Depois do sucesso do livro de Adriana Falcão, veio a peça - adaptada e dirigida por João Falcão. Consagrada como uma das montagens mais inovadoras do teatro brasileiro dos últimos anos, "A Máquina" volta a ser apresentada ao público, mas desta vez na telona, sob o comando do mesmo diretor da peça, João Falcão, que assim faz sua estréia no cinema. Ele também assina o roteiro ao lado de Adriana, fechando o ciclo da história em três diferentes formas artísticas.
O longa reúne o elenco que despontou nas montagens da peça: Wagner Moura, Vladimir Brichta, Lázaro Ramos, Karina Falcão e Gustavo Falcão (este interpreta o personagem principal, Antônio). Completam o elenco os protagonistas Paulo Autran e Mariana Ximenes.
Quase que inteiramente filmado em estúdio, A Máquina narra, em tom de fábula, a vida em Nordestina, um lugarzinho de nada no interior do Brasil. Lá, Antônio (Gustavo Falcão) e Karina (Ximenes) vivem uma grande história de amor. Mas ela é uma garota sonhadora que deseja ser atriz e partir para o mundo. Antes que seu amor lhe escape, Antônio adianta-se numa cruzada kamikaze para trazer o mundo até Karina.
Confira abaixo uma entrevista exclusiva com Gustavo Falcão, que relata seu envolvimento (inclusive familiar) com esta obra:
1) O que te motivou a trabalhar em "A Máquina"? O que há de encantador no filme?
Em primeiro lugar minha relação estreita com a história e sua trajetória. Além da forte ligação familiar, participei da montagem teatral de "A Máquina", onde conheci e trabalhei com grandes atores (Wagner Moura, Lázaro Ramos, Vladimir Brichta, Felipe Kouri e Karina Falcão) que se tornaram grandes amigos. A mudança que essa experiência provocou na vida de todos nós foi extremamente profunda, tanto no campo pessoal como no profissional. Além disso, "A Máquina" conta uma história linda, repleta de poesia e encantamento, e apresenta um dos personagens mais instigantes que eu já conheci, o Antônio, em cuja trajetória pude viver os sentimentos mais diversos em uma gama riquíssima de situações.
2) Como é a sua relação com o cinema? O que te atrai nessa arte?
A melhor possível, tanto como ator quanto espectador. Acho fascinante a possibilidade de fazer parte de uma fábrica de sonhos, onde se trabalha sempre pleno de amor. Nesse sentido o cinema é muito próximo do teatro, a relação com a história e o personagem chega a ser das mais intensas e completas, o processo de criação das cenas, os ensaios, tudo conspira para que se tenha a certeza de que o que fazemos ali é arte, pura arte.
3) Você é uma ator que está fazendo muito teatro e cinema. Como fica a TV nessa história?
Também é possível fazer grandes obras na TV, obras de arte, assim como podemos acompanhar grandes profissionais trabalhando. A TV também me encanta, tanto na possibilidade de convívio e contracena com estes grandes profissionais de várias áreas, como num exercício de agilidade e desprendimento, em que sua relação com seu persaongaem chegue a ser tão estreita que você consiga saber imediatamente como ele reagiria em determinada situação. Numa novela, por exemplo, por se tratar de uma obra aberta, é muito importante que se alcance isso. Pra mim, ainda é um grande desafio fazer TV, e pretendo desenvolver isso.
4) Como foi o processo de trabalho para A Máquina? Como foi compor o Antônio de D. Nazaré?
Li e reli o roteiro uma dezena de vezes, sem procurar definir nada em relação ao personagem, só me deixando absorvê-lo o máximo possível. Depois, como não podia deixar de ser, me remeti a minhas memórias afetivas todas em relação à peça, ao Antônio que havia feito nela e aos Antônios dos outros atores com quem contracenei, e fui buscar aí o melhor material de cada uma daquelas interpretações. Em seguida me voltei inteiramente para minhas recordações em relação ao Nordeste (sou de Recife e vivenciei muitas passagens pelo interior do Nordeste) indo, inclusive, revisitá-las in loco, através de duas viagens que fiz ao lado de Mariana Ximenes (a Karina do filme) para cidades do interior do Ceará e de Pernambuco. Há no Antônio um fragmento da alma de cada nordestino, sua poesia, sua delicadeza e força, sua honestidade e esperteza.
5) Você tem uma atividade como professor também? Como é esse trabalho? Como ele te completa?
Sou professor de acrobacia aérea para crianças e adolescentes, trabalhando em parceria com minha mulher, Juliana. Damos aulas em tecido vertical, tecido marinha e trapézio, basicamente, tentando voltar o conteúdo das aulas para o viés mais expressivo do movimento, concluindo todas as aulas com exercícios de improviso no tecido, em que os alunos utilizam os movimentos que têm aprendido durante as aulas. É maravilhosa a sensação de estar educando aquelas crianças, acompanhar o desenvolvimento individual de cada uma e poder repassar conhecimento. Dá um sentimento genuíno de grandeza e humanidade.
6) Te incomoda o assédio do público?
Não. Até hoje, isso nunca ultrapassou o limite do respeito. Acredito que isso depende muito da postura do artista em relação ao assédio. No que depender de mim, vou sempre tentar manter esse limite, estando sempre completamente aberto e desejoso das manifestações de carinho do público.
7) Você trabalha muito com arte, mas dá tempo para consumir arte? Ou seja, como inserir na rotina as idas ao teatro, cinema etc? Qual tipo de espetáculo ou filme procura assistir?
É a primeira coisa que faço quando sobra um tempo. É fundamental, imprescindível pra mim. Procuro assistir os artistas de que gosto, mais do que um tipo específico ou gênero de peça ou filme.
8) Quais atores são seus modelos profissionais?
Paulo Autran, Marco Nanini, Wagner Moura, Lázaro Ramos, Selton Melo, Matheus Nachtergaele, Jack Nicholson, Daniel Auteil, Javier Bardem, Ian McKelley, Marlon Brando, James Dean.
9 ) Qual foi seu maior desafio profissional? Por quê ?
Provavelmente compor o personagem do próximo longa de João, que deve estrear em junho, o "Fica comigo esta noite", uma adaptação da peça homônima de Flávio de Souza. Interpreto um personagem chamado de "Fantasma do coração de pedra", um poeta que morreu jovem, na primeira metade do século passado, cujo espírito envelheceu mas o corpo não. Por se tratar de um personagem de composição, numa concepção não realista de interpretação, tive um longo e difícil processo para conciliar os aspectos mais dramáticos de um personagem quase alegórico dentro de um tom não realista porém sutil de interpretação, que a liguagem cinematográfica suportasse.
10) Você já foi protagonista de cinema e teatro. O que falta ainda?
São inúmeras as histórias que gostaria de contar e os personagens que gostaria de viver, além de alimentar desejo de trabalhar com vários atores e diretores do Brasil e alguns estrangeiros, até. Algumas destas coisas vou conseguir, outras não, mas todo e qualquer projeto de que venha a participar espero que se baseie sempre no desejo e necessidade de me desenvolver como ator e ser humano.