Curitiba - Ao abrir as primeiras páginas parece que você já viu aquilo em algum filme. Não, você já viu mesmo foi na vida, seja na sua ou de alguém que conhece. Porque o que diz 12 Razões Para Amá-la, de Jamie S. Rich e Joëlle Jones, vai de encontro com todo mundo que um dia já se apaixonou por aí.
Gwendolyn é um garota como a que todos os jovens gostariam de conhecer: impulsiva, atraente, de personalidade forte e um pouco confusa com alguns sentimentos. Evan é quem muita gente evita ser: um pouco nerd, um tanto romântico, bastante racional e levemente carente. Ambos se conhecem de forma inusitada e aí nasce mais um daqueles pares improváveis e inseparáveis.
A grande sacada da edição é a narrativa sem ordem cronológica, com episódios curtos -cada um reflete sobre as tais 12 razões para amá-la- e cheios de sugestões musicais, que, se são tímidas, também acrescentam aquele temperinho extra que às vezes procuramos em histórias desse tipo. Experimente, por exemplo, ler o segundo capítulo ouvindo Misteries, de Beth Gibbons e Rustin Mann. O resultado será, se não diferente, pelo menos interessante. E a trilha sonora não pára por aí. Tem Pet Shop Boys, Belly, Bryan Ferry, John Lennon, entre outros.
O público que prefere esse tipos de história, o mesmo que busca o material alternativo da Fantagraphics ou da Top Shelf no Brasil, vai logo se identificar com o estilo da desenhista Joëlle Jones. A moçoila, que treina no balcão enquanto trabalha como garçonete, capricha no visual dos personagens, que ganham bastante personalidade com suas roupas e manias. Seu traço simples com arte-final sem grandes floreios também ajuda a caracterizar a obra como "leitura despretensiosa", o que pode chamar a atenção também de gente que quase nunca lê quadrinhos. E, só por isso, a menina já merece méritos.
O roteiro de Rich não complica mas também não compromete e ao final a sensação é mesmo de ter escutado apenas uma boa música, que não vai mudar sua vida, mas que foi agradável ouví-la. Mas só um aviso: não tente levar os assuntos dispostos ali a sério com sua namorada ou namorado, pois as chances de acontecer o famoso "DR" é grande.
Serviço: 12 Razões Para Amá-la, da Devir Livraria, tem formato 14 x 21 cm, com 152 páginas em preto e branco e custa R$ 22.
SUPREMO: A ERA DE OURO
Será que existem personagens ruins ou apenas maus escritores? A questão é levada em consideração pelo editor Leandro Luigi Del Manto, no prefácio do encadernado de Supremo, que chega ao Brasil pela Devir justamente na fase de reformulação do bastante conhecido Alan Moore, autor de nada menos que Watchmen, V de Vingança, Lost Girls, Liga Extraordinária, entre outros clássicos instantâneos de nossa querida arte seqüencial.
Nas últimas três décadas, um fator em especial foi o termômetro para medir o quanto um roteirista pode ser considerado consagrado no milionário mercado norte-americano de quadrinhos: o de tirar leite de pedra, transformar lixo em ouro, pegar um personagem rídiculo e empoeirado, de quinta categoria, e transformá-lo em um protagonista decente.
Neil Gaiman, com Sandman; Grant Morrison com A Patrulha do Destino e Os Sete Soldados da Vitória; Frank Miller com o Demolidor em fase ruim; Brian Michael Bendis, com os Vingadores, que vinham mal das pernas há anos e hoje lideram o ranking de revistas mais vendidas, entre outros, só para ficar em uma lista curta. Alan Moore talvez seja o especialista nesse quesito e por isso o que fez em Supremo é digno de aplausos.
Primeiro porque Supremo é criação de Rob Liefield. Para bom entendedor de quadrinhos, só o primeiro nome do rapaz já basta para saber que se trata de histórias desconexas, personagens sem carisma algum, desenhos totalmente malucos -sem proporção, criatividade, emoção, drama, narrativa ou beleza- e um amontoado de pin-ups com caras musculosos e mulheres com os seios maiores que sua própria cabeça.
Então, respondendo à questão inicial, Alan Moore prova que existem apenas maus escritores. Bem, seria besteira tentar resumir aqui nesse pequeno espaço a origem e o que é o Supremo, até porque não vale a pena. O que vale mesmo é saber que o personagem, baseado no Superman, ganhou vida própria com Moore, que não só criou uma mitologia mais aceitável como também trouxe leitores para a revista, que mal vendia para pagar os próprios custos.
Apesar dos desenhos continuarem em um nível, digamos, melhores dos que o de Liefield, a narrativa e as maluquices de Moore -que une de forma brilhante elementos de mais de 50 anos de arte seqüencial- asseguram um pouco de autenticidade a um personagem completamente clonado. E a lição é interessante: não só para quem quer aprender a escrever com o pouco que tem em mãos, como também para quem gostaria de apenas ler uma boa história de ação com super-heróis, com a devida homenagem à Era de Ouro dos quadrinhos.
Serviço: Supremo - A Era de Ouro é publicação da Devir Livraria, com formato 16,5 cm x 24 cm, com 168 páginas coloridas, e custa R$ 49.
UMBRA
Nunca é demais ver gente se esforçando para procurar diferentes focos de narrativa dentro da mesma trama. E esse é o grande lance em Umbra, de Stephen Murphy e Michael Hawtorne, que chega às prateleiras pela Devir Livraria.
O cenário? Uma legista viciada em antidepressivos encontra um esqueleto misterioso, que seria de uma mulher neanderthal, curiosamente baleada (!). Some aí uns elementos da Guerra Fria, um romance lésbico, crianças esquisitas flertando com o sobrenatural e outras coisas.
Pode parecer demais para quem gostaria apenas de ler uma boa história de ação mas é aí que a leitura parece agradável: ao invés de ficar explicando tudo, a narrativa fica concentrada na "atuação" da protagonista Askja e sua falibilidade -o que a torna uma bela personagem, bastante interessante- e na ação, no estilo de seriados como CSI. Aliás, o clima forense-investigativo se faz presente com bastante intensidade na primeira metade do conto.
Os desenhos fogem um pouco ao padrão americanizado e Hawthorne, indicado ao prêmio Eisner por seus trabalho em Queen & Country, opta por traços com penas finas e pincéis, acentuando bastante as sombras, para manter o clima de mistério. A narrativa é simples de ser acompanhada, até porque o roteiro de Murphy, que se graduou escrevendo Tartarugas Ninja para o estúdio Mirage, apesar de parecer maluco, é bastante linear e até mesmo previsível.
Apesar da história perder o fôlego com o passar das páginas, o carisma da protagonista e a facilidade de leitura mantêm o interesse até o final, que parece mesmo uma daquelas conclusões pouco convincentes de um episódio maluco das Tartarugas Ninja.
Serviço: Umbra, publicado por aqui pela Devir Livraria, tem formato 16 x 24 cm, com 132 páginas em preto e branco e custa R$ 25.
O material citado acima pode ser encontrado em Curitiba na Itiban Comic Shop: Av. Silva Jardim, 845. Fone: (41) 3232-5367.