Em sua 96ª reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu por 6 votos a favor e 3 contra manter o alvo da taxa de juro básica Selic em 16% ao ano. Ao final da reunião o comitê divulgou a seguinte nota:
"Na avaliação do COPOM, o cenário para a evolução da economia brasileira nos próximos meses combina a continuidade da retomada de atividade observada desde a segunda metade de 2003 com a convergência da inflação para a trajetória das metas. No entanto, dada a volatilidade recente, é recomendável que a autoridade monetária atue de forma prudente para evitar que essa volatilidade de curto prazo venha a ter efeitos duradouros sobre as variáveis domésticas, não justificáveis pelos sólidos fundamentos da economia. Diante disso, o COPOM decidiu manter a taxa SELIC em 16% ao ano, sem viés, por seis votos a favor e três votos pela redução da taxa SELIC em 0,25%".
Entretanto, se é apenas uma "volatilidade de curto prazo" como pode contaminar as variáveis domésticas se os fundamentos são sólidos como alegam membros do governo e do Bacen?
Na verdade, a manutenção da taxa de juros é um reconhecimento por parte das autoridades monetárias de que a "lição de casa" não foi feita por completa, portanto, há grande preocupação com a atual turbulência que coloca em alerta a questão dos juros. Ou seja, o Copom deixou a porta aberta para uma provável elevação dos juros básicos caso a deterioração das variáveis domésticas aumente.
Com a manutenção dos juros básicos o Copom, novamente, desordenou as expectativas futuras da economia. Por exemplo, nossa expectativa de crescimento do PIB brasileiro para este ano despencou de 4,1% feita no início do ano para atuais 3,1%. A queda de 1,0 ponto percentual é resultado da condução atabalhoada da política econômica e da política monetária ainda restritiva que continua onerando o setor produtivo quanto ao investimento para expansão da produção, pois mantemos a segundo colocação entre os países com as maiores taxas de juros reais do mundo.
Com a manutenção dos juros o Copom sinaliza que os investimentos no setor financeiro continuarão a dar bons frutos (elevadas rentabilidades). Por outro lado, o setor produtivo ficará com o custo, pois com a decisão de ontem os juros reais projetados para os próximos 12 meses ficam em 9,8% ao ano (a.a.), perdendo apenas para a Turquia com 10,2% a.a., o que significa que o setor financeiro continuará "eliminando" postos de trabalho que poderiam existir no setor produtivo.
Infelizmente, não será através desse modelo de política monetária que o país conseguirá sair da situação de "stop and go" de crescimento econômico vivenciado na última década, tampouco equacionará o problema do emprego e da renda, que se encontram nos piores patamares desde a implantação do plano Real, em julho de 1994.
Se a preocupação do Copom é com o repasse da alta da taxa de câmbio para os preços ao consumidor, ou ainda, a possibilidade do aumento de preços dos combustíveis - fatos que poderão fazer com que a meta de inflação deste ano não seja cumprida - vale lembrar dois pontos importantes que amenizam a expectativa de um cenário nebuloso, a saber:
i) o varejo não acomodou até agora o aumento de preços dos insumos industriais (em virtude do aumento das commodities metálicas e agrícolas) por falta de emprego e de renda - e a chance de ocorrer isso agora com a alta do câmbio é pequena;
ii) o Bacen trabalha com uma expectativa de reajuste de combustíveis de 9,5% para este ano, conforme declarado no relatório trimestral de inflação, ou seja, se ocorrer um reajuste de 20% o impacto total na inflação é de 0,8 p.p., sendo que ultrapassará apenas 0,4 p.p. da projeção do Bacen e que são perfeitamente fáceis de acomodar visto que os setores ligados à renda não conseguem imprimir reajustes.
Mais uma vez o Copom ratificou que seu compromisso é apenas com a estabilidade da economia, transferindo ao governo federal toda e qualquer responsabilidade acerca do crescimento econômico sustentado que ensaia ocorrer há mais de uma década.
O Copom só não reconhece que a falta de crescimento econômico é decorrência da prática de juros elevados para controlar uma inflação que é sustentada apenas pela inércia dos reajustes dos preços administrados e controlados pelo governo, os quais constam em contrato de reajuste anual pelos índices gerais de preços (IGPs), que sofrem fortemente à influência da alta da taxa de câmbio e que não são suscetíveis a qualquer tipo de política monetária.
Diante do cenário que norteou a decisão do Copom, das perspectivas de curto prazo ainda negativas para o cenário internacional, e considerando ainda que há divergência nas opiniões dos membros do Copom, esperamos que a taxa Selic fique novamente estável na reunião de junho, que ocorrerá no dia 16.
Créditos: Alexsandro Agostini Barbosa é economista da Global Invest