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'Ligado em Você' faz humor com gêmeos siameses

Carlos Eduardo Lourenço Jorge
08 mar 2004 às 12:05

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''Ligado em Você'': cinema satírico, atrevido e perpicaz para tratar da história dos irmãos siameses - Divulgação
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Os roteiristas-diretores Bobby e Peter Farrelly (''Quem Vai Ficar com Mary?'', ''Eu, Eu Mesmo e Irene'') adoram retesar ao máximo (e arrebentar) as amarras do bom gosto enquanto fabricam piadas sobre temas outrora considerados proibidos pelos censores ou intoleráveis por respeitáveis platéias - de resto, é bom lembrar que o politicamente incorreto pode ser uma saudável e necessária transgressão, porém o abuso pode gerar desastrosa dependência.

Mas há, no entanto, uma espécie de benevolência, uma generosidade latente no trabalho desta dupla irreverente. Embora os Farrely reconheçam Billy Wilder como um de seus mentores, eles têm muito pouco da crueldade, da amargura e do cinismo do mestre da comédia de comportamento.

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Isto é evidente no mais recente e mais inteligente trabalho deles, ''Ligado em Você''. O filme produz, antes, uma sucessão de boas risadas de satisfação do que a gargalhada debochada por conta daquele território de ''American Pie'' e adjacências.

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Talvez a principal razão porque ''Stuck on You'' funciona, e funciona bem, é o casting de Matt Damon como o tímido, inteligente Bob Tenor, gêmeo xifópago, ou siamês, do extrovertido e confiante Walt Tenor vivido por Greg Kinnear. O primeiro localizado à direita, o segundo à esquerda, unidos por um único fígado - a parte maior fica com Bob, o que deixa Walt com cara de mais velho, embora tenham apenas 32 anos.

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Para saber porque os Farrellys são os Farrelly, é bom considerar o seguinte: qualquer outro escritor de comédia que fizesse um filme sobre irmãos siameses (eles recusam a definição e rebatem: ''somos americanos'') com certeza cairia na armadilha de tentar arrancar humorismo fácil tanto da exasperação como da frustração de um e de outro, diante do handicap. Um seria democrata, o outro republicano; um seria limpo, o outro desleixado, e assim por diante.


Espertos, os Farrelly. Antagônicos, os personagens seriam interessantes por no máximo cinco minutos. Mas acontece que eles se amam de verdade e se suportam integralmente. São felizes donos de um fast-food, e mestres na arte de fazer e servir hambúrger em tempo recorde - o pedido é entregue em três minutos ou o freguês não paga a conta.

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Com o tempo, ambos desenvolveram estranhas habilidades para o hockey e para o beisebol. Mas Walt, o que envelhece mais rapidamente, não se contenta com a vida pacata da cidade numa ilha de Massachussets. Tem também habilidades artísticas, e quer passar de interprete amador (é hilariante sua performance solo imitando Truman Capote) a astro de cinema e tevê.


Ele acaba convencendo o mano Bob a acompanhá-lo a Hollywood, em busca do sonho. As melhores situações advêm desta aventura pelo universo do show businness, com ótimas participações especiais de Jack Nicholson, Cher e Meryl Streep (as duas parodiando a si mesmas).


A trama é reforçada em engenho e audácia quando surge a possibilidade de uma cirurgia para separar os irmãos, com inesperadas consequências.
Os fãs ortodoxos vão recriminar a aposentadoria (definitiva?) do mau gosto e dos gags safados, achando que o cinema dos Farrellys perdeu em anarquia e ganhou em sentimentalismo e boas intenções.

Mas a despeito de perdas ou ganhos com esta evolução de estilo, o cinema satírico da dupla ainda é atrevido, refrescante e perspicaz o suficiente para que se obtenha um riso não rápido e furioso, mas um olhar risonho e terno sobre seres apenas humanos. Não é um grande filme, mas é com certeza apreciável.


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