Uma em cada três vítimas de tráfico de pessoas é criança, sendo que duas delas são meninas. Do conjunto de vítimas desse tipo de crime, praticado em pelo menos 152 países de origem e 124 países de destino, 70% são mulheres. Os números são do Relatório Global 2014 sobre Tráfico de Pessoas, divulgado nesta quinta-feira pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc).
De acordo com o relatório, até o momento foram identificado mais de 510 fluxos de tráfico ao redor do planeta. O tráfico de crianças aumentou 5% na comparação com o período entre 2007 e 2010. Em algumas regiões, como África e Oriente Médio, as crianças são as maiores vítimas do tráfico de pessoas. No Continente Africano e no Oriente Médio, elas representam 62% das vítimas.
O tráfico para trabalhos forçados, que abrange, entre outros, setores como o industrial, o de trabalho doméstico e a produção têxtil, tem "aumentado continuamente" nos últimos cinco anos. Nesse grupo, as mulheres correspondem a 35% das vítimas.
Ainda segundo o documento do Unodc, os motivos variam em função da região. Na Europa e na Ásia Central, a maioria das vítimas é traficada para exploração sexual, enquanto na Ásia Ocidental e no Pacifico a motivação é a prestação de trabalho forçado. No caso das Américas, foram detectados casos de exploração sexual e de trabalho forçado em igual medida.
Apesar de a maioria dos fluxos ser inter-regional, 60% das vítimas cruzaram pelo menos uma fronteira nacional. Outra constatação do relatório é que 72% dos traficantes condenados são homens com origem no país onde praticaram os crimes. No entanto, ressalta o Unodc, a impunidade continua sendo um "problema sério", uma vez que 40% dos países registraram "apenas alguma ou nenhuma condenação", não havendo ao longo dos últimos dez anos "aumento perceptível" na resposta da justiça global a essa prática criminosa.
"Reduzir a vulnerabilidade, a exemplo do que tem sido feito no Brasil, é um bom começo, mas ao mesmo tempo é necessário que, além de reduzir miséria e pobreza, sejam apresentadas medidas legislativas mais abrangentes", disse o coordenador do Sistema das Nações Unidas no Brasil, Jorge Chediek.
Para o Unodc, é preciso que os países adotem e se comprometam a implementar as medidas previstas pela Convenção de Palermo, promovida pelas Nações Unidas em 2000, mas que entrou em vigor em 2003. As recomendações são focadas basicamente em três frentes de combate: persecução, visando à punição de tal prática, proteção para as vitimas e prevenção.
"No caso do Brasil, o que falta é tipificar de forma mais adequada o crime, o que acaba resultando em penas mais brandas para quem o pratica", disse o representante do Unodc no Brasil, Rafael Franzini. "Apesar de, desde 2006, a legislação brasileira ter avançado e incluído também, ao lado das mulheres, homens e crianças como vítimas, falta ainda classificar como crime de tráfico de pessoas as práticas envolvendo trabalho forçado e os feitos com o objetivo de fazer a remoção de órgãos", informou.
Segundo o Unodc, o crescimento econômico brasileiro fez com que o país passasse a ser, além de origem, destino de vítimas de tráfico de pessoas. Das 241 pessoas indiciadas por esse crime entre 2010 e 2012, 97 foram processadas e 33 condenadas. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, entre 2005 e 2012, 483 pessoas foram vítimas dessa prática. E, de acordo com o Unodc, as policiais rodoviários contabilizaram 547 vítimas de trafico de pessoas para fins de trabalho escravo e exploração sexual em 2012.
Nomeada embaixadora da Boa Vontade da Campanha Coração Azul contra o Tráfico de Pessoas, a cantora Ivete Sangalo considera a denúncia a "forma mais eficaz" de combater tráfico humano. "Por meio da minha música e popularidade, sou instrumento e panfleto dessas ações. Nos shows consigo levar o conhecimento desses fatos a um grande número de pessoas. Precisamos estimular as pessoas a denunciar essa prática porque, definitivamente, a informação não apenas esclarece as pessoas, como também esclarece o crime", afirmou a cantora.