Hoje* pude assistir a Adeus à linguagem, o novo filme do Godard. A sessão foi em 3D, em um pequeno cinema do Quartier Latin - sala um pouco cheia, com um velhinho na primeira fileira que parecia ser o próprio diretor.
O filme segue a estrutura já apresentada em obras recentes de Godard, como Film Socialisme e o curta que ele rodou em 3D: imagens múltiplas de variadas fontes, pensamentos entrecortados, uma contínua recusa a qualquer possibilidade de narrativa ficcional, a negação do tempo presente, uma aproximação visceral com a literatura, os corpos, os símbolos, as cores, o som, o erro, o fora de sync, o fora de campo, aquilo que está oculto, a imagem amadora, a imagem roubada, a imagem de baixa resolução.
Tudo é permitido em um filme de Godard, até mesmo a repetição, o excesso e a recusa a si mesmo. É um filme um tanto pessimista, de alguém que já não pertence a esse tempo, de um diálogo que já se tornou antagônico. Em alguns momentos há a impressão de que Godard filma simplesmente pelo fato de que está caçoando da sua própria vontade de não querer mais filmar. E em seguida surgem imagens muito particulares, específicas, densas, de múltiplas camadas.
Um poeta que investiga a imagem pela sua ausência. Ou um cineasta que investiga a palavra pelo seu aspecto físico. As atrizes Zoe Bruneau, Héloïse Godet, a trilha descontínua, o anti-desenho de som - tudo é maravilhoso dentro do universo proposto pelo cineasta - um filme sempre como algo novo, mesmo que o novo não mais exista.
*Texto escrito a 21 de maio de 2014.