Política

Gravação pode inocentar padre-prefeito de Mariluz

05 ago 2001 às 15:05

Uma fita de vídeo é a nova arma da defesa do prefeito de Mariluz (35 quilômetros a sudoeste de Umuarama), padre licenciado Adelino Gonçalves (PMDB), para tentar derrubar a versão que envolve o prefeito em dois assassinatos. A fita, gravada por um radialista, sugere que o lavrador Cícero de Almeida Pedroso, de 35 anos, que antes havia declarado à polícia reconhecer Adelino numa foto, agora aponta exatamente o contrário.

Pedroso diz que não viu o prefeito dentro de um veículo numa conversa com o ex-sargento da PM José Lucas Gomes - réu-confesso nas execuções - em Corumbataí do Sul, município da região de Campo Mourão, alguns dias antes das mortes. Gomes, que mora em Corumbataí, era amigo do lavrador. Pedroso trabalha numa fazenda em Luisiana (também na região) e está relacionado ao caso como testemunha de acusação.


Na gravação, Pedroso, sem saber que a câmera estava ligada, diz que não viu o padre na suposta conversa com o pistoleiro. No dia 7 de março, Pedroso depôs na Delegacia de Corumbataí do Sul, onde reconheceu Adelino por meio de uma fotografia, como o homem que se encontrou com o ex-sargento. "O declarante afirma sem sombra de dúvida, de que trata-se da mesma pessoa que estava no veículo de cor cinza, falando ao telefone celular", registra o boletim de coorrência.


Mas na Vara Criminal de Corumbataí, em depoimento no dia 8 de junho, o lavrador aparenta não ter a mesma certeza. Na declaração, ele diz que "a pessoa no interior do veículo era muito parecida com a pessoa desse padre cuja fotografia lhe foi mostrada; que, entretanto, não pode afirmar com absoluta certeza que seja a mesma pessoa."


O lavrador mencionou ainda que a pessoa que conversava com o pistoleiro falava ao celular. "Está mais do que caracterizado que essa testemunha foi industriada para incriminar o padre", diz o advogado de defesa, Cláudio Dalledone Júnior, que afirma ainda ter consultando as duas operadores de telefonia celular no Estado e ambas confirmaram que não existe sinal que possa fazer os celulares funcionarem em Corumbataí.


Pedroso afirma também na gravação que a mulher de Gomes, Maria Aparecida Tonhato Gomes, chegou a procurá-lo para pedir que fosse à polícia dizer que tinha visto o marido com o padre. "Aí a mulher falou assim: não, tem uma pessoa que foi embora que pode provar que viu fulano de tal...", afirma o lavrador na fita, obtida pela Folha. "Acusando o padre, a esposa do José Lucas achava que iria diminuir a culpa do marido. Já perante o juiz, ela apresentou um depoimento completamente diferente", diz Dalledone Júnior.


Maria Aparecida disse em juízo que o marido apenas se encontrou, no dia 17 de fevereiro, 11 dias antes dos assassinatos, com o então secretário municipal de Ação Social de Mariluz, Elcio de Farias, que também está preso. Elcio é acusado pela defesa de ter interesse na morte de uma das vítimas, que seria contra sua permanência na administração. Ele nega e diz que o padre é o responsável.


Adelino Gonçalves, preso em Curitiba desde março, é acusado de tramar a morte do presidente do PPS de Mariluz, Carlos Alberto de Carvalho, o Carlinhos Gordo, e do vice-prefeito Ayres Domingues (PPS). Os dois foram mortos por Gomes, que, num primeiro depoimento, confessou ter sido contratado pelo padre, mas mudou a versão porque alegou ter sido torturado. Ele passou a acusar Elcio de Farias como o principal interessado na morte de Carlinhos Gordo, baleado em seu escritório, onde também estava Domingues.


A fita em que aparece a voz do lavrador Cícero Pedroso afirmando que não viu o padre na conversa com Gomes foi gravada no dia 9 de junho, um dia depois de o lavrador ter comparecido à Vara Criminal de Barbosa Ferraz, onde prestou o depoimento considerado contraditório pela defesa do padre. Em outra parte do depoimento, está escrito que Pedroso "não sabe explicar, apesar de insistentemente perguntado, o fato de ter dito que falou para a mulher de José Lucas que havia visto o padre Adelino na cidade, diante de sua alegação anterior de que não conhecia, nem tinha visto o padre Adelino até o momento em que ele presenciou a conversa do denunciado José Lucas com a pessoa que estava no interior do carro."

O vídeo onde aparece o lavrador foi feito pelo radialista Alonso dos Santos, de 34 anos, amigo do padre. Santos é de Guarapuava e se passou por repórter de TV para se aproximar de Pedroso. Sob a alegação de que realizava um programa agropecuário, Santos fez entrevistas com o lavrador na propriedade, em Lusiana e, numa conversa reservada, mas com a câmera ligada, perguntou: "Você viu o cara?". A resposta de Pedroso: "Eu não, eu tava inocente".


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