A campanha da candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, vem intensificando esforços para desvincular a sua imagem de grupos religiosos mais conservadores da área evangélica. Neste domingo (31), durante ato de campanha no Parque Farroupilha, em Porto Alegre, o candidato a vice na chapa, deputado Beto Albuquerque, defendeu a laicidade do Estado e disse que o governo do PSB não irá privilegiar nenhuma religião. "Não podemos fazer um governo desta ou daquela religião. Precisamos fazer um governo para os brasileiros", afirmou. "Nem a política deve mandar na religião, nem a religião na política. Temos que ser laicos."
As críticas ao que seria uma excessiva dependência da candidata em relação a grupos mais conservadores se intensificaram após ela ter prometido em seu programa a defesa de reivindicações do movimento gay e, menos de 24 horas depois, divulgar uma errata na qual recuava nas questões principais daquele capítulo. A decisão da candidata ocorreu após alguns pastores e políticos da bancada evangélica terem exigido que ela se retratasse, sob pena de perder os votos da comunidade evangélica.
Em sua conta do Twitter, o pastor Silas Malafaia, destacado ativista contra as reivindicações do movimento de defesa dos direitos de gays, lésbicas, travestis e transexuais, afirmou que Marina, "a candidata membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus", estava fazendo "uma defesa vergonhosa da agenda gay". Em seguida, ameaçou: "Se Marina não se posicionar até segunda, na terça será a mais dura e contundente fala que já dei até hoje sobre um candidato a presidente".
Preocupação
Marina divulgou a errata no sábado, 30, atribuindo o que havia sido publicado - defesa clara do casamento gay e da criminalização da homofobia - a uma "falha processual na editoração do texto". A mudança provocou críticas no movimento gay e fora dele. "A errata foi um banho de água fria, mas nós já sabíamos que, dos três candidatos que se destacam na pesquisas eleitorais, ela é a que sempre se manteve mais distante da população LGBT", disse neste domingo o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno. "O mais preocupante disso tudo, porém, é ver a candidata se distanciando de uma das grandes conquistas da democracia, que é o Estado laico", afirmou.
O escritor Milton Hatoum, um dos mais importantes ficcionistas brasileiros da atualidade, traduzido em várias línguas, anunciou publicamente ontem a retirada de seu nome de uma lista de personalidades, intelectuais e artistas que haviam declarado apoio à candidatura de Marina. "Não acredito em falha processual na editoração do texto. Foi uma falha moral. Uma falha de princípios éticos. Falha com os compromissos republicanos de um Estado laico", disse o escritor ao jornal O Estado de S. Paulo. "Não quero eleger um presidente da República que seja refém de bancadas religiosas. Tenho pavor disso."
A campanha de Dilma aproveitou o episódio para classificar Marina como "uma evangélica fervorosa" em post publicado no Facebook no fim de semana.
O ex-governador tucano Alberto Goldman, um dos coordenadores da campanha de Aécio Neves, a "errata" da campanha do PSB "é uma agressão à nossa inteligência". Ele escreveu em seu blog que, ao excluir o apoio às propostas em defesa do casamento civil igualitária e de equiparação da discriminação baseada na orientação sexual e de identidade de gênero ao racismo, a ex-ministra do Meio Ambiente demonstrou "clara submissão a grupos que a apoiam, na linha da velha política".
Ação conjunta
Enquanto o vice de Marina tentava desvincular a candidata de grupos religiosos mais conservadores, o comitê LGBT da campanha divulgava uma nota na qual confirma a versão de que houve um erro na editoração do capítulo do que trata dos direitos dos homossexuais.
Segundo o comitê, o que saiu publicado foi a pauta integral reivindicada pela base do PSB e representantes da Rede de Marina - e não o que havia sido aprovado pela coordenação política da campanha. "Não vamos aceitar que uma falha de diagramação desqualifique nosso debate pela construção de uma nova política", diz o texto. "Nossa luta é pela defesa do Estado laico e por um Brasil que respeite a todos."
A nota foi produzida após um longo e ruidoso processo de consultas internas, ao final do qual vários dos participantes disseram que não dariam entrevistas por orientação da campanha. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.