Até a última terça-feira um dos títulos mais cotados para concorrer ao Oscar em muitas categorias de ponta, ''O Gângster'' entra no circuito brasileiro não exatamente como pré-derrotado, mas sensivelmente esvaziado em suas expectativas depois do anúncio da Academia - apenas duas nominações, e secundárias: atriz coadjuvante (Ruby Dee) e direção de arte. Por outro lado é até conveniente que se veja este bom filme de Ridley Scott sem os pesados tributos de valoração que em geral sobrecarregam os favoritos.
O que o espectador encontra na tela é um novo comentário, um pequeno apêndice à saga mafiosa produzida com frequente brilho ao longo de décadas por Hollywood, e que traz uma particularidade: um gângster negro. Diga-se que este aporte de argumento é a única novidade, exatamente o fato de contar uma história sobre mafiosos que inclui a comunidade negra.
Para além disso, não há segundas leituras, não há atualizações. O que vai contado aqui, em longos e às vezes excessivos 157 minutos, vale pela narrativa fluida, por uma construção rigorosa, pela eficácia profissional. Ridley Scott e o roteirista Steve Zaillian criaram uma história que se apóia no alicerce clássico e sólido da genealogia de filmes sobre a Máfia, e isto assegura pleno e fundamentado entretenimento dentro dos parâmetros do cinema em escala industrial.
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Por isto, querer encontrar mergulho mais profundo nas contradições do mito do sonho americano é um pouco demais. Como consequência, deve-se apreciar com sóbria aprovação a ascensão e queda do narco-traficante e todo-poderoso chefão do Harlem, Frank Lucas (Denzel Washington), e a tenaz perseguição de seu principal antagonista, o honesto policial de rua Ritchie Roberts (Russell Crowe).
Baseada em fatos verídicos, a ação se situa na Nova York dos anos 1970, com exteriores em cenários naturais admiravelmente fotografados - a veracidade das locações é a merecida justificativa para o filme concorrer à estatueta de melhor direção artística, item que empresta relevância dramática à narrativa.
O bom roteiro de Zaillian trabalha acertadamente as trajetórias paralelas dos dois personagens (ambíguos, nenhum é o que parece à primeira vista), construindo detalhada crônica de época que aguça o interesse do público sobre quando e como se dará o apogeu de Lucas e o progresso das investigações de Roberts.
Mesmo reconhecendo-se o mérito de Scott como exímio narrador através de imagens, é bom fazer justiça ao cinema de Coppola, Scorsese e De Palma, notórias inspirações para este bem satisfatório ''O Gângster''. O duelo entre Washington e Crowe robustece a trama, e o entorno da produção é puro profissionalismo na melhor tradição do mainstream.