Curitiba - O finado Hunter Thompson inovou, com o new journalism, ou jornalismo gonzo, uma maneira informal e autêntica de noticiar os fatos. E Joe Sacco levou isso para a linguagem dos quadrinhos, com o new-new journalism. Seu trabalho mais recente, ''Uma História de Sarajevo'', acaba de chegar às livrarias e lojas especializadas brasileiras pela Conrad Editora.
É quase impossível separar a história da nona arte com a dos jornais, afinal de contas, ela se desenvolveu justamente após a popularização das famosas tiras cômicas, presentes até hoje na seção de entretenimento. O chamado new-new journalism vem através da reportagem investigativa colocada através de textos e imagens estáticas. Um documentário feito em quadrinhos.
A origem do new-new journalism começa com a abrangência dos quadrinhos após o sucesso das tiras cômicas, que cederam espaço a histórias de super-heróis e detetives, horror e erotismo. Em seguida, já nas décadas de 60 e 70, com o trabalho de indies como Robert Crumb e Harvey Pekar, e de gênios como Will Eisner, os quadrinhos também passaram a trazer narrativas autobiográficas, mais adultas e engajadas. Paralelo a isso, o escritor Hunter Thompson, que se matou no início do ano, recortava um período da história com suas ácidas palavras, sempre com o cunho jornalístico e pelo menos meia dúzia de drogas na bagagem.
O material desses autores influenciou gente como Art Spiegelman, que, em meados de 80, uniu literatura, jornalismo e quadrinhos com ''Maus'', uma comovente narrativa sobre a perseguição aos judeus durante o nazismo. E, em 90, Joe Sacco se aprofundou ainda mais no gênero, transformou as graphic novels em reportagens completas através da arte sequencial. O autor aproveitou sua passagem pela Palestina, Bósnia e Sarajevo para narrar com detalhes o conflito nessas regiões. Como resultado, criou o que poderia se perder em um vídeo piegas numa narrativa gráfica instigante, irônica e muito mais verossímel do que vários documentários já feitos sobre o tema.
Em ''Um História de Sarajevo'', Joe Sacco fala sobre a busca dos correspondentes às fontes de notícia e, principalmente, como uma guerra pode corromper as pessoas. A luta pela sobrevivência transforma gente comum em empregados mesquinhos, que fazem de tudo para manter seus cargos, e burocratas que não hesitam em pisar em quem estiver pela frente para manter a estrutura social.
Neste álbum, o autor está um pouco mais calmo do que o habitual, mais econômico em sua narrativa. Em suas histórias anteriores, Joe Sacco é prolixo, irritado, provocador e chega a gritar de forma engajada. Aqui, ele é mais sutil, prefere trabalhar com as várias camadas de informação num ritmo mais lento mas não menos interessante. Tudo com seus traços bastante eficientes e cheios de hachuras, para aumentar a crueza de seu relato.
Para quem quer se entreter e também se informar sobre o tema mas não tem paciência com o sentimentalismo barato da tevê, ''Uma História de Sarajevo'' é pra lá de recomendado. Valem a leitura também: ''Palestina: Uma Nação Ocupada'', ''Palestina: Na Faixa de Gaza'', ''Gorazde: A Guerra na Bósnia Oriental'' e a curta história ''Natal com Karadzic'' no álbum ''Comic Book: O Novo Quadrinho Norte-Americano''. Todos do mesmo autor, já lançados no Brasil pela Conrad.
Serviço - ''Uma História de Sarajevo'', de Joe Sacco, tem 144 páginas no formato 19 x 25,5 cm e pode ser encontrado apenas em livrarias e lojas especializadas ao preço de R$ 30.
Música+Quadrinhos: The Clash+"Uma História de Sarajevo"
Todos os álbuns de Joe Sacco lançados pela Conrad estão disponíveis na Itiban Comic Shop, em Curitiba: Av. Silva Jardim, 845. Fone: (41)-232-5367.