Curitiba - O quadrinho autoral, na maioria das vezes autobiográfico, sempre traz relatos profundos, cheios de detalhes e sensibilidade. ''O Menino do Kampung'' não foge à regra e traz mais: enche os olhos do leitor com um pouco mais da cultura do sudeste asiático, quase desconhecida por aqui.
No final do ano passado, pouco antes do lançamento no Brasil, o editor da Conrad Editora, Rogério de Campos, havia adiantado do que se tratava: ''uma espécie de Mark Twain encontra Henfil''. Sim, ele está certo. Além da similaridade de suas produções com os dois autores, o criador de ''Menino do Kampung'', o versátil Lat, é um ''Henfil'' em seu próprio país, bastante prestigiado. E também fora: na França, por exemplo, o álbum vendeu mais de 100 mil exemplares.
''O Menino do Kampung'' trata, essencialmente, do crescimento, do aprendizado, das travessuras do garoto Mat, que vive num kampung: um vilarejo típico da Malásia, com casas suspensas em meio a seringais. Banhos no rio, pescaria, estudos do Alcorão e a visão de um menino da aldeia passam a ser compartilhadas com o leitor, com um discreto bom humor. E, claro, inevitável a conclusão de que, apesar das diferenças, as lições que precisamos aprender para amadurecer nos tornam iguais, não importa em que lugar do planeta você esteja.
Lat, aos 55 anos, pode ser desconhecido por aqui, mas é bastante prestigiado na Malásia e também na Europa, onde ganhou muitos fãs na França. O autor tem uma interessante história de vida. Aos 13 anos, convenceu um editor que era adulto e conseguiu publicar suas primeiras produções. Aos 16, era colaborador das tiras semanais do jornal Berita Minggu e aos 20 já havia terminado seu primeiro álbum, Tiga Sekawan.
No entanto, seus trabalhos só emplacaram depois de ingressar na carreira de repórter policial. Explica-se: depois de terminar os estudos, ofereceu seu material para o jornal New Straits Times, o de maior circulação da Malásia, mas como a seção de cartunistas já estava ocupada, acabou agarrando a única vaga disponível, oferecida pelo redator-chefe. Lat gostou da experiência, que o ajudou a vencer a timidez, e, em 1974, finalmente conseguiu colocar seu material no periódico, antes de se tornar free-lance, com crônica política, ilustrações comerciais e de humor.
Os traços de Lat realmente remetem a Henfil. Econômicos, simples e muito expressivos. O autor asiático, porém, gosta também de rebuscar um pouco mais quando descreve graficamente estruturas pouco conhecidas pelos ocidentais, como a anjung, a sala de uma das casas de um kampung. A narrativa é bastante didática, lembra até mesmo livros escolares e infantis, propositalmente para fazer referência às crianças. A história é basicamente formada por cartuns com textos.
O ponto positivo da edição da Conrad, fica por conta da boa escolha da letrista, a famosa Lilian Mitsunaga, que reproduziu com fidelidade a caligrafia original, que faz parte da estrutura do desenho de Lat e sua vontade de reproduzir como uma criança escreve. Além disso, o formato 21 cm x 28 cm também é ideal para valorizar o tipo de narrativa.
Liberdade - O mercado de quadrinhos nos anos 80 sofreu duro golpe e só sobreviveu graças à revitalização e ''humanização'' dos heróis com trabalhos inovadores, revolucionários e até transgressores de gente como Alan Moore, Neil Gaiman e Frank Miller. Isso amadureceu o setor na virada para os anos 90 e o resultado pode ser conferido em ''Liberdade: A Qualquer Custo'', republicado no Brasil pela Mythos Editora.
A edição traz a luta de Martha Washington, uma jovem negra que cresceu na pobreza e começa a carreira militar para derrubar o presidente dos Estados Unidos, tirano que governa através de mentiras e do poder das armas (algo bastante atual, diga-se de passagem). Uma boa chance para os leitores apreciarem o trabalho de Miller pré-Sin City e de Gibbons pós-Watchmen.
Brazuca nos EUA - O mais novo material de Gabriel Bá (10 Pãezinhos) já é notícia nos Estados Unidos. A aguardada série mensal ''Casanova'', em que o ilustrador paulistano trabalha ao lado do escritor Matt Fraction, tem previsão de lançamento com um tipo de promoção bem-sucedida no mercado norte-americano.
Recentemente, Warren Ellis (Authority) lançou, ao lado do desenhista Ben Templesmith (30 Dias de Noite), a história ''Fell'', com arcos fechados em 16 páginas e preço convidativo de US$ 1,99, contra os tradicionais US$ 2,95 das grandes editoras. ''Casanova'', com previsão para a primavera nos Estados Unidos (a partir do final de março), deve seguir essa tendência alternativa de publicação e venda.
Boa notícia no ''V de Vingança'' - A Warner Bros. divulgou no início da semana que a adaptação de ''V de Vingança'', clássico de Alan Moore e David Lloyd, levado às telonas por James McTeigue e os irmãos Wachowski (Matrix), teve alteração na data de estréia no Brasil.
Anteriormente agendada para o dia 14 de abril, o longa será exibido a partir do dia 7, uma semana antes. Bem, além do enigmático ''V'', este colunista, assim como muitos fãs, não vê a hora de conferir Natalie Portman careca.
Serviço: ''O Menino do Kampung'', de Lat, é publicado pela Conrad Editora, com o formato 21 cm x 28 cm, com 152 páginas em preto-e-branco, custa R$ 35. ''Liberdade'', de Frank Miller e Dave Gibbons, sai pela Mythos Editora com formato americano e 208 páginas em cores, ainda sem preço definido.
O povo quer saber: será que este ano rola Blankets no Brasil?
A revistas citadas acima podem ser encontradas em Curitiba na Itiban Comic Shop: Av. Silva Jardim, 845. Fone: (41) 3232-5367.
Música+Quadrinhos: Dresden Dolls+O Menino de Kampung