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Em busca do sonho e do Oscar

Carlos Eduardo Lourenço Jorge - Folha de Londrina
02 fev 2007 às 12:52

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Baseado em fatos reais, filme reúne pai e filho na vida real e na ficção, mas padece de forçado dramatismo hollywoodiano - Divulgação
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Um melodrama é um filme de gênero. Assim como uma trama de ação, ou uma comédia ou um argumento de suspense. Igual ao suspense, o melodrama é gênero terrivelmente propenso à manipulação da platéia, cuja tendência é rezar contrita pela cartilha da lágrima do protagonista em primeiro plano.

É a síndrome do contágio. ''À Procura da Felicidade'', em cartaz no circuito nacional, oferece este contágio através do personagem de Will Smith. Mas ele é manipulador hábil.

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Já é conhecida a destreza e a capacidade que tem Smith tanto de chorar quanto de aplaudir a si mesmo, em show tanto para o público quanto para seus colegas votantes da Academia. Estamos, portanto, diante de um híbrido, o melô temperado, não exatamente ortodoxo, mas com liberdade suficiente para deixar a maior área de manobra possível para a performance histriônica de seu intérprete.

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Hoje em dia a informação ''baseada em fatos reais'' no início de um filme é quase uma garantia de que os fatos em questão foram suficientemente manipulados para assegurar sua eficácia dramática, ou para ser mais preciso, seu bom desempenho nas bilheterias.

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''Em Busca da Felicidade'' tem roteiro inspirado na vida de Chris Gardner, que de modesto vendedor classe média chegou a sem-teto nos tempos de vacas magras das chamadas reaganomics, a política econômica do governo Reagan nos anos 80.


Na casa dos 30, Gardner (Will Smith) sobrevive vendendo scanners médicos em São Francisco. As vendas vão mal. E ainda por cima sua mulher (Tandie Newton), megera consumada, o maltrata porque o incansável e infeliz não leva dinheiro para casa. Ela o abandona. Ele se volta para o filho de cinco anos (Jaden Christopher Syre Smith, filho na ficção e na vida real). São despejados. Literalmente na rua da amargura, Gardner e o garoto passam o diabo, com frequência dormindo em banheiros públicos e amargando a hostilidade de minorias ao redor - visto por este ângulo e pensando bem, não seria o filme o mais racista, cruel e cínico dos últimos tempos? E ainda por cima misógino, pelo tratamento dado à mulher (a única personagem de ficção na história)?

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Mas Gardner sempre foi um sujeito hábil com os números, com as contas, e casualmente acaba se envolvendo com Wall Street, como agente da bolsa. Durante seis meses trabalhará como um estivador e não verá a cor do dinheiro, ao contrário dos outros no alto dos edifícios, competidores leais, inteligentes, gentis, solidários, gente de família, todos encantados com ele, a convidá-lo para o setor VIP nas partidas de beisebol.


Todos brancos e milionários. Como Gardner gostaria de ser. Mas para que os sacrifícios rendam frutos ele terá que correr muito, se multiplicando por vinte se puder. E vem a recompensa, expressa nos títulos finais anunciando que o protagonista teve tanto êxito no mundo das finanças que conseguiu conquistar uma dessas cifras astronômicas.

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Este épico de bolso do capitalismo selvagem começa como comédia dramática, e justiça se faça ao italiano Gabriele Muccino (''O Ultimo Beijo'') em sua estréia em Hollywood: ele sabe conduzir esta primeira parte com graça, leveza e até sedução. Mas o que principia bem perde fôlego de esperteza e ganha sobrecarga de forçado dramatismo tipicamente hollywoodiano, anulando qualquer possibilidade de empenho autoral do diretor, que segue estritamente o manual.


Os Smith, pai e filho, reeditam dupla famosa dos anos 1970, quando papai Ryan O'Neal e a filhinha Tatum já buscavam a felicidade em ''Lua de Papel'', de Peter Bogdanovich. O nepotismo funciona bem também aqui, neste lado da trama que aborda - com alguns excessos - a relação pai e filho sob circunstâncias adversas.

''À Procura da Felicidade'' é isto mesmo que o título pretende: a busca, não a conquista da felicidade, embora a rubrica previsibilidade conduzirá ao final que todos desejam - e que aconteceu de verdade, segundo o mais ideológico dos sonhos americanos, o do self-made man. E metaforicamente vale a busca da felicidade, o Oscar, para Will Smith, anteriormente nominado e preterido pela interpretação em ''Ali''.


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