Música pop

Perdendo o bonde

26 nov 2004 às 11:00

O hype não perdoa. A mesma imprensa que há cerca de um ano e meio babava pelo rock caipira do Kings Of Leon (oriundos de Nashville, Tennessee) hoje já debandou para a platéia de Kasabian, Ordinary Boys, Franz Ferdinand... Pouca atenção foi dada a "Aha Shake Heartbreak" (BMG – importado), segundo álbum do Kings, que chegou no início deste mês às lojas britânicas – para se ter uma idéia, o disco será lançado apenas no ano que vem nos Estados Unidos.

E a máquina de triturar do hype foi azeitada de tal forma que jornalistas e fãs de rock novidadeiros nem esperam mais a bandinha da vez lançar um disco decepcionante para procurar a próxima salvação: se "Heartbreak" não é exatamente brilhante, é no mínimo um trabalho no mesmo nível da consistente estréia do quarteto, "Youth And Young Manhood" (2003). Os irmãos Followill (mais um primo) continuam fazendo a mesma pauleira com influências matutas de Creedence Clearwater Revival e dos discos mais roqueiros de Neil Young, só que agora com canções mais curtas e cruas.


"Four Kicks", "Slow Night, So Long", "Razz" e "Velvet Snow" são as mais próximas do álbum de estréia, agitadas e com aquele jeitão de punks invadindo o rodeio. Em alguns momentos, o Kings Of Leon limpa levemente as guitarras e valoriza as melodias, em músicas que poderiam ser assinadas por alguma banda nova-iorquina moderninha: "The Bucket", "King Of The Rodeo" e "Soft" (as duas últimas, as melhores músicas de "Heartbreak") lembram mais Strokes do que o próprio Kings.


As baladas são impregnadas compreensivelmente de nuances country, emulações das músicas mais introspectivas do clássico "Beggars Banquet" (1968), dos Stones. "Day Old Blues", com refrãozinho chorado, e a canção de ninar "Rememo" são herdeiras evidentes das aventuras rancheiras de Jagger e Richards.


"Heartbreak" só desanda quando Caleb Followill perde as estribeiras nos vocais: sua voz chata destrói "Milk" e "Pistol Of Fire", com balidos irritantes na primeira e gritinhos ardidos na segunda. Mas mesmo que o Kings Of Leon tivesse lançado um álbum perfeito é certo que o processo de expulsão do clube dos badalados teria sido levado adiante. Mais difícil do que entender é imaginar como o quarteto, que até agora não se mostrou capaz de fazer outra coisa além de rockão saudosista, vai se reinventar para voltar à cena principal.


LANÇAMENTOS


Dresden Dolls – "A Is For Accident" (importado)


Antes de lançar o antológico álbum de estréia que leva o nome da banda (resenhado nesta coluna há algumas semanas), o duo norte-americano Dresden Dolls, de Boston, editou esta coletânea com gravações dos primeiros anos de atividade do grupo, a maioria registros ao vivo, entre 2001 e 2003. "A Is For Accident" está à venda apenas no site oficial da banda e traz, além de três músicas que seriam incluídas no debute, sete canções com o padrão Amanda Palmer (vocalista, pianista e compositora – o outro integrante é o baterista Brian Viglione) de qualidade. Menos pop e ainda desenvolvendo a fórmula do chamado "punk brechtiano", os Dolls emocionam em baladas cortantes como "Mrs. O", "Cristopher Lydon" e "Glass Sliper", e na feroz "Time Has Come", que compensa a baixa qualidade de gravação com uma melodia épica e letra deliciosa: "chegou a hora de você me abraçar/ e de tocar estas frágeis cicatrizes". Não é nem música para salvar o rock – é para salvar a vida mesmo.
Para quem gosta de: Tori Amos, baladas do Radiohead, PJ Harvey.
Para comprar: www.dresdendolls.com.


Radio Dept. – "Lesser Matters" (XL – importado)

É difícil de acreditar que da mesma terra dos incendiários Hives (a Suécia) venha o frígido Radio Dept. Este álbum de estréia da banda, editado originalmente no ano passado e que apenas agora chega às lojas do Reino Unido, é a coisa mais insignificante e insípida que o rock produziu em muitos anos – e olha que a concorrência é grande... São canções (?) para boi dormir na linha shoegazer, com climas para disfarçar a incapacidade técnica, vocais tímidos para esconder as melodias medíocres, ecos e efeitos para ver se o ouvinte não percebe a indigência dos arranjos. Chamar essa porcaria de lixo seria generosidade.
Para quem gosta de: Ride, My Bloody Valentine, Chapterhouse.


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