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Um raro filme pensante

Rodrigo Moraes
04 jun 2001 às 17:24

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O casal traído: paixão latente - divulgação
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"Amor à Flor da Pele" é um desses filmes raros que a Fundação Cultural de Curitiba nos presenteia de vez em quando. O filme está em cartaz em uma das salas mais simpáticas da capital paranaense, o Cine Luz, na praça Santos Andrade. Dificilmente chegará aos cinemas do interior do Paraná, com exceção talvez do Cine Teatro Ouro Verde, em Londrina, também mantido por uma instituição pública e que privilegia os chamados "filmes de arte".
É uma agradável surpresa constatar que ainda existe um público interessado no cinema avesso às apelações que dominam o circuito pipoca nacional - filmes-videoclipe, violência gratuita e efeitos especiais protagonistas de fórmulas fáceis e acéfalas (leia-se: quase todas as superproduções hollywoodianas). Enfim. Numa tarde de sábado, mais de 30 pessoas compareceram para assistir ao filme do diretor Wong Kar-wai, de Hong Kong. Originalmente conduzido, inteligente, sensível, poético e contra-indicado para quem se diverte com os "Pearl Harbors" que são exibidos por aí. Preconceito? Bom senso.
A história se passa em Hong Kong em 1962. A jovem secretária Su Li-zhen (Maggie Cheung) aluga um quarto para morar com seu marido, que vive em constantes viagens de negócios. No mesmo dia de sua mudança, o jornalista Chow Mo-wan (Tony Leung) chega com sua mulher para morar num quarto do apartamento ao lado. Sua esposa é igualmente ausente, e os dois passam a viver com resignação suas vidas solitárias, até descobrirem que seus companheiros têm um caso. Entre si. A partir daí, os dois traídos se aproximam e tornam-se confidentes.
Há um romance no ar, um romance que parece nunca se consumar, uma tensão e sensualidade e desejo reprimidos que embalam a trama através de sutilezas habilmente conduzidas pelo diretor. Em torno da paixão latente desenvolvem-se as formidáveis atuações do casal de atores principais - nuances e dilemas são olhares e gestos; tornamo-nos facilmente cúmplices de sua cumplicidade. Nada é óbvio em "Amor à Flor da Pele". A atmosfera ligeiramente sombria do filme (chuvas noturnas, ruelas estreitas, ambientes fechados, fumaça de cigarro no ar) sugere um estado de torpor que nos impede saber qual é de fato a realidade.
O diretor utiliza muitas tomadas que mostram os gestos dos personagens, suas mãos, troncos e olhares, e não seus rostos por completo. O casal infiel não aparece em nenhum momento - apenas os vemos de costas, ou ouvimos suas vozes. E o casal traído passa pela tela em câmera lenta, como num ballet de mãos, corpos, olhares. Observamos seus gestos extremamente sensuais, a solidão e o desejo prestes a explodir. E está aí a grande originalidade do filme: são cenas de extrema sensibilidade porque demonstram a intimidade entre a dupla de protagonistas sem utilizar palavras ou ação, mas de forma tensa, presente em cada instante.
"Amor à Flor da Pele" é um filme feito de momentos, instantes, pedaços que compõem uma história comovente, mas também não muito fácil de digerir: acostumados que estamos aos mastigados filmes americanos, nos recusamos a pensar e comer pipoca ao mesmo tempo. Só por nos oferecer este exercício, a Fundação Cultural de Curitiba merece o nosso aplauso.
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