles dizem que sempre gostaram de ficar juntos, mas que agora tudo ficou latente. Para passar por cima dos problemas do dia a dia, eles criaram uma regra especial: fazer piada das situações em casa. "Quando uma briga começa, o outro tem que fazer alguma palhaçada para tirar o foco da energia negativa. É uma norma que está dando certo e faz a gente não enjoar um da cara do outro", diz Bia, que largou o direito para se dedicar à produção de vídeos focados em relacionamento.
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Já na casa da nutricionista carioca Renata Pigliasco, 37, e do médico João Marcello Branco, 39, o único motivo para pequenas brigas é quando o assunto é lavar a louça. "Na quarentena, a gente aprende a escutar e a falar com o outro. As mulheres com quem converso reclamam de sobrecarga. Apesar de eu ser um pouco mandona, o segredo do convívio é chegar a um meio-termo que ambos gostem", diz Pigliasco.
Juntos há dez anos, o casal afirma que passou a conviver mais tempo com a filha, Maria Clara, de oito anos. "A relação doméstica tem ficado bem interessante com mais convívio. Nos aproximamos como família", diz Branco.
"Nossa filha foi quem mais gostou dessa novidade. Acredito que nós sairemos mais fortes que antes. Moro nessa casa há cinco anos e nunca me sentei no sofá para ver uma TV. Agora fazemos isso juntos", afirma a nutricionista.
Os influenciadores digitais Gabriel Dearo, 25, e Manuela Digilio, 24, contam que procuram dialogar para que a relação continue em tom de lua de mel na quarentena. Eles estão casados há dois anos e trabalham juntos na produção de conteúdo para três canais no YouTube. "Rola um desentendimento de vez em quando, mas com carinho e amor tudo se resolve. Estávamos acostumados a passar muito tempo juntos, então foi mais fácil", diz Dearo.
Eles afirmam que têm aprimorado a confiança e o respeito ao passar mais tempo juntos. Eles reclamam apenas de ficar longe das famílias, que moram em Ribeirão Preto (a 3112 km de São Paulo). "Não temos segredos um com o outro. Além de ele ser meu marido é meu melhor amigo. Conversamos sobre tudo e isso ajuda a passar por esse momento", afirma Dearo.
Casada há 26 anos com o coach André Bax, 51, a empresária Valéria Bax, 49, brinca que começou a conhecer o marido só agora, após 24 horas de convivência. "Estamos há 60 dias sem sair de casa. O desafio é arrumar coisas para fazer a dois, já que adorávamos sair para um bar com amigos. Esse tempo tem sido importante para eu reconhecer a solidez da minha relação", diz Valéria.
Com o Dia dos Namorados a caminho, os casais esperam que a relação fique cada vez mais fortalecida. A comemoração terá de ser em casa neste ano. Eles afirmam que o mais importante é manter o amor, o respeito e, sobretudo, a paciência. "Temos de respeitar diferenças e o espaço um do outro. Temos de ter esse altruísmo na relação. E também dar boas risadas", aconselha a humorista Bia Napolitano.
Divórcios em alta
Mas nem tudo são flores. Assim como na China e nos Estados Unidos, especialista têm notado que no Brasil também houve aumento de reclamações e de separações no meio da quarentena. Entre os famosos que se separarão estão Whindersson Nunes e Luísa Sonza, Arthur Aguiar e Mayra Cardi e Otávio Mesquita e Melissa Wilman.
Aline Bicalho, consultora em vida afetiva, afirma que essa percepção é pautada pelo que vê em dez grupos de mães e mulheres nas redes sociais, um deles com cerca de 8.000 delas. "São muitos desabafos diariamente, de dúvidas sobre o parceiro a pessoas querendo se separar. Há relatos pedindo dicas de como se reconectar e reclamações que não namoram mais. Parece que só agora que algumas pessoas perceberam com quem estão junto."
Percepção semelhante teve o psiquiatra Pablo Vinicius Oliveira Gomes, no ramo há 20 anos. "Antes da pandemia, muitas relações já não vinham bem, e agora os problemas ficaram maximizados. O isolamento colocou uma lupa em condições preexistentes."
O profissional alerta para outros problemas causados pelo isolamento e reforça que o Brasil já é o país com maior número de casos de transtorno de ansiedade do mundo e o segundo país a consumir calmantes. Ele defende que o diálogo é a porta de entrada para evitar brigas desnecessárias que acarretem em decisões extremas.
Vida afetiva na quarentena
Manter a vida afetiva ativa e prazerosa na quarentena ajuda o cérebro a entender melhor as dificuldades que o mundo atravessa, o que gera mais paciência para levar a vida, segundo especialistas. De acordo com Aline Bicalho, consultora e empresária no ramo de produtos sex shop, é fundamental dar ênfase a essa parte do relacionamento.
"Todo mundo tem ficado louco nesta quarentena. A vida afetiva é saudável e hoje em dia é mais ainda. Fisiologicamente falando, o prazer estimula vários hormônios da felicidade, os equilibra e traz relaxamento em tempos difíceis."
Bicalho afirma que muitas mulheres têm reclamado sobre a perda ou diminuição da libido. "O fato de ter filhos atrapalha um pouco, mas é preciso ter um momento a dois. Nem que esse tempo seja marcado. Fazemos reuniões com todo mundo, por que não podemos nos reunir com nosso parceiro?"
Segundo especialistas em relacionamentos, as mudanças de rotina, o envolvimento em tempo integral e as constantes incertezas podem fazer com que as pessoas surtem dentro de casa e, consequentemente, com o seu par. É preciso, porém, saber que tudo vai passar e o dia a dia deverá voltar ao normal.
Para eles, estamos em um momento excepcional, e as emoções exacerbadas vão ao encontro disso. Para o psiquiatra Pablo Vinicius, todos precisam entender que houve uma ruptura da rotina e isso trouxe uma realidade que não foi escolhida por ninguém. "Não é momento de tomar decisões importantes que impactem em grandes mudanças na vida. Nós não nascemos para fazer algo por 24 horas. Provoca sentimentos atípicos mesmo."
Para o hipnoterapeuta Thiago Porto, especializado em tratamento com casais, o dialogo é a ferramenta mais produtiva para manter tudo nos eixos. "Uma atitude legal para fortalecer a relação é combinar de fazer refeições juntos, tirar um tempo para ver um filme e estimular o contato. Também é sempre bom falar ao outro o que te incomoda. Às vezes uma simples palavra transforma um relacionamento."
Apesar de lidar a maior parte do tempo com casais desgastados, ele observa que também há muitos deles que estão no caminho certo. E que a quarentena, contudo, pode ajudar a consolidar os sentimentos. "Há muita gente em lua de mel ainda. A dedicação diária ao outro é o combustível para que tudo permaneça excelente na vida a dois."