Quem gosta muito daquilo que lê, escuta ou assiste uma hora quer também fazer. Assim nasceram os fanzines (de fanatic magazine - as ''revistas dos fãs''), que buscam levar, com o máximo de liberdade de expressão possível, o universo underground dos quadrinhos, da literatura, da música, do cinema, enfim, de qualquer coisa, desde que haja alguém disposto a criar e divulgar idéias. E o Brasil vai ganhar no próximo mês sua primeira fanzinoteca, a segunda do mundo, a Fanzinoteca de São Vicente (a 90 quilômetros da capital paulista), que vai reunir, catalogar e debater a produção alternativa gerada do Oiapoque ao Chuí.
''Os quadrinhos brasileiros mostram muito da nossa cultura mas nas bancas temos só os super-heróis dos americanos, a arte dos europeus e os mangás dos japoneses. A fanzinoteca tem como objetivo encontrar a identificação dos quadrinhos brasileiros'', explica Fábio Tatsubo, Chefe de Departamento da Secretaria de Cultura, que também produz quadrinhos há 15 anos. De acordo com Tatsubo, a idéia é reunir não só as produções sobre a nona arte mas também qualquer outro tipo de fanzine.
A semente que gerou a Fanzinoteca de São Vicente nasceu em 1999, quando Tatsubo decidiu fazer quadrinhos sobre a história da cidade. ''Fiz uma adaptação das lendas da cidade, que rendeu um prêmio HQ Mix e o pessoal da Secretaria de Cultura gostou e apoiou a produção'', lembra Tatsubo.
Ele também destaca que a confecção dos fanzines é muito importante para a fomentação da produção nacional de diversos setores da cultura brasileira e serve de estímulo para as pessoas encontrarem o ''talento adormecido'', que muitas vezes não percebem ter. ''O leitor quer deixar de ser leitor para uma hora ser autor também. O fanzine é um outsider (marginal). É uma coisa autoral que dá a liberdade para as pessoas fazerem o que quiserem. É um laboratório de quadrinhos'', completa.
Um dos aspectos interessantes é que, de acordo com Piter Yamaoka, responsável pela catalogação dos fanzines, 40% da produção do material da mostra da Fanzinoteca de São Vicente é feita por mulheres. Num mercado dominado por homens -tanto criadores, como leitores- os fanzines passam a ser também uma alternativa de espaço para os bons trabalhos realizados pela ala feminina.
O acervo da mostra não vai servir apenas para consulta e apreciação mas também passará a ter um importante valor histórico. ''Queremos realizar, com a fanzinoteca, um estudo antropológico do comportamento do homem. As pessoas, mais tarde, vão poder ter um recorte do panorama dos anos 2000, o que era produzido no cenário alternativo brasileiro nesta época'', diz Tatsubo.
A programação começa no dia 11 de novembro, às 19 horas, com a abertura da mostra de cerca de 250 fanzines, com um catálogo produzido pelo quadrinhista Gazy Andraus, famoso por seu material filosófico, e pela pesquisadora Sonia M. Bibe Luyten, autora diversos livros sobre a nona arte, como o ótimo ''Mangá: O poder dos quadrinhos japoneses''.
No dia 17, Ângela Rama, Waldomiro Vergueiro, Alexandre Barbosa, Paulo Ramos e Túlio Vilela lançam o livro ''Como Usar as Histórias em Quadrinhos na Sala de Aula''. Dia 20 o desenhista Ivan Reis, que atualmente ilustra a principal revista do Superman nos Estados Unidos, ministra uma oficina sobre anatomia de super-heróis e a dupla Emílio Baraçal (do site ''A Arca'') e André Prata ensinam os iniciantes a produzir quadrinhos.
A programação segue no dia 24, quando a Fanzinoteca de São Vicente vai promover um debate, mediado pelo jornalista Paulo Ramos, que irá reunir o cartunista de ''A Tribuna'', jornal de Santos, Alex Ponciano; Gazy Andraus; a fanzineira Elza Keiko, produtora do zine Orbital; Sonia M. Bibe Luyten; e Marcelo Naranjo e Marko Ajdaric, representantes do site de notícias Universo HQ.
A Fanzinoteca de São Vicente está aberta para receber trabalhos e os interessados devem enviar o material para a Secretaria da Cultura de São Vicente, que fica na Rua João Ramalho, 988, Centro, São Vicente (SP). CEP: 11.310-050. O telefone de lá é o 0xx13 3467-7015.