O ministro do Esporte, Orlando Silva, pediu demissão nesta quarta-feira, após denúncias de envolvimento em desvios de verbas em sua pasta. Em pronunciamento após encontro com a presidente Dilma Rousseff, Silva disse, ainda no Palácio do Planalto, que sofreu um "linchamento político". Silva disse que tomou a decisão de se afastar do cargo de forma "consciente".
"Examinamos a crise que foi criada nos últimos dias, os ataques que sofri. Reafirmei à presidente que não há, e não houve, qualquer prova que me incrimine".
Filiado ao PCdoB, Silva é o sexto ministro a deixar o governo em pouco mais de quatro meses, desde que Antonio Palocci pediu demissão, em junho. Mais cedo, o secretario-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, disse que o secretário executivo da pasta, Waldemar Manoel Silva de Souza, deve assumir interinamente o ministério. Silva não confirmou o nome de quem irá substituí-lo.
Entenda melhor os fatos que levaram à queda de Orlando Silva:
Como surgiram as denúncias?
Em entrevista à revista Veja, publicada há duas semanas, o policial militar João Dias Ferreira acusou Orlando Silva de receber dinheiro vivo na garagem do Ministério do Esporte, no fim de 2008. O dinheiro faria parte do programa Segundo Tempo, que destina verbas a ONGs com o intuito de incentivar a prática esportiva entre jovens.
Dias diz que o ministro cobrava 20% das entidades contempladas no programa. O esquema, segundo ele, teria desviado R$ 40 milhões ao longo de oito anos.
Ex-militante do PCdoB, o autor das denúncias presidiu duas entidades suspeitas de desviar cerca de R$ 2 milhões do programa Segundo Tempo. Ele é acusado de usar o dinheiro para a compra de uma casa avaliada em R$ 850 mil e financiar sua campanha para deputado no Distrito Federal, em 2006.
Dias chegou a ser detido em 2008, durante a Operação Shaolin, da Polícia Federal, que apurou desvios de recursos em contratos do governo com ONGs. O ex-ministro do Esporte e atual governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, também é acusado de desviar dinheiro do programa Segundo Tempo.
Após a entrevista publicada pela Veja, o jornal O Estado de S.Paulo afirmou em reportagem que Anna Cristina Lemos Petta, mulher do ministro, recebeu dinheiro da União por meio de uma ONG comandada por filiados ao PcdoB.
Segundo a reportagem, uma empresa criada por Petta e pela irmã de Silva recebeu R$ 43,5 mil da ONG Via BR, que tem entre seus quadros dois filiados ao PCdoB e recebeu mais de R$ 272 mil do Ministério do Esporte para prestar serviço na 3ª Conferência Nacional do Esporte.
O que afirma Orlando Silva?
Desde que as denúncias foram publicadas, Silva vinha negando participação no esquema. Ele disse que as acusações poderiam ser uma reação ao pedido que fez para que os convênios do ministério com organizações presididas por Dias fossem examinados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Silva foi duas vezes ao Congresso desde a divulgação das denúncias. No último dia 18, ele participou de uma audiência na Câmara dos Deputados, na qual desqualificou as acusações contra si e disse que colocaria seus sigilos fiscal, bancário e telefônico à disposição dos investigadores.
"Quem faz a agressão trata-se de um desqualificado, de um criminoso, de pessoa que foi presa, é uma fonte bandida", disse o ministro na ocasião.
Nessa terça-feira, Silva voltou ao Congresso, enviado pelo governo, para participar de audiência pública na comissão especial da que analisa o Projeto da Lei Geral da Copa do Mundo. Ele voltou a se queixar dos ataques e se disse tranquilo com a investigação do STF.
Primeiramente, tanto a presidente Dilma quanto a base aliada saíram em defesa de Orlando Silva.
Durante viagem à África do Sul, no último dia 17, a presidente disse que o ministro gozava da "presunção da inocência" e que o governo estava "acompanhando atentamente" as investigações, mas pediu maior rigor nos critérios para a criação de convênios entre o governo e ONGs.
Já no depoimento de Silva na Câmara, um dia depois, parlamentares da base de apoio do governo manifestaram solidariedade ao ministro, sem fazer perguntas incisivas sobre o escândalo, e chegaram a aplaudi-lo durante suas argumentações.
No entanto, após a divulgação de novas denúncias, Dilma deixou de fazer declarações públicas em favor do ministro, enquanto as vozes de apoio a Silva pareciam se reduzir às de seu partido, o PCdoB.
Orlando Silva é o sexto ministro a deixar o governo Dilma desde junho, quando o ministro-chefe da Casa Civil e principal articulador político de Dilma, Antonio Palocci, pediu demissão.
Depois dele, se seguiram os ministros dos Transportes, Alfredo Nascimento, da Defesa, Nelson Jobim, da Agricultura, Wagner Rossi, e do Turismo, Pedro Novais, além de Orlando Silva.
Como estão as investigações sobre o caso?
Nessa terça-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou que abriria inquérito sobre o ministro por suspeita de desvio de dinheiro.
Segundo informações da Agência Brasil, a ministra Cármen Lúcia aceitou, na última segunda-feira, o pedido de abertura de inquérito, feito na semana anterior pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
No último dia 19, o policial militar João Dias prestou depoimento à Polícia Federal em Brasília. Na ocasião, ele disse que entregaria provas materiais de suas denúncias contra o ministro, incluindo áudios.
No entanto, dois dias depois do depoimento, a PF disse que ainda não havia recebido qualquer prova material que incrimine Orlando Silva por parte do autor das denúncias.
Além disso, o Ministério do Esporte anunciou que abriu uma sindicância para apurar as denúncias de desvios de verbas.
Com a demissão, como fica a organização da Copa de 2014?
Silva era um dos principais interlocutores do governo em relação à Copa de 2014 no Brasil. No entanto, no último dia 22, o secretário-geral da Fifa, Jerôme Valcke, afirmou a jornalistas que a entidade aguardava um novo interlocutor do governo brasileiro, no lugar do então ministro.
"Em novembro, espero já me reunir com novo interlocutor apontado por Dilma para a organização da Copa do Mundo", disse.