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Assim estava escrito... e dito

28 jul 2005 às 18:11

Quando em 1940, em ''...E o Vento Levou'', o Rett Butler de Clark Gable dizia a Scarlett O'Hara-Vivien Leigh: ''Frankly, my dear, I don't give a damn'', isto é, ''eu não estou mais nem aí'' mas estava sim, só que não aguentava mais aquela linda mulher tão chata, tão mimada e tão indecisa , o ator mal sabia que estava entrando para a galeria dos imortais da história do cinema americano (e mundial, por obra e graça da disseminação imperial de Hollwood).

É claro que o filme atravessará os séculos por conta dos inúmeros sortilégios reunidos, as tais felizes coincidências agregadas aos inegáveis talentos envolvidos. Mas que a frase famosa também ajudou, isso ninguém duvida. E outras tantas, de tantos outros filmes. Especialmente porque ditas e repetidas ao longo das décadas como verdadeiras orações pelas platéias dos EUA, que embalam seus sonhos os que acabaram e os que ficaram com o brilho das imagens e sons que o cinematógrafo plasmou em suas retinas e ouvidos nos últimos 110 anos.


Fiel vigilante das tradições cinéfilas, o American Film Institute, o venerando AFI, vem promovendo anualmente, desde 1998, eleições com o objetivo de glorificar obviamente o cinema made in USA. Não se trata de xenofobia, mas de uma espécie de culto, um tipo de religião que honra a longa e emblemática iconografia composta por divos e divas, heróis e vilões, santos e pecadores, justo e iníquos. Sempre glorificando os feitos exclusivamente hollywoodianos, na primeira rodada foram eleitos os 100 melhores filmes desnecessário mais uma vez enfatizar a maciça presença norte-americana, questionável em boa parte em detrimento de títulos monumentais do outro cinema, aquele que não fala inglês.


Mas a turma do AFI pode invocar de novo Rett Buttler e simplesmente repetir aos quatro ventos ''frankly, my dear, I don't give a damn''. É verdade, não estão nem aí. Mesmo. É um clube do bolinha em celulóide. As meninas, no caso, são os produtores de outras plagas. É como aquele jogo de futebol com a criançada da vizinhança. Tem o dono da bola, e é ele quem escala o time, escolhe a melhor posição e termina o jogo a qualquer momento, por qualquer motivo. E ninguém pode achar ruim. Este é o American Film Institute.


Depois dos tais 100 melhores filmes vieram os 100 maiores astros e estrelas (1999), as 100 comédias mais engraçadas (2000), os 100 suspenses de arrepiar (2001), as 100 maiores ''paixões'' (2002), os 100 maiores heróis e vilões (2003) e as 100 mais belas canções (2004). Ainda para este ano, quando setembro chegar, nova centena será revelada, a de trilhas sonoras. E no mês passado, foram reveladas as ''100 Quotes'', ou citações entre as aspas. Ou frases, que é o que de fato elas são, extraídas de filmes que se notabilizaram por uma ou outra razão.


O processo de escolha é democrático respeitada a máxima ''o que é bom para o cinema americano é ainda melhor para o cinema americano''. Na primeira fase deste última escolha, a das frases, o AFI distribuiu uma cédula com 400 títulos de filmes a 1500 líderes da ''comunidade criativa'', incluindo gente ligada aos filmes (atores, diretores, roteiristas, fotógrafos, editores), críticos e historiadores. O júri tirou então desta lista as 100 frases que acabaram no panteão, apoiado nos critérios de ''impacto cultural'' e ''legado''. De certa forma, um ''top of mind'' de citações que, afinal de contas, dizem muito do caráter, da personalidade e da própria formação do povo americano.


As citações cobriram um período entre 1927, abrindo com o primeiro filme inteiramente sonoro, ''O Cantor de Jazz'' (''Esperem um pouco, esperem um pouco. Vocês ainda não ouviram nada!''). E terminam em 2002 com o arrepiante Golum repetindo ''My precious'', em ''O Senhor dos Anéis: As Duas Torres''). O campeão de citações foi ''Casablanca'', com sete, e a referência mais famosa é o cult ''Play it, Sam'', dita por Humphrey Bogart (outro campeão, com dez frases espalhadas por diversos filmes).®MDBO¯ ®MDNM¯Bette Davis, James Stewart, Judy Garland, Greta Garbo, Al Pacino, os Irmãos Marx, Woody Allen, Robert De Niro e Jack Nicholson também aparecem com diversas citações.


Entre as eleitas há para todos os gostos, memórias e fãs-clubes. O último colocado, ''Eu sou o rei do mundo'', de ''Titanic'', ironicamente pertence ao campeão absoluto de bilheteria em todos os tempos. Clint Eastwood ostenta um honroso sexto lugar com a sentença que o durão detetive Harry, o Sujo profere ao marginal: ''Vá em frente, me deixe feliz'' (''Go ahead, make my day''). Ou a melopéia de ''Love Story'', a lacrimogênea ''Amar é não ter jamais que pedir perdão'', aparecendo em 13º. E em 15º, o espacial E. T. se lamenta: ''E.T. phone home''.


Não podia faltar ''Bond, James Bond''. Ou ''Rosebud"'' o enigma de Orson Welles em ''Cidadão Kane''. Ou ''Não há lugar como o lar'', de ''O Mágico de Oz''. O culto ao espírito aparece em ''Se você construir, ele virá'', em ''Campo de Sonhos''. Os monstros sagrados estão presentes, como Marlon Brando dizendo ''Stella! Hey, Stella!'', ficando famoso em ''Um Bonde Chamado Desejo''. Ou como Lord Laurence Olivier torturando Dustin Hoffman em ''Maratona da Morte'': ''Is it safe?''. Ou ainda como a sublime declaração de amor de Katherine Hepburn a Henry Fonda em ''Num Lago Dourado'': ''Me ouça bem, mister. Você é meu cavaleiro numa armadura brilhante. Não se esqueça disso. Você vai montar naquele cavalo e eu vou estar bem atrás de você, segurando firme, e então nós iremos juntos, go, go, go''.

E até o decadente Arnold Schwarzenegger entrou para o hall da fama com suas duas frases-despedida que viraram bordão popular. Ele comparece ao 37º lugar com a seca ''Eu voltarei!'', de ''O Exterminador do Futuro 2'', e ao 76º com a hispânica ''Hasta la vista, baby!'' Mas há muito mais, justificando plenamente uma visita ao site oficial do American Film Institute: www.AFI.com


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