Amélie Poulain leva hoje uma vida diferente. Aos 21 anos, a menina antes solitária, que sentia palpitações com a simples aproximação do pai, tem mais de mil amigos. O cabelo negro e chanel de outrora virou loiro e anelado. A Paris dos anos 1970 deu lugar a São Paulo, onde ela estuda design de interiores para, quem sabe, trabalhar em uma revista de decoração. O gosto por framboesas, como as devoradas dedo a dedo na sempre imitada cena do filme, no entanto, ainda persiste.
Nascida em Paris, filha de um francês com uma brasileira, Flora Guilet viveu a protagonista de "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain" (2001) durante a infância. Acabou nas telas por ser curiosa e hiperativa, depois que a mãe decidiu levá-la para os testes de elenco do longa, cujo anúncio vira em uma revista. Com jeito docemente espontâneo, a pequena conquistou os produtores e especialmente o diretor Jean-Pierre Jeunet, que se encantou também pela semelhança, na época, com a protagonista, vivida na fase adulta por Audrey Tautou.
"Eles queriam que a menina fosse um pouco mais velha, que tivesse uns seis ou sete anos. E eu tinha só cinco na época. Mas mesmo assim eles gostaram de mim e acabaram me escolhendo", diz ao UOL a jovem, que mora há dez anos no Brasil, fala português sem sotaque e tem dupla cidadania. "Na verdade, não sei se tenho muito em comum com ela. Talvez a positividade."
Uma década e meia depois, Flora se lembra pouco das filmagens na capital francesa. Nem das caras e bocas que fazia. Era como se fosse apenas mais um dia de brincadeiras e era.
A memória mais marcante, conta, é a de um abnegado Jeunet perguntando várias e várias vezes se estava pronta para entrar em cena. Com apenas uma fala nos sete minutos em que aparece nas telas, a estreante não deu muito trabalho. Portou-se praticamente como uma profissional à frente das câmeras.
O único imprevisto aconteceu antes, no momento da caracterização. Flora protagonizou uma cena digna daquela em que se esgoela no filme, após flagrar o salto suicida de seu peixinho de estimação.
"Lembro que não fiquei muito feliz porque cortaram meu cabelo muito curto. Fiz o maior escarcéu para não cortarem. Mas não teve jeito. Minha mãe falava: 'Calma, ele já cortou o cabelo de um monte de atriz famosa' (risos)".
Indicado a cinco Oscars em 2002 e com fãs espalhados pelo mundo, o longa rendeu a Flora outros convites para trabalhar como atriz. Um deles feito pela mesma produtora de elenco, às vésperas da mudança para Ilhabela, no litoral paulista. A carreira de atriz acabaria ali, mas sem arrependimentos.
"Minha mãe não queria que eu fizesse mais coisas. Ela dizia que, quando eu fosse mais velha, poderia escolher ou não essa profissão para mim. Falava que eu era muito nova e que não ia me obrigar a fazer isso", diz Flora, mais fã dos filmes dos irmãos Coen do que da própria história que estrelou. "Já até pensei em ser atriz e fazer cinema, mas gosto mesmo é de design e jornalismo."
Autógrafos nem pensar. A ideia é, ao menos por ora, permanecer no anonimato. "Geralmente, eu não falo sobre o filme. Mas, quando estou em algum lugar, minha família e meus amigos acabam contando para todo o mundo. Eu confirmo, mas não chego por aí dizendo 'oi, prazer, eu fiz a Amélie Poulain' (risos)".
Em tempos de redes sociais, manter a discrição parece ser um desafio tão grande quanto o de ser prestativa e ajudar as pessoas à sua volta, uma das marcas da personagem. "Há casos muito engraçados. De gente do mundo inteiro que fica mandando mensagem no Facebook, perguntando como eu estou. Alguns falando que deram o nome de Amélie à filha por minha causa. Teve até um cara que fez uma tatuagem com meu rosto. Esse carinho é legal." (Com informações UOL Entretenimento)