Uma leitura rápida. Mas nada fútil e dispensável.
Com uma diagramação amigável e um texto fluente, Memória de Minhas Putas Tristes é livro pra ser resolvido em uma tarde de domingo.
A história é bastante simples: um homem, em seu aniversário de 90 anos resolve ter uma noite de amor louco com uma virgem.
Esse homem, que nunca tivera sexo sem pagar, resolve se presentear com esse pequeno capricho.
Junta suas economias oriundas de colunas semanais a um jornal e de sua aposentadoria para pagar pela virgem.
Todos os elementos que poderiam montar um quadro desolador e triste funcionam como ponto de partida pra uma história otimista e de celebração da vida.
Peraí!
Otimismo e celebração da vida?
Literatura não é aquele tipo de coisa que tem que ser sombria, gótica, soturna, banhada em lágrimas de infelicidade pra ser boa?
Leia bem a pergunta anterior. Lembre-se que o romantismo byronista é do século XVIII - XIX.
É, acho que já deu tempo pra gente superar isso.
Não, ninguém aqui vai pregar a alegria de viver e o ensolarado céu de anil do meu Brasil. Mas porque pensar SOMENTE na banda podre da vida?
Ela existe, não a neguemos.
Mas é ótimo quando um García Márquez resolve mostrar um momento terno, simples e singelo da vida.
E mais: de uma vida próxima do seu término.
Numa posição oposta a de Ivan Ilitch (leiam, leiam!), esse personagem inominado não se arrepende de nada.
Lembra do que pôde passar e não se importa com que o que poderia ter feito ou sido. Em 90 anos de vida são tantas as experiências que pouco espaço resta ao lamento.
Uma narração segura, ornada de metáforas e imagens assustadoramente belas. Um texto de celebração da existência e da vida sim.
E não há problemas nisso. Pelo contrário. O drama não é melhor que a comédia. A denúncia não é mais importante que a celebração.
Alienação é ignorar parte dos elementos por conveniência.
Um texto leve (mas nada leviano) sobre um tema considerado pesado: pedofilia. Mas isso não passa pela cabeça do leitor enquanto percorre as páginas.
Talvez no sentido literal dos termos gregos: amor por meninos. Meninos, é claro, entendido como conjunto. Pois é exatamente isso.
A relação estabelecida entre o velho e a menina é de admiração e amor. Um amor verdadeiro e real, não de idealizações impossíveis.
Escrever uma história de amor que não seja piegas ou abarrotada de clichês é um exercício de grande autor.
É coisa pra um García Márquez da vida.
Dessa vida vivida, vívida. Não arrependida.
Simples: uma belíssima história contada perto do seu ponto final. Sem nenhuma mágoa por estar acabando.
Leituras Relacionadas: Cem Anos de Solidão (Gabriel García Márquez), Lolita (Vladmir Nabokov), Risíveis Amores (Milan Kundera) e A Morte de Ivan Ilitch (Leon Tolstoi).